Pesquisa da Fiocruz e
do Núcleo de Medicina Tropical da UnB mostra que é possível reduzir de um ano
para seis meses o tratamento da hanseníase
O combate à hanseníase deve
ganhar um novo capítulo em 2018. Uma pesquisa da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz),
em Brasília, em parceria com o Núcleo de Medicina Tropical da Universidade de
Brasília (UnB), mostrou que é possível reduzir de um ano para seis meses o
tratamento, administrando três tipos de medicamentos, já usados contra a
doença. O Ministério da Saúde avalia a adoção do modelo como
padrão em todo o país. A Organização Mundial da Saúde (OMS)
publicou um artigo que também considera a possibilidade.
Apesar de ser uma doença
controlada e com remédios eficazes, a hanseníase - que, na última década,
acometeu 2,4 mil pessoas no DF - ainda merece atenção e muitos cuidados. A
maior preocupação dos especialistas é que, com o tratamento prolongado, alguns
pacientes deixam de se medicar. A capital federal registrou, em 2016, a maior
taxa de afastamento em 10 anos: 7,6% pararam a terapia. Quando não tratados
adequadamente, os pacientes transmitem o mal e sofrem com sequelas, como a
perda de movimentos e deformações (leia Tira Dúvidas).
A redução no tempo de tratamento
- acreditam os especialistas - é a maior inovação desde 1981, quando as
terapias contra a hanseníase passaram a ser disponibilizadas gratuitamente. À
época, a medicação se estendia por dois anos.
A pesquisa foi coordenada pelo
médico dermatologista, especialista em doenças infecciosas e parasitárias,
Gerson Oliveira Penna. Em entrevista exclusiva ao Correio, ele afirmou que a
nova metodologia facilitará a rotina nos consultórios. "Com a
padronização, os pacientes terão um tratamento melhor. Com isso, aumenta-se a
qualidade de vida", frisou.
Hoje, os doentes com até cinco
lesões na pele tomam dois remédios por seis meses. Aqueles com mais ferimentos
ingerem até três por um ano. "Essa classificação confunde o médico. O
estudo comprovou que o esquema de três remédios por seis meses é eficaz para
todos os pacientes. Os medicamentos são os mesmos usados hoje", destacou.
Ao todo, nome mil pacientes participaram do estudo, sendo que 853 deles foram
acompanhados por seis anos.
Apoiada pelo Conselho Nacional
de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e pelo Ministério da
Saúde, a pesquisa custou R$ 1,6 milhão aos cofres públicos e começou em
2007. Dez instituições nacionais e internacionais colaboraram. "Outra
descoberta da pesquisa é a reinfecção. Quatro pacientes que acompanhamos
tiveram um tipo diferente de hanseníase, como ocorre com a gripe, que tem cepas
diferentes. Amostras deles foram avaliadas na Suíça. Ainda estamos estudando o
que causa isso", comentou o médico.
Em novembro, técnicos do Ministério
da Saúde devem se reunir para debater a adoção da estratégia. Os
pesquisadores publicaram ao menos 15 artigos científicos em veículos
internacionais. A OMS analisa as evidências científicas para a implantação em
escala mundial. "O estudo brasileiro, entre os quatro existentes, é o que
reúne todos os parâmetros exigidos na moderna medicina", destacou a
entidade.
"Estigma"
Marly Araújo, presidente do
Grupo de Apoio às Mulheres Atingidas pela Hanseníase (Gamah), acompanha casos
no DF há quase duas décadas. "Muita gente acredita que o tratamento não é
eficaz, por ser longo, e o estigma contra os pacientes aumenta. Com uma terapia
mais rápida, o bem-estar aumenta, além de diminuir a desistência, que até hoje
é um problema", explicou. Marly tem a doença desde 1993.
O coordenador do Departamento
de Hanseníase da Sociedade Brasileira de Dermatologia (SBD), Egon Daxbacher,
afirmou que os avanços na terapia devem estar aliados à estruturação da rede
pública. "Temos que disseminar as informações. As pessoas não sabem como
acontece o contágio, quais são os sintomas", ponderou.
"O estudo comprovou que o
esquema de três remédios por seis meses é eficaz para todos os pacientes. Os
medicamentos são os mesmos usados hoje"
Gerson Penna, coordenador da
pesquisa
Tira dúvidas
O que é a hanseníase?
Doença infectocontagiosa
crônica incapacitante e de grande magnitude de transmissão. É desencadeada pela
bactéria mycobacterium leprae, também conhecida como bacilo de Hansen - um
parasita que ataca células da pele e dos nervos periféricos.
Quais são os sintomas?
Manchas esbranquiçadas,
avermelhadas ou amarronzadas em qualquer parte do corpo, com perda ou alteração
de sensibilidade. Área de pele seca, com falta de suor e com queda de pelos.
Além da sensação de formigamento, choque, fisgadas e agulhadas ao longo dos
nervos dos braços e das pernas, ocorre inchaço de mãos e pés. Há ainda o
aparecimento de caroços, dor nas juntas, ressecamento nos olhos e perda da
força dos músculos de mãos, pés e face, devido à inflamação de nervos.
Como se transmite?
Ocorre a partir de uma pessoa
doente, sem tratamento, que elimina o bacilo por meio das vias respiratórias
(secreções nasais, tosses, espirros). Em média, o micro-organismo fica encubado
de 2 a 5 anos.
Como é o tratamento?
É ambulatorial. Administra-se
uma associação de medicamentos - a poliquimioterapia - , conforme a
classificação do paciente. Normalmente, usam-se fármacos como rifampicina,
dapsona, rifampicina, dapsona e clofazimina.
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