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terça-feira, 10 de julho de 2018

Um breve análise sobre contratações públicas, período eleitoral e vedações


Com a proximidade das eleições, que ocorrerão em outubro, entendemos importante esclarecer alguns pontos relacionados às contratações realizadas pela administração pública e as vedações a que estão sujeitos os agentes públicos, com base na Lei 9.505/1997 (Lei Eleitoral), calcada em uma breve, porém direta, análise.
As regras descritas na Lei, em especial nos seus artigos 73 e 75, que transcrevemos a seguir:

Art. 73 - São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais:
I - ceder ou usar, em benefício de candidato, partido político ou coligação, bens móveis ou imóveis pertencentes à administração direta ou indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios, ressalvada a realização de convenção partidária;
II - usar materiais ou serviços, custeados pelos Governos ou Casas Legislativas, que excedam as prerrogativas consignadas nos regimentos e normas dos órgãos que integram;
III - ceder servidor público ou empregado da administração direta ou indireta federal, estadual ou municipal do Poder Executivo, ou usar de seus serviços, para comitês de campanha eleitoral de candidato, partido político ou coligação, durante o horário de expediente normal, salvo se o servidor ou empregado estiver licenciado;
IV - fazer ou permitir uso promocional em favor de candidato, partido político ou coligação, de distribuição gratuita de bens e serviços de caráter social custeados ou subvencionados pelo Poder Público;
V - nomear, contratar ou de qualquer forma admitir, demitir sem justa causa, suprimir ou readaptar vantagens ou por outros meios dificultar ou impedir o exercício funcional e, ainda, ex officio, remover, transferir ou exonerar servidor público, na circunscrição do pleito, nos três meses que o antecedem e até a posse dos eleitos, sob pena de nulidade de pleno direito, ressalvados: (...)
VI - nos três meses que antecedem o pleito:
a) realizar transferência voluntária de recursos da União aos Estados e Municípios, e dos Estados aos Municípios, sob pena de nulidade de pleno direito, ressalvados os recursos destinados a cumprir obrigação formal preexistente para execução de obra ou serviço em andamento e com cronograma prefixado, e os destinados a atender situações de emergência e de calamidade pública;
b) com exceção da propaganda de produtos e serviços que tenham concorrência no mercado, autorizar publicidade institucional dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos federais, estaduais ou municipais, ou das respectivas entidades da administração indireta, salvo em caso de grave e urgente necessidade pública, assim reconhecida pela Justiça Eleitoral;
c) fazer pronunciamento em cadeia de rádio e televisão, fora do horário eleitoral gratuito, salvo quando, a critério da Justiça Eleitoral, tratar-se de matéria urgente, relevante e característica das funções de governo;
VII - realizar, no primeiro semestre do ano de eleição, despesas com publicidade dos órgãos públicos federais, estaduais ou municipais, ou das respectivas entidades da administração indireta, que excedam a média dos gastos no primeiro semestre dos três últimos anos que antecedem o pleito;
VIII - fazer, na circunscrição do pleito, revisão geral da remuneração dos servidores públicos que exceda a recomposição da perda de seu poder aquisitivo ao longo do ano da eleição, a partir do início do prazo estabelecido no art. 7º desta Lei e até a posse dos eleitos.
(...)
§10. No ano em que se realizar eleição, fica proibida a distribuição gratuita de bens, valores ou benefícios por parte da Administração Pública, exceto nos casos de calamidade pública, de estado de emergência ou de programas sociais autorizados em lei e já em execução orçamentária no exercício anterior, casos em que o Ministério Público poderá promover o acompanhamento de sua execução financeira e administrativa.
(...)
Art. 75 - Nos três meses que antecederem as eleições, na realização de inaugurações é vedada a contratação de shows artísticos pagos com recursos públicos.
Exceto as vedações expressas no Art. 75, acima, não há proibições para contratações promovidas pela administração pública, o que se veda, de acordo com o que determina o inciso VI, al. ‘a’, do artigo 73, é a transferência de recursos entre os entes federados para execução de obra ou serviço que não esteja em andamento nos três meses que antecedem o pleito. Nesses termos também dispõe a Resolução 21.878, referente à Consulta 1.062 – Classe 5ª Distrito Federal, de 12/08/04, do Tribunal Superior Eleitoral.
No entanto, procedimentos licitatórios ou contratos preexistentes para execução de obra ou serviço em andamento ou destinados a atender situações de emergência e de calamidade pública não estão inseridos na vedação. E, reforçando tal determinação legal, erigiu-se o entendimento do TSE:
Repasse de recursos em período pré-eleitoral. Conduta vedada. Ressalvas. Lei nº 9.504/1997, art. 73, VI, “a”.
1. A Lei nº 9.504/1997, art. 73, VI, “a”, permite o repasse de recursos da União aos estados e municípios, no período pré-eleitoral, desde que destinados a cumprir obrigação formal preexistente para execução de obra ou serviço em andamento e com cronograma prefixado, ou para atender situações de emergência e de calamidade pública.
2. Representação julgada improcedente[1].
Não obstante isso, ainda que para além do disposto na Lei Eleitoral, há que se mencionar que, de acordo com o estatuído no artigo 42 da Lei Complementar 101/2001 (LC 101/2001), “é vedado ao titular de Poder ou órgão referido no art. 20, nos últimos dois quadrimestres do seu mandato, contrair obrigação de despesa que não possa ser cumprida integralmente dentro dele, ou que tenha parcelas a serem pagas no exercício seguinte sem que haja suficiente disponibilidade de caixa para este efeito” (sem grifos no original).

Desta forma, faz-se necessário observar que as despesas que decorrerão das avenças/contratos efetivados deverão ser integralmente cumpridas no presente exercício financeiro ou, na hipótese de parcelas a serem pagas a posteriori, como ocorre com os projetos incluídos no Plano Plurianual, deverá ser garantida disponibilidade de caixa suficiente, caso não seja possível cumpri-las até tal prazo.

