A Eli Lilly anunciou, em
dezembro passado, o fechamento da fábrica e a expansão de seus negócios
mediante importação de medicamentos
A 2ª Vara do Trabalho de
Paulínia atendeu parcialmente os pedidos do Ministério Público do Trabalho
(MPT) e determinou a indisponibilidade de bens imóveis da Eli Lilly,
multinacional norte-americana do setor farmacêutico, no limite de até R$ 500
milhões. O objetivo é garantir o pagamento do tratamento de saúde de centenas
de trabalhadores expostos a contaminantes na fábrica da empresa em Cosmópolis.
A ação cautelar, assinada por
cinco procuradores do MPT, foi motivada por notícias de que a empresa está
deixando as suas operações no Brasil, o que, no entendimento do MP, traz risco
de descumprimento de uma decisão proferida em 2018 em ação civil pública, pela
qual a multinacional e sua subsidiária, Antibióticos Brasil Ltda. (ABL), foram
obrigadas a manter ampla cobertura de saúde a ex-trabalhadores diretos e
terceirizados, além dos filhos destes que nasceram durante ou após a prestação
de serviços, de forma vitalícia. Veja abaixo nota da ABL sobre a
decisão.
Em nota divulgada à imprensa
em dezembro de 2018, a Eli Lilly anunciou o fim das suas operações no Brasil,
com o fechamento da fábrica e expansão de seus negócios mediante importação de
100% dos medicamentos para o País. “O objetivo de expansão dos negócios no
Brasil demonstra-se desconectado da estratégia de fechamento de uma fábrica em
pleno funcionamento para dar lugar à importação de produtos, que traz
incontáveis custos operacionais, logísticos e tributários.
Essa contradição, apenas
aparente, torna nítido o intuito da ré Eli Lilly do Brasil de, simultaneamente,
promover a blindagem de seu patrimônio, mediante o fechamento de sua única
fábrica e o encerramento da fabricação de medicamentos em solo brasileiro, e
continuar auferindo lucro através da mera importação de produtos”, pontuam os
procuradores.
A juíza Cláudia Cunha
Marchetti determinou a decretação da indisponibilidade dos bens imóveis em nome
da Eli Lilly, via Central Nacional de Indisponibilidade de Bens (CNIB), e a
realização de pesquisas para que sejam localizados bens da multinacional, com o
objetivo de realizar futura averbação premonitória, caso os bens listados não
atinjam o valor de R$ 500 milhões.
“É certo (...) que o
fechamento de sua única unidade fabril no Brasil poderá importar, também, no
deslocamento de seu patrimônio para terras estrangeiras e, consequentemente, na
alienação de seus bens móveis e imóveis existentes em solo brasileiro”, afirmou
a magistrada na sua decisão.
Documentos
A decisão também determina à
Eli Lilly e ABL que, no prazo de 30 dias (a contar de sua intimação),
apresentem documentos que constem contratos com empresas terceirizadas e
relação de terceirizados que prestaram serviços na fábrica, além de Cadastro
Geral de Empregados e Desempregados (Caged), Relação Anual de Informações
Sociais (Rais), fichas de registro e outros documentos que “possam ser
utilizados para a individualização dos beneficiários da ação civil pública
ajuizada, ou justifiquem a impossibilidade de fazê-lo”.
“Apenas mediante a
apresentação da relação de beneficiários será possível dar cumprimento à
obrigação de proporcionar o tratamento de saúde de forma vitalícia a todos os
trabalhadores prejudicados pela conduta irregular das empresas. Tal obrigação
foi imposta pelo Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região como antecipação
de tutela, ou seja, deve ser cumprida independente do julgamento de recursos,
eis o motivo do pedido cautelar para exibição dos documentos”, explicam os
procuradores.
O Caso
A Eli Lilly e a ABL foram alvo
da uma ação civil pública no ano de 2008, após a instrução de um inquérito que
apontou as consequências da exposição de funcionários a contaminantes no
processo produtivo da fábrica, mas também pela exposição a gases e metais
pesados advindos da queima de lixo tóxico de terceiros pelo seu incinerador.
