A 5ª Turma do TRF da 1ª Região acolheu parcialmente recurso da sentença, da 1ª Vara Federal da Seção Judiciária de Goiás, que julgou improcedente o pedido de condenação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) ao pagamento de indenização a título de danos materiais e morais a familiares de um homem morto por envenenamento pela administração do contraste radiológico Celobar Suspensão, fabricado por laboratório de produtos químicos e farmacêuticos.
Entendo o problema:
Em 2003, 21 pessoas morreram e outras centenas ficaram com sequelas graves depois de fazerem exame de Raio-X com contraste. As vítimas tomaram remédio adulterado e foram intoxicadas por uma substância presente em veneno para ratos. A repórter Eliane Wirthmann mostra que, no julgamento mais recente sobre o caso, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária foi condenada pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região por falta de fiscalização ao laboratório que produziu a medicação.
Os apelantes sustentaram que a empresa já se encontrava há mais de um ano sem qualquer tipo de fiscalização por parte da Vigilância Sanitária, que desde o início de 2002 havia deixado de importar a matéria-prima necessária à fabricação do Celobar, o sulfato de bário; que somente após a morte de 21 pessoas que utilizaram o produto, a Anvisa publicou a Resolução – RDC 210/2003, “a fim de efetuar mudanças emergenciais nas regras nacionais de controle da fabricação, do armazenamento e da comercialização de insumos e medicamentos”.
Também argumentam que a morte do chefe da família provocou perda patrimonial para os filhos que dependiam da renda de trabalho obtida por ele como mecânico de automóveis e de sua aposentadoria. Assim, buscam indenização por dano material de acordo com o salário recebido, levando-se em conta a provável expectativa de vida que teria a vítima.
A Anvisa, por sua vez, alega que não pode ser responsabilizada pelo ato culposo ou doloso de terceiro; que é inconcebível exigir-se que a Agência “fiscalize, passo a passo, a produção e a comercialização de todos os medicamentos”, e que, portanto, “um acidente somente poderia ser evitado pelas autoridades sanitárias pela presença de um agente fiscal dentro de cada indústria farmacêutica, fiscalizando passo a passo a produção dos medicamentos, o que”, alega, “não é possível”, e, finalizando, sustenta que “concluir pela responsabilidade da Anvisa ante o cometimento de infrações sanitárias decorrentes de atos dolosos ou culposos de terceiros seria o mesmo que responsabilizar as forças de segurança pelos crimes cometidos sob sua circunscrição”.
O Colegiado rejeitou as alegações dos recorrentes.
Em seu voto, o relator, juiz federal convocado Leão Aparecido Alves, citou jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) no sentido de que “as pessoas jurídicas de direito público respondem objetivamente pelos danos que causarem a terceiros, com fundamento no art. 37, § 6º, da Constituição Federal, tanto por atos comissivos quanto por atos omissivos, desde que demonstrado o nexo causal entre o dano e a omissão do Poder Público” (STF, ARE 868610 AgR).
O magistrado destacou ainda que, nos termos do art. 8º, caput, da Lei nº 9.782/1999, “incumbe à Agência, respeitada a legislação em vigor, regulamentar, controlar e fiscalizar os produtos e serviços que envolvam risco à saúde pública.” Registrou que, de acordo com o § 1º, inciso I, do dispositivo legal, “consideram-se bens e produtos submetidos ao controle e fiscalização sanitária pela Agência medicamentos de uso humano, suas substâncias ativas e demais insumos, processos e tecnologias”. Portanto, para o relator, o produto fabricado pelo laboratório estava submetido ao controle e fiscalização da Anvisa, inclusive “suas substâncias ativas e demais insumos, processos e tecnologias”, hipótese em que a Agência delegou a fiscalização do Laboratório à Vigilância Sanitária do Rio de Janeiro (VISA/RJ).
O relator concluiu que, diante da fundamentação apresentada em seu voto, “impõe-se a reforma da sentença recorrida a fim de reconhecer a ocorrência de responsabilidade civil objetiva da ANVISA pela morte da vítima”. Porém, o magistrado entendeu que não consta dos autos prova “inequívoca e convincente” de que a vítima trabalhava como mecânico, razão pela qual julgou incabível a indenização por dano material.
Dessa maneira, a Turma, por unanimidade, deu parcial provimento à apelação para julgar procedente o pedido de indenização por dano moral, rejeitando, entretanto, o pedido de indenização por dano material.
Fonte: TRF