Note-se, conclusivamente, que o que se pretende impedir é a contratação referente a despesas que não possuam cobertura em orçamento. O artigo 42 da LRF não impede, contudo, a realização de contratações nos últimos oito meses do mandato eletivo, de objetos atrelados a projetos incluídos no Plano Plurianual, mesmo porque a liquidação da dívida proveniente de tais projetos não se realizará mediante disponibilidade de caixa, e sim com verba prevista no orçamento correspondente.
Com base em artigo escrito por Elaine Cristina Bertoldo

[1] TSE. Resolução de Consulta 20.410, de 03/12/98. Relator: Ministro Edson Vidigal.


Comissão pode votar parecer que muda regras sobre agências reguladoras


A comissão especial que analisa proposta de mudança na legislação sobre as agências reguladoras (PL 6621/16) reúne-se hoje para discussão e votação do parecer do relator deputado Danilo Forte (PSDB-CE).

Na última quarta-feira (4), o deputado apresentou novo parecer sobre a proposta de Lei Geral das Agências Reguladoras. Ele fez ajustes pontuais em seu substitutivo, acatando parte das 16 emendas apresentadas por outros integrantes da comissão especial que analisa o tema. O início da Ordem do Dia do Plenário da Câmara impediu a leitura do parecer.

Danilo Forte mantém a essência da proposta aprovada pelo Senado: unificar as regras sobre gestão, poder e controle social das agências reguladoras. O projeto pretende garantir a autonomia dessas autarquias, dar mais transparência à atividade regulatória e estabelecer medidas para evitar a interferência do setor privado.

O PL 6621/16 tramita em caráter conclusivo nas comissões do Congresso. Se aprovado pela comissão especial da Câmara, o substitutivo do relator Danilo Forte retornará para análise do Senado.

A reunião está marcada para as 16h30, no plenário 6.

ÍNTEGRA DA PROPOSTA: PL-6621/2016

Da Redação – MB, Agência Câmara Notícias


China entra para grupo de 20 economias mais inovadoras do mundo


A China tornou-se uma das 20 economias mais inovadoras do mundo, enquanto a Suíça manteve o primeiro lugar no ranking do Índice Global de Inovação (GII, na sigla em inglês), publicado anualmente por Universidade de Cornell, Instituto Europeu de Administração de Empresas (INSEAD) e Organização Mundial da Propriedade Intelectual (OMPI).



Os vinte primeiros lugares ficaram com:

Atualmente em sua 11ª edição, o índice é uma ferramenta quantitativa detalhada que ajuda os tomadores de decisão do mundo todo a entender melhor como estimular a atividade inovadora que impulsiona o desenvolvimento humano e econômico.

O índice classifica 126 economias com base em 80 indicadores, que vão de taxas de registro de propriedade intelectual à criação de aplicativos móveis, gastos com educação e publicações científicas e técnicas.

A China ficou em 17º lugar no ranking, o que representa um avanço para uma economia que passa por uma rápida transformação, guiada por políticas governamentais que priorizam o investimento intensivo em pesquisa e desenvolvimento.

Embora os Estados Unidos tenham voltado ao posto número seis da lista, o país permanece como uma potência inovadora que produziu muitas das principais empresas de alta tecnologia do mundo e outras inovações que mudaram o cotidiano das pessoas.

“A rápida ascensão da China reflete uma direção estratégica da alta liderança do país para o desenvolvimento da capacidade de inovação e a mudança da base estrutural da economia para indústrias mais intensivas em conhecimento que dependem da inovação para manter vantagem competitiva”, disse o diretor-geral da WIPO. Francis Gurry. “Isso anuncia a chegada da inovação multipolar”.

América Latina e Caribe
O Chile ocupa o 47º lugar no ranking deste ano, o primeiro lugar da região da América Latina e Caribe, com pontos fortes em qualidade regulatória, matrícula no ensino superior, acesso a crédito, empresas que oferecem treinamento formal, criação de novos negócios e entradas e saídas de investimentos estrangeiros diretos.

A Costa Rica ocupa o segundo lugar na região. O país se destaca nos gastos com educação, acesso ao crédito, produtividade por trabalhador, pagamento de propriedade intelectual e alta participação da exportação de serviços de informação, comunicação, impressão e outras mídias.

O México, terceiro na região, tem como pontos fortes a facilidade de obtenção de crédito, manufatura técnica, importações e exportações técnicas e exportações de bens criativos.

O Brasil, a maior economia da região, ficou em 64º lugar no ranking deste ano, subindo cinco posições. O país tem força comparativa nos gastos com pesquisa e desenvolvimento, importações e exportações de alta tecnologia, qualidade de publicações científicas e de universidades, com destaque para a Universidade de São Paulo (USP), a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

“O Índice de Inovação Global é importante para construir e aperfeiçoar as políticas de inovação do Brasil, uma vez que aponta nossas oportunidades de melhorias e também nossos pontos fortes”, disse Robson Andrade, presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI).

“É também um instrumento vital para a definição de novas políticas. Com a nova revolução industrial, a inovação tem um novo peso para o desenvolvimento e a competitividade dos países, e o Brasil deveria seguir esse caminho”, disse.

“As pequenas empresas são uma força econômica e social fundamental para o desenvolvimento de nosso país, e inovar é estratégico na busca de maior competitividade na economia brasileira”, afirmou Heloísa Menezes, diretora técnica no exercício da presidência do Sebrae. A CNI e o Sebrae também são parceiros do GII.

Xangai, China. Foto: ONU-Habitat/Julius Mwelu


Congresso vota amanhã diretrizes orçamentárias para 2019


O Congresso Nacional agendou sessão para esta quarta-feira (11), às 13h, para votar o projeto da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) para 2019. Antes, entretanto, a proposta precisa passar pelo crivo da Comissão Mista de Orçamento (CMO), que tem reuniões no mesmo dia marcadas para às 11h30, 14h, 16h e 18h. Ou seja, a votação no Congresso pode atrasar se a votação na CMO demorar para ser concluída.