Segundo relatado pelos
trabalhadores, mais de 500 pessoas passaram pela fábrica desde o ano de 1977,
quando iniciou suas operações em Cosmópolis. De lá pra cá, todos estão recebendo
tratamento pelo SUS (Sistema Único de Saúde), já que a empresa não admite a
contaminação de seres humanos na planta e, por isso, não se responsabiliza pelo
custeio do tratamento de saúde. Existem processos individuais contra a Lilly na
Justiça do Trabalho.
Os laudos técnicos apontam a
presença de substâncias perigosas nas águas subterrâneas no terreno da fábrica,
tais como benzeno, xileno (solvente), estireno (usado para a fabricação de
veneno contra ratos), naftaleno (também conhecido como naftalina) e tolueno
(caracteriza a cola de sapateiro). Por conta disso, as próprias empresas
realizaram uma autodenúncia à Cetesb, admitindo a contaminação da água e do
solo da região. Há processos ativos contra as companhias em outros ramos do
Judiciário.
Em duas instâncias da Justiça
do Trabalho, as rés foram condenadas ao pagamento de indenização por danos
morais coletivos de R$ 500 milhões, além de efetivarem o custeio do tratamento
irrestrito de saúde a todos os empregados, ex-empregados, autônomos e terceirizados.
Foi determinada a execução imediata desse item pela 1ª instância, mediante a
apresentação e habilitação dos beneficiários.
Empresa avisa que pretende
recorrer
Em nota, a empresa informou
que ainda não foi intimada da decisão, e quando isso ocorrer, vai recorrer.
"Sobre o processo
original, a companhia apresentou embargos de declaração contra a decisão do
Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região, que ainda estão pendentes.
Após decidido esse recurso, a
companhia terá a oportunidade de recorrer da decisão ao Tribunal Superior do
Trabalho", traz trecho da nota.
Sobre o fechamento da fábrica,
a Lilly explicou que está buscando realinhar as atividades globais de
manufatura de produtos sólidos, que incluem comprimidos e cápsulas. "Esta
é uma continuação de nossos esforços nos últimos anos para equilibrar a capacidade
de produção com as necessidades do nosso portfólio. Como resultado disso,
estamos finalizando as operações da nossa planta de manufatura e embalagem no
Brasil, o que ocorrerá apenas no curso dos próximos três a quatro anos",
destacou.
Além disso, a planta de
produção de medicamentos sólidos de Madri, na Espanha, deixará de fabricar
medicamentos e focará suas atividades na embalagem de produtos vendidos fora
dos Estados Unidos. Mesmo com essa mudança, a companhia garante que manterá
mais de 500 postos de trabalho ativos no Brasil. A parte administrativa e de
vendas da afiliada brasileira não sofrerá impacto desta decisão e continuará a
operar normalmente, segundo a assessoria de imprensa.
Nota da ABL
A ABL (Antibióticos do Brasil
Ltda) informou por meio de nota que ainda não foi notificada do ajuizamento da
medida cautelar – execução provisória suplementar à ação civil pública,
promovida pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) de Paulínia e, tampouco, da
liminar concedida.
A ABL esclarece ainda que foi
criada em 2003, pertence a um grupo italiano e reforça que as atividades não
têm nenhuma ligação com a Eli Lilly. A ABL foi arrolada no processo apenas por
estar instalada na área que antes pertencia a Eli Lilly, como subsidiária, ou
seja, só será responsável caso a Eli Lilly não cumpra a determinação judicial.
A ABL informou na nota que
quando for notificada, e se assim for os termos constantes na liminar, não terá
qualquer restrição em apresentar documentos de seus arquivos, a partir do
início de suas operações em Cosmópolis, em agosto de 2003, destinados à identificação
de eventuais beneficiários do plano de saúde, sendo confirmada a decisão
proferida pelo Tribunal Regional do Trabalho de Campinas.
A ABL ratifica na nota ser uma
empresa com responsabilidade socioambiental como valor intrínseco às suas
atividades e todo o processo produtivo de antibióticos destinados para uso
hospitalar, segue um rígido controle de qualidade em todas as suas etapas,
atestado por órgãos responsáveis do Brasil e do exterior. “A empresa tem o
compromisso de salvar vidas humanas”, finaliza.