MaíraMenezes (IOC/Fiocruz)
Um kit de diagnóstico para
detecção do novo coronavírus, que pode ser aplicado diretamente em unidades
básicas de saúde, fornecendo o resultado em até 45 minutos, com baixo custo e
alta precisão. A inovação, que pode contribuir para o enfrentamento da
Covid-19, teve a patente depositada, após mais de um ano de trabalho de
pesquisadores do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz), Universidade Federal de
Santa Catarina (UFSC) e Instituto Federal de Santa Catarina (IFSC), em parceria
com a empresa SPK Solutions.
Kit de diagnóstico rápido para
Covid-19 oferece um resultado em 45 minutos (fotos: André Pitaluga; montagem:
Jefferson Mendes, IOC/Fiocruz)
Simples, rápido e
barato, o kit de diagnóstico identifica o material genético do Sars-CoV-2,
utilizando uma técnica chamada de RT-LAMP. Em testes de validação, com mais de
mil amostras, o exame apresentou precisão equivalente ao RT-PCR, considerado
como padrão-ouro para o diagnóstico da Covid-19. Para amostras da orofaringe –
coletadas com um tipo especial de cotonete, conhecido como swab, introduzido no
nariz dos pacientes – o teste demonstrou 96% de sensibilidade e 98% de
especificidade.
“O diferencial do kit é
integrar todas as etapas do diagnóstico molecular, com uma metodologia adequada
ao point-of-care [local de atendimento]. É um método simples,
barato e robusto, que permite realizar o diagnóstico no local onde ele é
necessário”, destaca o pesquisador do IOC e coordenador do projeto, André
Pitaluga.
A metodologia pode ser
aplicada ainda para amostras de saliva, cuja coleta é mais simples. Neste caso,
as primeiras análises indicaram 70% de sensibilidade e 98% de especificidade, e
uma nova rodada de testes aponta que é possível alcançar quase 100% de sensibilidade
caso a coleta seja realizada em jejum, logo após o despertar.
“A ingestão de alimentos,
bebidas e higiene bucal alteram a composição da saliva e podem reduzir a
presença de partículas virais na amostra, dificultando o diagnóstico. Os testes
com a coleta em jejum, pela manhã, ainda estão em andamento, mas os resultados
preliminares são bastante positivos”, comenta o pesquisador.
Para desenvolver o kit de
diagnóstico, os pesquisadores contaram com o apoio do Núcleo de Inovação
Tecnológica do IOC (NIT-IOC) e o financiamento da empresa Engie, Programa Inova
Fiocruz e Ministério Público do Trabalho (MPT). Os testes de validação foram
realizados em parceria com o Laboratório Central de Saúde Pública de Santa
Catarina (Lacen-SC) e as prefeituras de Tubarão e Florianópolis.
Diferenciais
O custo estimado do novo kit
de diagnóstico do Sars-CoV-2 é de R$ 30, o que representa menos de um terço do
valor de um kit de RT-PCR, de aproximadamente R$ 100. O gasto de operação para
realizar o exame também é significativamente menor, considerando equipamentos e
profissionais envolvidos.
Os pesquisadores destacam que
a ferramenta reúne componentes para extração e amplificação do RNA viral. A
primeira etapa busca extrair da amostra apenas o material genético, deixando de
lado as outras moléculas presentes. A segunda tem o objetivo de identificar e
multiplicar alvos do genoma do Sars-CoV-2, de forma a tornar possível a sua
detecção.
“As duas etapas são muito
importantes para o diagnóstico. A extração facilita a detecção do RNA,
aumentando a sensibilidade do teste. Se esse procedimento não for correto,
ocorre a degradação do RNA viral, podendo gerar resultado falso-negativo”,
destaca a professora do departamento de Biologia Celular, Embriologia e
Genética (BEG) da UFSC e integrante do projeto, Luísa Rona.
Um dispositivo para extração
do RNA, criado pelos cientistas, integra o kit de diagnóstico. Basta usar uma
pipeta para depositar a solução com a amostra no local indicado, onde uma
membrana retém as partículas de RNA presentes.
Para a amplificação dos alvos
no genoma viral, o kit contém uma solução pronta, com todo os ingredientes
necessários à reação de RT-LAMP, incluindo a enzima que participa do processo e
moléculas que identificam especificamente o RNA do Sars-CoV-2. É preciso apenas
colocar a amostra purificada em um tubo com a solução e utilizar um aparelho de
banho seco ou banho maria para aquecer a mistura. Após 30 minutos a 65ºC, a
reação de RT-LAMP é concluída.
O resultado é indicado pela
mudança na cor da solução. Nos casos positivos, há alteração no pH da mistura,
que se torna amarela. Nos casos negativos, o líquido permanece rosa.
“Todo o procedimento leva
cerca de 45 minutos. O único equipamento necessário é um banho seco ou banho
maria, e qualquer profissional treinado pode aplicar o teste. Pela
simplicidade, o custo operacional é muito menor do que a RT-PCR que exige
equipamentos sofisticados e precisa ser executada por especialistas em biologia
molecular”, resume André.
Próximas etapas
A partir dos bons resultados
nos testes de validação, os pesquisadores estão buscando parceiros para a
produção e o fornecimento do kit de diagnóstico. O projeto integra a Vitrine Tecnológica Covid-19 do
IOC), plataforma que dá visibilidade a inovações em desenvolvimento no
Instituto com o objetivo de fomentar parcerias para a geração de produtos e
processos inovadores para o enfrentamento da emergência sanitária. As próximas
etapas do projeto devem contemplar também o escalonamento do produto para
fabricação industrial e a submissão à Agência Nacional de Vigilância Sanitária
(Anvisa).
“Desde o início, desenvolvemos
esse produto com foco no Sistema Único de Saúde, com objetivo de ampliar o
acesso ao diagnóstico e contribuir para o enfrentamento da pandemia no nosso
país”, ressalta André, acrescentando que a inovação pode ajudar ainda na luta
contra outros agravos. “Essa metodologia é muito versátil. Já estamos
trabalhando em uma versão do kit para o diagnóstico da febre amarela”, adianta
o pesquisador.