Segundo afirmou em entrevista coletiva o relator do projeto da LDO (PLN 2/2018), senador Dalirio Beber (PSDB-SC), seu relatório foi elaborado com base nas 1,9 mil emendas apresentadas e em negociações com o governo. O texto, segundo ele, prioriza os dois pontos que a curto prazo mais pressionam as contas públicas: excesso de incentivos fiscais, que devem somar cerca de R$ 300 bilhões este ano, e o aumento das despesas obrigatórias, que dobraram de valor desde 2010.

Para combater o desequilíbrio fiscal, o texto propõe medidas como corte de despesas administrativas, veto a qualquer reajuste ao funcionalismo público e proibição de concessão de novos incentivos às custas do Orçamento. Dalirio disse que o parecer visa entregar ao futuro presidente da República, que tomará posse em janeiro, um cenário fiscal menos desfavorável.

Além de medidas na área econômica, o senador propôs mudanças no orçamento das áreas sociais. Educação e Saúde seriam as mais beneficiadas.

O relator também incluiu dispositivos voltados à transparência das contas públicas. O relatório exige, por exemplo, que os conselhos de fiscalização de profissões divulguem trimestralmente na internet os orçamentos, resultados de auditorias independentes e salários dos dirigentes. Esses conselhos atuam sob a forma de autarquias federais, e as anuidades que recebem dos associados são consideradas receitas públicas.

Depois de aprovada pelo Congresso a LDO 2019 seguirá para sanção presidencial.

Regra de ouro
O relatório manteve dispositivo proposto pelo governo que autoriza o pagamento de despesas correntes com recursos vindos da emissão de títulos públicos além do limite permitido pela Constituição. O governo deverá enviar ao Congresso um projeto de crédito solicitando a autorização para a emissão dos títulos.

Segundo a Constituição, a emissão de dívida deve estar limitada ao tamanho das despesas de capital, como investimentos. Essa trava é chamada regra de ouro das finanças públicas. Para 2019, o governo alega que não conseguirá cumprir a norma, necessitando da chancela do Congresso para emitir mais títulos.

O relator ainda incluiu no texto dispositivos para tornar mais transparente a operação. Assim, o governo terá que indicar claramente as despesas que serão financiadas pela emissão de novas dívidas. Os gastos ficarão discriminados em uma rubrica específica, facilitando o acompanhamento.

Como compensação, o governo terá que enviar ao Congresso um plano de revisão de gastos e receitas que inclua, ao longo de dez anos, a redução pela metade dos incentivos fiscais atualmente existentes. A meta é diminuir esses benefícios para 2% do PIB.

Créditos adicionais
Na pauta da sessão do Congresso estão outros três projetos: o PLN 13/2018, que abre crédito suplementar de R$ 991,8 milhões para o Sistema Único de Saúde (SUS) e programas de saneamento básico, esporte, irrigação e desenvolvimento sustentável; o PLN 9/2018, que propõe crédito especial de R$ 92,2 milhões em favor das Justiças Federal, Eleitoral e do Trabalho e do Ministério Público da União (MPU); e o PLN 10/2018, que destina crédito suplementar no valor de R$ 15,4 milhões ao MPU e às Justiças Federal e do Trabalho.

LDO
A Lei de Diretrizes Orçamentárias é uma das três grandes normas do processo orçamentário brasileiro, o instrumento por meio do qual o governo estabelece as metas, diretrizes e prioridades da administração pública federal, como as obras e os serviços mais importantes a serem realizados, incluindo as despesas para o exercício financeiro subsequente. Ela também dispõe sobre as alterações na legislação tributária e define a política de aplicação dos recursos das agências financeiras oficiais de fomento.

É também a LDO que registra as projeções macroeconômicas do governo para o ano seguinte, como as metas inflacionária e de resultado primário, a expectativa de crescimento do PIB e a projeção de quanto será o salário mínimo, cujo valor está previsto na proposta deste ano em R$ 998,00, a vigorar a partir de janeiro de 2019.

Anualmente o chefe do Executivo consolida as sugestões dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário e do Ministério Público e Defensoria Pública, elabora a proposta de LDO, com auxílio do Banco Central e dos ministérios do Planejamento e da Fazenda, e a envia ao Congresso até 15 de abril. A peça precisa ser aprovada pelo Parlamento até 17 de julho, véspera do início do recesso parlamentar do meio do ano.

Por fim, é a partir da LDO que o Executivo elabora a Lei Orçamentária Anual (LOA), que prevê as origens e finalidades dos recursos públicos, também chamada Orçamento Público, Orçamento da União ou, simplesmente, Orçamento.

Proposições legislativas: •  PLN 10/2018, •       PLN 13/2018, •          PLN 2/2018, •         PLN 9/2018

Marcos Oliveira = Agência Senado


Nova molécula é candidata para tratamento contra a malária


Uma nova molécula, sintetizada em laboratório, figura como forte candidata para o desenvolvimento de fármaco contra a malária. A possibilidade de um novo medicamento traz esperança a milhares de pacientes infectados pelo Plasmodium falciparum, um dos protozoários causadores da malária, sobretudo pelo fato de os testes mostrarem que a molécula foi capaz de matar, inclusive, a cepa resistente aos antimaláricos convencionais.

Em testes realizados em camundongos e em cultivo in vitro, molécula desenhada no Centro de Pesquisa e Inovação em Biodiversidade e Fármacos (CEPID-FAPESP) foi capaz de matar o parasita da malária (imagem: CIBFar)

A molécula apresenta baixa toxicidade e alto poder de seletividade, atuando apenas no protozoário e não em outras células do organismo do hospedeiro. É derivada da classe das marinoquinolinas, com destacada atividade biológica, e foi desenvolvida no Centro de Pesquisa e Inovação em Biodiversidade e Fármacos (CIBFar) – um Centro de Pesquisa, Inovação e Difusão (CEPID) financiado pela FAPESP. O estudo também recebeu o apoio financeiro do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e do Instituto Serrapilheira.

Em artigo publicado no Journal of Medicinal Chemistry, os pesquisadores descrevem a ação inibitória da molécula na fase sanguínea e hepática do ciclo assexuado do protozoário, responsável pelos sinais e sintomas da doença.

