Audiência pública da comissão externa da Câmara, que acompanha iniciativas em relação ao zika vírus, debateu as consequências e o legado deixado pela epidemia provocado pelo mosquito aedes aegyptis
A médica Ana Van Der Linden, que acompanhou o início da epidemia de microcefalia, criticou, nesta quinta-feira (2), a tendência de classificar a doença apenas como uma malformação no crânio dos bebês. “A microcefalia é só a ponta do iceberg, há muitas outras coisas por baixo, e o tamanho da cabeça não necessariamente significa a gravidade da doença”, disse, em reunião da Comissão Externa da Câmara dos Deputados que acompanha iniciativas do governo sobre o zika vírus.
Van Der Linden comanda a equipe médica da Associação de Assistência à Criança Deficiente (AACD) de Recife (PE), estado com maior número de casos de microcefalia, com 358 confirmações até maio. Ela explicou que, apesar de os danos neurológicos serem a chave para compreender a doença, existem outras complicações ainda não exploradas, como o choro excessivo, a epilepsia, redução na visão, problemas digestivos, entre outros.
“Uma criança que não se alimenta bem pode engasgar e ter complicações; a criança que tem problemas motores, se não faz fisioterapia, vai ter deformidades no quadril ou nos pés, e, lá na frente, ela não vai nem conseguir sentar direito”, ressaltou.
Reabilitação
Para a médica, o tratamento da microcefalia deve privilegiar a reabilitação caso a caso, como forma de evitar que o diagnóstico de malformação da cabeça, por si só, defina o futuro dessas crianças. Conforme ela, a reabilitação tem dois objetivos: estimular um potencial que existe na criança e melhorar a qualidade de vida de pacientes em quadro grave.
“A criança não precisa ser inteligente para ser feliz, se está comendo bem, respirando bem, recebendo carinho, ela é feliz independente se ela vai responder as expectativas do pai ou da mãe”, disse. “Então é isso que a gente tem de pensar para a criança, uma qualidade de vida boa”, completou.
Grávidas
A coordenadora-geral da Saúde da Pessoa com Deficiência do Ministério da Saúde, Vera Lúcia Mendes, chamou atenção para a necessidade de dar suporte psicossocial às grávidas na rede de saúde pública.
“Quantos abandonos e desestruturações familiares poderiam ser prevenidas, se esta mãe, mesmo antes do diagnóstico (da microcefalia), pudesse ser ouvida?”, indagou, ao observar que o apoio também deve ser estendido às mulheres cujos filhos são portadores de outras deficiências.
Auxílio
A diretora do Departamento de Proteção Social Básica do Ministério do Desenvolvimento Social, Maria Helena Tavares, destacou a importância do benefício mensal de um salário mínimo (R$ 880,00) a que tem direito a família integrada por idosos ou pessoas com deficiência. “A maioria dessas crianças são de famílias de muita vulnerabilidade, não só econômica, mas social. Portanto, acessar o benefício, que é um direito constitucional, é um apoio efetivo”, disse.
Para Vanessa Van Der Linden, entretanto, é preciso rever o valor do auxílio. Ela contou que atende a uma família que tinha renda mensal de dois salários mínimos. No entanto, a mãe teve que parar de trabalhar com o nascimento do segundo filho.
Mesmo assim, a família não cumpre o requisito de renda máxima exigida para receber o auxílio (renda per capita menor que R$ 220). “Resultado: vão ser quatro, um salário e uma criança deficiente grave”, observou.
Já a deputada Carmen Zanotto (PPS-SC), uma das que solicitou o debate, alertou para a falta de recursos e do cumprimento das normas de combate ao mosquito. “Uma coisa é o que está no conteúdo do papel, outra é aquilo que efetivamente acontece lá na base, lá no município”, disse.
Reportagem – Emanuelle Brasil
Edição – Mônica Thaty
foto - Lucio Bernardo Junior
Agência Câmara Notícias