Também
foi cassada a liminar concedida em setembro de 2013 pela relatora da ADI,
ministra Rosa Weber, que suspendia dispositivos da RDC 14/2012.
A Ação Direta de
Inconstitucionalidade (ADI) 4874, ajuizada pela Confederação Nacional da
Indústria (CNI) contra a RDC 14/2012 da Anvisa, foi julgada improcedente pelo
Supremo Tribunal Federal (STF), em julgamento realizado nesta quinta-feira
(1º/2). A ADI questionava a legitimidade da Anvisa para a proibição do uso de
aditivos nos produtos fumígenos derivados do tabaco.
Durante
o julgamento, houve uma cisão do objeto decidido: em relação ao pedido de
inconstitucionalidade do inciso XV do art. 7º da Lei n. 9.782/99, com
declaração de inconstitucionalidade, por arrastamento, de dispositivos da RDC
14/2012 (pedido principal), vencido em parte o ministro Marco Aurélio, o pedido
foi julgado improcedente. Já no que diz respeito ao pedido sucessivo de
declaração de inconstitucionalidade de dispositivos específicos da RDC 14/2012
(os que se relacionam à vedação de aditivos aos fumígenos), houve empate de
votação entre os ministros. Dessa forma, a RDC foi tida por constitucional, mas
seus efeitos não são vinculantes e não há eficácia erga omnes. Ou seja:
continua sendo possível o manejo de ações individualizadas em sede de controle
difuso de constitucionalidade. Importante frisar que, por iniciativa da própria
relatora, ministra Rosa Weber, foi cassada a liminar que, em 2013, suspendeu
parcialmente a eficácia de diversos dispositivos da RDC 14/2012.
O diretor-presidente
da Anvisa, Jarbas Barbosa, fala sobre a decisão do STF: “Foi uma importante
vitória para assegurar que a Anvisa possa regulamentar os cigarros”, destacou.
“Há várias iniciativas da indústria do tabaco, como a inclusão de aditivos que
disfarçam o sabor, que podem induzir crianças e adolescentes a experimentarem
cigarros e se tornarem fumantes. Isso pode reverter a tendência de redução do
tabagismo verificada nos últimos 25 anos em nosso país, com gravíssimo impacto
na saúde pública. Continuaremos a apresentar os argumentos técnicos e legais
sempre que houver novas ações”.
Ao
proferir seu voto, a relatora afirmou, a respeito dos limites da competência
normatizadora da Anvisa, que a liberdade de ação ou discricionariedade
normativa das agências reguladoras encontra limites nos objetivos fixados na
lei e nas políticas públicas estabelecidas pela administração central.
“Mostra-se legítima a atuação normativa do agente regulador sempre que capaz de
ser justificada como a integração de uma evidente escolha legislativa”, disse.
A
função regulatória das agências, segundo a ministra, não é inferior ou exterior
à legislação, mas diferente, pelo seu caráter técnico. “O poder normativo
atribuído às agências reguladoras consiste em instrumento para a implementação
das diretrizes, finalidades, objetivos e princípios expressos na Constituição e
na legislação setorial”, explicou. “Poder normativo não é Poder legislativo”.
Quanto
ao pedido de inconstitucionalidade da resolução, a relatora destacou que, a
despeito do direito fundamental à liberdade de iniciativa, o Estado pode impor
condições e limites para a exploração de atividades privadas, tendo em vista a
necessidade de sua compatibilização com os demais princípios, garantias e direitos
fundamentais.
No
caso do controle do tabaco, a saúde e o direito à informação devem ser
protegidos. “Os preceitos constitucionais que elevam a saúde à estatura de
direito social de todos e atribui ao Estado o dever de garanti-la mediante
políticas sociais que visem à redução do risco de doenças impõe a adoção de uma
agenda positiva voltada à concretização deste direito”, explicou. Nesse
contexto, a ministra entende ser possível à Anvisa tomar medidas repressivas
concretas para suspender ou evitar risco iminente à saúde.
Acompanharam
a relatora os ministros Edson Fachin, Ricardo Lewandowski, Celso de Mello e
Carmen Lúcia. O ministro Roberto Barroso declarou seu impedimento para o
julgamento.
Aditivos
O
foco do debate é se a Anvisa, no estrito cumprimento de sua função legal, está
autorizada a proibir que a indústria tabagista utilize aditivos em seus
produtos.