Além dos estudos realizados com cepas de cultivo in vitro, os pesquisadores também testaram a molécula em camundongos. “Nos testes, já no quinto dia de estudo a molécula conseguiu reduzir 62% da quantidade de parasitas no sangue (parasitemia). Ao fim dos 30 dias de teste, todos os camundongos que ingeriram doses da molécula sobreviveram”, disse Rafael Guido, professor no Instituto de Física de São Carlos (IFSC) da Universidade de São Paulo (USP) e um dos autores do artigo, à Agência FAPESP.

Os testes foram realizados em modelo animal infectado por P. berghei, visto que o P. falciparum não infecta camundongos.

Inspiração vinda do mar
A molécula candidata a virar fármaco foi sintetizada tendo como base compostos naturais encontrados em bactérias marinhas, conhecidas como marinoquinolinas, que foram avaliadas quando descobertas contra a malária, doença de chagas e tuberculose. No entanto, os produtos naturais apresentaram apenas ação de moderada a fraca contra os patógenos.

“O núcleo dessas moléculas, conhecido por pirroloquinolina [que contém o núcleo 3H-pirrolo[2,3-c]quinolínico], nos chamou a atenção. Esta é uma estrutura rara dentre produtos naturais e pouco abordada na literatura científica”, disse Carlos Roque Duarte Correia, professor no Instituto de Química da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
Em 2012, o grupo de pesquisadores da Unicamp publicou uma das primeiras sínteses das marinoquinolinas naturais na literatura.

“Durante o trabalho de síntese percebemos o enorme potencial farmacológico dessas moléculas. Fizemos então novas modificações estruturais na parte pirroloquinolina, empregando eficientes processos catalíticos, e a partir da estrutura obtida criamos uma nova molécula com potência ampliada em centenas de vezes contra o P. falciparum e sem aumentar sua toxicidade”, disse Guido.

Duarte Correia conta que, no estudo, foram testadas as 50 primeiras moléculas desenvolvidas a partir das marinoquinolinas. “Esse trabalho, no entanto, não para nessa publicação. Temos ainda uma série de outros compostos sendo desenvolvidos”, disse.

O grupo está caracterizando ainda o potencial dessa classe para tratar a malária causada por Plasmodium vivax, a forma da malária mais prevalente no Brasil, e está desenvolvendo a parte de farmacocinética do projeto – a reação do organismo ao medicamento.

“Se as propriedades do composto, como solubilidade, absorção, distribuição, metabolismo e excreção não forem adequadas, ele pode ser acumulado no organismo e se tornar tóxico para o paciente, o que inviabilizaria o medicamento. Após terminarmos essa etapa, nosso objetivo é fazer testes pré-clínicos e clínicos”, disse Guido.

Morto de fome
Os mecanismos de ação da molécula ainda não são totalmente conhecidos. Sabe-se, porém, que entre eles está uma via clássica de inibição do parasita, conhecida como metabolismo de hemozoína.

Essa estratégia consiste em manter baixa a concentração desse composto que é tóxico para o parasita. Quando o parasita se instala no hospedeiro, ele infecta primeiramente as hemácias (glóbulos vermelhos), pois a hemoglobina presente nessas células é a única fonte de energia que ele tem para consumir. Mas a hemoglobina contém uma molécula de cofator ligada em sua estrutura chamada grupo heme, que na forma livre – quando está desligado da hemoglobina – é altamente tóxico para os parasitas.

Anos de evolução deram ao parasita a capacidade de desenvolver um mecanismo que polimeriza esse grupo, livrando-se assim de sua toxicidade. “Essa estratégia do parasita de obter energia sem se intoxicar funciona mais ou menos como jogar a poeira para baixo do tapete. O grupo heme continua lá, mas em uma forma polimerizada e insolúvel que não é tóxica para o parasita”, disse Guido.

A molécula desenvolvida pelo grupo de pesquisadores do CIBFar atua, entre outros mecanismos, impedindo essa polimerização e, assim, o parasita é intoxicado pelo grupo heme.

“A molécula atua impedindo a formação do polímero hemozoína, que é a forma que o parasita desenvolveu para se livrar da toxicidade do grupo heme. Ao impedir a formação da hemozoína o parasita morre”, disse Célia Regina Garcia, professora na Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade de São Paulo e também autora do artigo. Garcia trabalhou em parceria com o CIBFar e foi responsável pelos testes do mecanismo de ação da molécula no parasita.

Cepas resistentes
Outro indicador de que a derivada de marinoquinolina é forte candidata a fármaco está no fato de ela conseguir matar cepas resistentes a três dos principais medicamentos contra a malária: cloroquina, pirimetamina e sulfadoxina.

“A cloroquina tem sido pouco usada para o tratamento da malária falciparum, a malária responsável pelos casos mais graves e fatais da doença, e a expectativa é que a artemisinina siga o mesmo caminho. Atualmente, a artemisinina é o principal fármaco em uso para o tratamento da malária. Embora ainda eficaz, é um fármaco com os anos contados por causa da resistência, e essas cepas resistentes estão se alastrando em toda a Ásia. Existe, portanto, uma preocupação mundial em desenvolver fármacos para a malária e eu acho que o Brasil é um país que tem potencial de emergir nessa área”, disse Garcia.

De acordo com dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) a malária mata hoje 445 mil pessoas por ano. “Se hoje, com o medicamento eficaz, temos um número tão alto de mortes, se não houver o desenvolvimento de novos fármacos no futuro a malária pode matar muito mais. É a parasitose que mais mata no mundo ainda que atualmente tenha tratamento relativamente eficaz”, disse Guido.

O artigo Discovery of Marinoquinolines as Potent and Fast-Acting Plasmodium falciparum Inhibitors with in Vivo Activity (doi: 10.1021/acs.jmedchem.8b00143), de Anna Caroline Campos Aguiar, Michele Panciera, Eric Francisco Simão dos Santos, Maneesh Kumar Singh, Mariana Lopes Garcia, Guilherme Eduardo de Souza, Myna Nakabashi, José Luiz Costa, Célia R. S. Garcia, Glaucius Oliva, Carlos Roque Duarte Correia e Rafael Victorio Carvalho Guido, pode ser lido no Journal of Medicinal Chemistry em https://pubs.acs.org/doi/10.1021/acs.jmedchem.8b00143 

Maria Fernanda Ziegler  |  Agência FAPESP


Operação Ressonância contou com a colaboração técnica do TCU


Em todas as licitações na saúde do Rio de Janeiro, analisadas pelo Tribunal, foram constatados elementos de direcionamento, valores pagos a maior na execução contratual, falta de prestação de contas e superfaturamento
                                                                                                                                                  Créditos: iStock
Na última semana foi deflagrada a Operação Ressonância, do Ministério Público Federal e da Polícia Federal, que é derivada da Fatura Exposta (2017), que, por sua vez, é desdobramento da Lava Jato no Rio de Janeiro. A operação atual investiga contratos na área da saúde celebrados pelo governo do Estado do Rio de Janeiro e pelo Instituto Nacional de Traumatologia e Ortopedia Jamil Haddad (Into). A Ressonância se baseia, em grande parte, nas informações de processo do Tribunal de Contas da União (TCU) relatado pelo ministro Bruno Dantas. Conheça a seguir os detalhes dessa atuação do Tribunal.

No começo de 2017, foi realizada reunião de auditores do TCU com os procuradores da República que atuaram na Operação Fatura Exposta. Dessa forma, o Tribunal teve acesso à colaboração premiada de antigo assessor jurídico do Instituto Nacional de Traumatologia e Ortopedia (Into).

Diante dessas informações, os auditores da Corte de Contas, em contato com membros do Ministério Público Federal no Rio de Janeiro (MPF-RJ), começaram a cogitar a possibilidade de o Tribunal de Contas da União realizar uma fiscalização. O objetivo da auditoria seria verificar a existência de direcionamentos em certames, relativas a restrição à competitividade. Tais como especificações excessivas do objeto, cotação de preços indevida, falta de publicação em todos os meios de divulgação exigidos pela legislação, ausência de equalização das propostas e desrespeito às questões tributárias no pagamento do objeto contratado.

A proposta de auditoria foi submetida ao ministro-relator Bruno Dantas, que autorizou a realização. Assim, em junho de 2017, foi iniciada a fiscalização com o objetivo de verificar a legalidade dos pagamentos, relacionados aos contratos de importação de equipamentos de saúde, realizados com recursos federais no Estado do Rio de Janeiro, principalmente pelo Into.
A amostra da fiscalização foi definida considerando materialidade, relevância e risco, sendo selecionados nove pregões para serem auditados pela equipe do TCU.
Na execução dos trabalhos, foi solicitado ao ministro-relator permissão para a participação de especialistas (engenheiros clínicos) da Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh). A solicitação foi autorizada pelo Plenário do TCU, por meio do Acórdão 1745/2017.

Em todos os processos analisados pela equipe de fiscalização do Tribunal foram constatados elementos de direcionamento nas licitações, assim como valores pagos a maior (débito) na execução contratual. Tanto por falta de prestação de contas, quanto por superfaturamento no preço efetivamente pago.

Os achados foram evidenciados no relatório de auditoria (TC 014.858/2017-7) por meio de um conjunto de vários e sucessivos indícios coincidentes. Não houve a publicação do edital em qualquer veículo internacional de divulgação. Além disso, os pregões foram realizados na forma presencial quando deveriam ter sido eletrônicos.

A auditoria do TCU verificou ter havido simulação de competição na fase de lances. Por outro lado, constava exigência indevida da carta de solidariedade no edital (documento que credenciava a empresa pelo fabricante). Em acréscimo, a Corte de Contas apontou como achados a utilização do preço global ao invés de preço por item, especificação excessiva do objeto e pesquisa inadequada de mercado.

Foi ainda observado pela fiscalização que as ordens bancárias foram feitas com base em licenças de importação canceladas. No que concerne ao recebimento dos objetos, faltou a devida prestação de contas, uma vez que não havia o que comprovasse a entrega dos equipamentos, tais como fotos, termos de recebimentos, conhecimento de transporte, entre outros.

O acórdão relatado pelo ministro Bruno Dantas ainda menciona ter havido pagamentos para empresas que não participaram da licitação e a contração de consultoria clínica para especificar objetos desnecessários.

O volume total de recursos fiscalizados alcançou R$ 178.315.100,70, que corresponde ao somatório do valor homologado nos seguintes pregões realizados pelo Into: 124 e 135, de 2006; 146, 147 e 171, de 2007; 135, de 2008; 131 e 164, de 2009; e o 193, de 2010.
Um dos achados de auditoria é a perspectiva de recuperação de R$ 86 milhões (valores históricos), decorrentes de indícios de superfaturamento (de preço e de quantidade) nas aquisições de equipamentos hospitalares importados, a serem devidamente apurados em processos de tomadas de contas especiais (em andamento).

A conclusão do trabalho da Corte de Contas deixou evidente que não foi realizada equalização das propostas dos licitantes nacionais e estrangeiros, conforme previsto em lei, pois somente participaram dos nove certames fiscalizados empresas com representante no Brasil, mas com propostas para importação direta do exterior. Portanto, não era necessário descontar os gravames tributários para fins do pagamento do bem adquirido.

Nessas circunstâncias, as propostas de encaminhamento foram no sentido de citar solidariamente servidores do Into, licitantes vencedoras, e seus sócios e administradores, com a desconsideração da personalidade jurídica, pelas suas condutas individualizadas. Em acréscimo, os servidores citados foram advertidos sobre a possibilidade da aplicação da sanção de inabilitação para o exercício de cargo em comissão ou função de confiança no âmbito da administração pública federal.

Após a conclusão dos trabalhos conduzidos pela equipe de auditoria, os autos foram encaminhados para a deliberação do Plenário do TCU. O processo foi apreciado em junho, por meio do Acórdão 1290/2018, da lavra do ministro Bruno Dantas.