Tais
aditivos têm a função de mascarar sabores, odores e sensações ruins em cigarros
e outros produtos fumígenos, com o objetivo de fazer com que os usuários
utilizem cada vez mais estes produtos.
Ao
longo dos anos, o Brasil tem avançado no controle dos produtos fumígenos
derivados do tabaco e também no combate ao tabagismo. Este avanço foi possível
por meio da adoção de diversas medidas normativas, sendo uma das primeiras a
edição da Lei n. 9.294, de 15 de julho de 1996, que restringiu a propaganda e
uso desses produtos.
Em
2003, o Brasil tornou-se signatário da Convenção-Quadro para o Controle do
Tabaco (CQCT) da Organização Mundial da Saúde (OMS), cuja internalização no
país ocorreu por meio do Decreto n. 5.658/2006. Esta Convenção, que conta
atualmente com 181 Estados-Partes, objetiva a adoção de medidas conjuntas para
o controle dos produtos derivados do tabaco e combate mundial ao tabagismo.
O
Decreto estabelece a necessidade de se tomarem medidas para combater a
iniciação e apoiar a cessação de consumo do tabaco, e reforça que essas ações
sejam embasadas em provas científicas, tendo por objetivo a redução do
tabagismo.
O
Brasil e os demais países que aderiram ao CQCT firmaram o compromisso de que
“não se justifica permitir o uso de ingredientes, tais como agentes
flavorizantes, o que ajuda a tornar os produtos de tabaco atraentes” e há
recomendações para que os países proíbam ou restrinjam o uso, nos produtos de
tabaco, de ingredientes que aumentem a palatabilidade, que atribuam coloração,
que causem falsa impressão de benefícios à saúde e que sejam estimulantes.
Em
cumprimento às determinações da CQCT, a Anvisa publicou a RDC n. 14, de 15 de
março de 2012, que dispôs sobre os limites máximos de alcatrão, nicotina e
monóxido de carbono nos cigarros, proibiu o uso de palavras como “light”,
“suave”, “soft”, dentre outras, e restringiu o uso de substâncias aditivas nos
produtos fumígenos derivados do tabaco, permitindo somente a utilização dos
aditivos indispensáveis ao processo produtivo.
RDC
14/2012
Para
justificar a RDC n. 14/2012, a Anvisa publicou a Nota Técnica n. 10/2013, que
apresenta argumentos detalhados para todas as alegações feitas pela Agência no
bojo da ADI em comento. Dentre elas, é possível destacar:
· O
uso de substâncias broncodilatadoras com o objetivo de aumentar a absorção de
nicotina pelos brônquios e, consequentemente, o seu potencial de causar
dependência;
· O
emprego de substâncias que inibem o metabolismo da nicotina, deixando-a mais
tempo presente na circulação sanguínea e fazendo com que o seu efeito seja
intensificado;
· A
utilização de substâncias anestésicas para a diminuição da irritação das vias
aéreas; e
· O
uso de substâncias que mascaram o sabor e odor ruins do produto, bem como a
irritação causada pela fumaça do cigarro, tornando-o mais palatável.
Corroborando
as informações já apresentadas pela Anvisa, a Organização Mundial da Saúde
publicou, em 2014, um documento no qual reafirma e apresenta evidências
científicas de que o uso de algumas substâncias aditivas tem como finalidade o
aumento do poder de causar dependência dos produtos derivados do tabaco.
São
elas: a amônia (aumenta a nicotina livre e mascara o gosto ruim do produto), o
eugenol e o mentol (provocam analgesia e menor irritabilidade para que haja
maior aspiração da fumaça e disponibilidade de nicotina nos pulmões).
Menciona
também os aditivos como substâncias intencionalmente adicionadas aos produtos
com o objetivo de aumentar a palatabilidade, melhorar a aparência, criar falsa
sensação de benefícios à saúde, bem como de aumentar a energia e vitalidade.
Para
a Anvisa, as medidas contra o uso de aditivos nos produtos fumígenos objetivam
a proteção à saúde, dentro das prerrogativas legais da Agência, e podem, nesse
caso concreto, impedir que crianças e adolescentes sejam atraídas para o
cigarro.
Ascom/ANVISA