A decisão do Tribunal fixou prazo para que as empresas apresentassem justificativas sobre as evidências de fraude à licitação. Além disso, essa deliberação da Corte de Contas foi encaminhada à Procuradoria da República no Estado do Rio de Janeiro (MPF-RJ) para as devidas providências que entender pertinentes.

Foram autuados nove processos apartados de tomadas de contas especiais. Atualmente, encontram-se em fase de citação dos responsáveis para apresentarem alegações de defesa em observância ao contraditório.

Essa nova operação do MPF-RJ (Operação Ressonância), se baseou nesse processo de auditoria do TCU, além de colaborações premiadas de investigados e outras informações obtidas pelo próprio Ministério Público Federal. 

Serviço:
Leia a íntegra da decisão: Acórdão 1290/2018 – Plenário
Processo: TC 014.858/2017-7
Sessão: 6 de junho de 2018
Secom – ED/ed


Indústria farmacêutica é o 2º setor que mais investe em inovação no Brasil


Os laboratórios farmacêuticos ocupam a segunda colocação, entre os 21 setores do ranking do anuário Valor Inovação Brasil 2018, com o maior nível de investimento da receita líquida em atividades de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D).

A inovação é a principal prioridade na agenda estratégica de 62% das empresas da área farmacêutica e de ciências da vida no Brasil, estando atrás apenas do setor de bens de consumo (67%).

A busca pelo desenvolvimento de novas moléculas e medicamentos e a condução de estudos clínicos que validem as descobertas levam o segmento a investir em P&D uma mediana superior a 5% do faturamento anual.

No Top 10 das empresas mais inovadoras do país está o laboratório Aché, na 8ª posição.

Veja abaixo as reportagens do anuário Valor Inovação Brasil 2018.

Intensidade na pesquisa
Jornalista: Felipe Datt

A inovação é a principal prioridade na agenda estratégica de 62% das empresas da área farmacêutica e de ciências da vida no Brasil. Trata-se do segundo maior percentual entre todos os segmentos do levantamento, atrás apenas de bens de consumo (67%), conforme o ranking Valor Inovação Brasil 2018. A busca pelo desenvolvimento de novas moléculas e medicamentos e a condução de estudos clínicos que validem as descobertas levam o segmento a aparecer na segunda posição entre os 21 pesquisados quanto ao nível de investimento da receita líquida em P&D, com uma mediana superior a 5% do faturamento anual.

O setor é também o quarto que mais investe em inovações não rotineiras ou incrementais: 53% dos recursos. Líder na produção de anestésicos na América Latina, o Laboratório Cristália dedicou 6% do faturamento de RS 1,9 bilhão em 2017 para atividades de pesquisa, desenvolvimento e inovação. Para 2018, a empresa está investindo RS 20 milhões na ampliação de sua unidade de P&D, localizada no complexo industrial de Itapira (SP), e que reúne uma equipe de 300 pesquisadores que se dedicam a buscar inovações em três áreas: farmacêutica, Farmoquímica e biotecnológica.

Com expertise para o desenvolvimento de todas as etapas de produção de um novo produto, da concepção da molécula ao medicamento final, o laboratório de origem nacional lançou 29 novos produtos no mercado nos últimos anos, alcançando um total de 105 patentes (em países como Brasil, Argentina, Canadá, China, EUA e Japão), além de 207 depósitos de pedidos de patentes.

“A inovação mais radical que desenvolvemos foi um produto para disfunção erétil, o Helleva. É da mesma família do Viagra, mas com uma molécula nova, desenvolvida inteiramente no Brasil", afirma o presidente do Conselho Diretor do laboratório, Dr. Ogari Pacheco. As inovações não se restringem à pesquisa de novas moléculas. Um dos principais produtos que nasceram do centro de P&D da companhia foi uma embalagem inovadora que contribuiu para mitigar os riscos de infecção hospitalar nos centros cirúrgicos-
a embalagem também é esterilizada na parte exterior. Batizada de sterile pack, essa embalagem é utilizada atualmente em todos os produtos hospitalares do Cristália, como anestesias e morfinas.

Entre os projetos em desenvolvimento pelo Cristália anualmente, pelo menos 25% são classificados como inovações radicais. Nesse momento, está em curso o desenvolvimento de um inovador hormônio de crescimento para evitar o nanismo. O medicamento atual é utilizado pelos pacientes em doses diárias. “Estamos desenvolvendo um hormônio de longa duração, permitindo ao paciente uma injeção a cada 15 dias. já conseguimos isolar a molécula e precisamos traduzir isso em medicamentos. A expectativa é que isso ocorra dentro de três anos", diz.

A Libbs direciona 10% do faturamento para P&D e inovação, o dobro do verificado pela média do mercado. “A inovação nessa indústria é feita por poucas empresas e em poucos países. Entendemos que deveríamos trilhar o caminho da inovação e não da cópia. Para nos especializarmos e desenvolvermos produtos novos, teríamos que fazer um sacrifício em termos de investimentos”, afirma o presidente-executivo, Athayde Júnior.

Em 2016, a Libbs investiu RS 500 milhões na construção da primeira planta nacional para a produção de biossimilares em escala industrial no Brasil, a Biotec. Os medicamentos biossimilares são formulados a partir de materiais biológicos (produzidos a partir de células vivas, como bactérias, fungos ou células de mamíferos) e utilizados no tratamento de doenças autoimunes e cânceres avançados. A expectativa da Libbs é que, nos próximos anos, seis medicamentos biossimilares sejam produzidos na fábrica.

Em março de 2018, o laboratório começou a comercializar o primeiro biossimilar à base de anticorpo monoclonal (o trastuzumabe, utilizado no tratamento de câncer de mama avançado) no Brasil, um medicamento batizado de Zedora. O monoclonal é um anticorpo escolhido para ser clonado em laboratórios de biotecnologia e transformado em medicamento. A previsão é que, em cinco anos, o medicamento seja produzido 100% no Brasil - durante este tempo, a Libbs executará a transferência de tecnologia do biossimilar para o Instituto Butantan. “A transferência de biológicos é quase como o desenvolvimento de um novo produto, tamanha a complexidade”, diz.

Por meio de um contrato de Parceria de Desenvolvimento Produtivo (PDP) com o Ministério da Saúde, a Libbs levantou recursos com o BNDES e a Finep para a construção da planta e a transferência de tecnologia para o Brasil. O governo, por sua vez, se comprometeu a comprar o medicamento junto ao laboratório, com custos decrescentes ao longo dos anos. “O PDP é uma forma de contrato que o governo encontrou para quebrar o monopólio de insumos estratégicos, aumentando o número de ofertantes de um determinado medicamento”, diz.

Com um portfólio com mais de 200 produtos em fase de desenvolvimento clínico atualmente em seus centros globais de P&D, a Novartis tem como linha estratégica de inovação no Brasil a condução de estudos clínicos. No último triênio, o braço brasileiro do grupo farmacêutico de origem suíça investiu mais de R$ 222 milhões em pesquisas clínicas, que beneficiaram mais de 30 mil pacientes em cerca de 300 centros de pesquisa no Brasil.

Os estudos de desenvolvimento clínico são estratégicos para a indústria farmacêutica para a validação de novos medicamentos e terapias que tratem ou previnam doenças. No Brasil, os estudos clínicos da Novartis são conduzidos para o teste de inovações nas áreas de oncologia, cardiovascular, de biossimilares e cuidados oftalmológicos. “A Novartis é, seguramente, a primeira ou a segunda empresa farmacêutica que mais investe em estudos clínicos no Brasil”, diz o diretor de relações governamentais, João Sanches.

Conforme o especialista, apesar das excelentes condições para o desenvolvimento de estudos clínicos no Brasil (“em termos de oferta de infraestrutura, boa ciência e captação de pacientes”), a execução desses estudos ainda é desafiadora no Brasil por conta de aspectos regulatórios e legais. “A Anvisa tem diminuído os prazos para a condução de estudos clínicos no Brasil, que chegaram a ter um período de aprovação superior a um ano. Hoje este prazo está em seis meses, com tendência de diminuir”, diz. “Mas, para o Brasil ser competitivo globalmente, é preciso de um prazo médio menor. O Brasil não atrai hoje nem 1% dos investimentos mundiais em estudos clínicos, e poderíamos multiplicar esse número por cinco facilmente”, completa Sanches.

Já a Roche Farma Brasil direcionou um total de RS 400 milhões para pesquisa e desenvolvimento no Brasil nos últimos três anos - foram RS 160 milhões apenas em 2017. A linha estratégica de atuação é também a condução de estudos clínicos. Cerca de 240 centros de pesquisa locais estão envolvidos em mais de 85 estudos clínicos. Atualmente são cerca de 1,4 mil pacientes brasileiros envolvidos com as inovações em protocolos clínicos.

A Roche mantém, na sede no Jaguaré (SP), um departamento de pesquisa clínica com 42 profissionais dedicados a trazer estudos globais da companhia ao Brasil. A ideia é que todos os medicamentos desenvolvidos globalmente possam ser testados no país antes do lançamento. Os estudos são realizados em hospitais privados e também, na rede do Sistema Único de Saúde (SUS), com o intuito de testar novos medicamentos e terapias em áreas como a oncológica (tumores) e de neurologia (Alzheimer, esclerose múltipla, autismo), por exemplo. “Com os estudos clínicos, os pacientes têm acesso antecipado a terapias que podem prolongar a vida ou mesmo curar suas doenças”, diz o presidente da Roche Farma Brasil, Rolf Hoenger.

Em outra frente, a empresa vem fomentando o desenvolvimento das healthtechs, as startups que apostam em tecnologias desmotivas para transformar o segmento de saúde. No ano passado, a empresa patrocinou a primeira edição do Desafio Roche para Startups, com o tema “Transformando a Jornada Oncológica". Para a edição 2018 do desafio, a busca é por empresas novatas com abordagens inovadoras em projetos de gestão digital de dados para o setor de saúde (a exemplo de novos prontuários médicos eletrônicos, sensores wearable, softwares para diagnósticos remotos automatizados etc.).

Na edição passada, a vencedora foi a startup gaúcha Ziel Biosciences, que inovou na metodologia de prevenção do câncer de colo do útero com um dispositivo que permite a coleta do exame por pessoas não especializadas - o que pode facilitar a detecção do papiloma vírus humano (HPV) em regiões de difícil acesso para os serviços de saúde. A Roche auxiliará as startups com a participação em congressos internacionais e mentoria. “Ao aumentar as interações externas, a Roche consegue identificar mais facilmente onde estão as melhores ideias. Eventuais aquisições serão estudadas caso a caso”, diz Hoenger.

Aché: Aprender com o que a natureza ensina
Jornalista: Stella Fontes

Ao mesmo tempo em que elevou o investimento em inovação incremental, o Aché, uma das maiores farmacêuticas do Brasil, estruturou as bases para uma nova onda de lançamentos que prometem ter grande impacto na saúde cia população. Em quatro ou cinco anos, conta Stephani Saverio, diretor de inovação e novos negócios do Aché, moléculas que estão em fase de gestação no laboratório, fruto de projetos de inovação radical, chegarão ao mercado com a expectativa de revolucionar o tratamento de doenças como vitiligo e transtorno de ansiedade.

Entre as farmacêuticas de capital nacional, o Aché foi pioneiro em inovação radical. Em 2005, após duas décadas de pesquisas, lançou o anti-inflamatório Acheflan, produzido a partir do extrato da Corclia verbenacea, planta brasileira popularmente conhecida como erva-baleeira ou maria-milagrosa. De lá para cá, a área de pesquisa e desenvolvimento do laboratório cresceu, ultrapassou fronteiras nacionais e plantou as sementes do ciclo de lançamentos que se avizinha.

O pioneirismo colocou o laboratório na dianteira em relação ao desenvolvimento de novas moléculas, projetos que tradicionalmente demandam investimento elevado e têm ciclo longo de maturação. Mais do que isso, representou uma oportunidade de aprender e avançar alguns passos frente à concorrência, ressalta Saverio.

Assim como ocorreu com o Acheflan, a biodiversidade brasileira segue no radar do Aché. De acordo com Saverio, o Brasil conta com 25% de toda a biodiversidade mundial. E, de 2 milhões de espécies existentes, apenas 10% ou 15% foram catalogadas. Para o laboratório, essa riqueza é vista como uma grande oportunidade de aprendizado. A missão, nesse caso, é entender os diferentes mecanismos de ação de extratos e produtos naturais para desenvolver novos medicamentos, e não necessariamente um fitoterápico.

Para tanto, o laboratório brasileiro firmou, no fim de 2017, uma parceria com o Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM) e a empresa Phytobios para identificar substâncias bioativas em extratos vegetais e desenvolver medicamentos nas áreas de oncologia e dermatologia. “A ideia é entender e aprender a partir do que a natureza tem em termos de molécula para desenvolver novas estruturas, que podem ser inclusive semissintéticas ou totalmente sintéticas”, adianta.

É na biodiversidade que a farmacêutica enxerga o maior legado e oportunidade. Mas há outros projetos considerados relevantes em inovação radical. Em 2016, ingressou no Structural Genomics Consortium (SGC), parceria público-privada com sede em Toronto, no Canadá, para acelerar o desenvolvimento de novas drogas.

Como parte da parceria, o Aché utiliza seu Laboratório de Design e Síntese Molecular na investigação de enzimas ligadas à proliferação celular (quinases), com o objetivo de desenvolver novos tratamentos contra o câncer. A ideia é ampliar essa estrutura nos próximos meses. “Graças a ela conseguimos criar parcerias, como, por exemplo, o SGC, que são bases estruturais para a inovação de grande impacto.”

Sem descuidar dos projetos de pesquisa de ciclo mais longo, o laboratório brasileiro se vale de um extenso portfólio e de tecnologias já desenvolvidas internamente para avançar no terreno da inovação incremental, que parte de moléculas já existentes. “O Aché é empresa de A a Z, um laboratório que atua em diferentes categorias, e isso aumenta o espectro de oportunidades. É o substrato para trabalhar e gerar inovação incremental", ressalta.

O principal motor para esses projetos de inovação incremental é o tamanho do mercado farmacêutico brasileiro, que caminha para ser o quinto maior do mundo, a expectativa é a de que o país suba o degrau da sexta para a quinta posição em 2020. Essa escala já garante valor a esse tipo de desenvolvimento, diz Saverio.

O Aché acumula conhecimento em tecnologia para liberação controlada de fármacos, a partir da intervenção na biodisponibilidade das fórmulas, de forma a atender melhor à conveniência de pacientes e médicos. É o caso do Donila Duo, remédio usado no tratamento da doença de Alzheimer que combina, de maneira inédita, duas moléculas que eram tomadas separadamente em uma única pílula. Agora, a ideia é ampliar esse portfolio na área de asma e doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC), na qual o Aché é líder de mercado.

Outra frente muito importante para a inovação incremental no laboratório brasileiro é a aplicação da nanotecnologia para o desenvolvimento de novos fármacos. No fim de 2017, o Aché inaugurou em parceria com a Ferring Pharmaceuticals o primeiro laboratório de nanotecnologia do Brasil, o Nile (do inglês Nanotechnology Innovation Laboratory Enterprise). No início de 2018, o centro já estava em pleno funcionamento.

Novos produtos resultantes de inovação dessa natureza já têm sido colocados no mercado, enquanto na inovação radical o Aché está criando as bases para que possa apresentar novidades em quatro ou cinco anos, segundo Saverio. Mais recentemente, a partir da nova legislação de exploração da biodiversidade brasileira, novas oportunidades se abriram. E há projetos de inovação radical que entram agora em fase clínica - novas moléculas para ansiedade e para tratamento de vitiligo. “Assim que esses projetos chegarem ao mercado, a expectativa é de que o impacto seja muito forte para a indústria brasileira”, destaca o executivo.

Dentro do Aché, a área de inovação está organizada como núcleo que integra todas as áreas de pesquisa e desenvolvimento. Ali estão reunidos desde projetos de pesquisa básica, que surtem efeito na inovação radical e também incremental, a toda a área de desenvolvimento, incluindo desenvolvimento de negócios, e corpos técnico e clínico, uma vez que a área médica e de pesquisa clínica está inserida nesse núcleo. Ao todo, são quase 330 profissionais envolvidos.

A área de desenvolvimento de negócios, diz Saverio, reúne a equipe voltada à criação de novos produtos e negócios, parcerias e iniciativas de internacionalização da companhia. Há ainda tuna célula de desenvolvimento farmacotécnico e analítico, a de inovação incremental e outra de inovação radical, além da área clínica, que congrega o núcleo médico e científico, com 60 especialistas, que respondem também pela farmacovigilância do Aché.

A missão do laboratório, segundo Saverio, é ampliar as oportunidades de apresentação de novos produtos. Por ano, o Aché tem lançado em média 30 novos produtos, dos quais 30% a 35% na área de prescrição médica e os demais em isentos de prescrição (MlPs), dermatologia e genéricos. “Nossa meta é manter e ampliar esse número, sempre buscando maior diferenciação e inovação que possa suprir necessidades não atendidas de médicos e pacientes", diz o executivo.

Por ano, o laboratório investe em média 10% de seu resultado antes de juros, impostos, depreciação e amortização (Ebitda, na sigla em inglês) em projetos de inovação. Em 2017, foram R$ 90 milhões e, em 2018, o valor aplicado deve subir a R$ 100 milhões. A crise econômica enfrentada pelo país entre 2015 e 2017, observa Saverio, não mudou os planos da farmacêutica, ao menos nessa área. Como os ciclos de desenvolvimento são longos, e o impacto das crises ocorre já no curto prazo, a estratégia é manter o investimento e o cronograma previstos. “Não reduzimos o investimento durante esse solavanco”, afirma.

















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