O Tribunal de Contas da União
– TCU sobrestou, temporariamente, o processo da PDP até julgamento do mérito,
que pode ter comprometido o abastecimento por algum tempo. O Tribunal foi
motivado por suspeitar de sobrepreço nas vendas do Tecpar ao governo federal.
Avaliações iniciais dão conta de que o prejuízo está estimado em R$ 61 milhões.
Reportagens recentes informam
ainda que em outra ação, a Roche é acusada pelo Ministério Público
Federal do Distrito Federal de causar danos de R$ 107 milhões a 11 estados
brasileiros, também, por suspeita de sobrepreço na venda do medicamento.
Nos dois casos, as
investigações focam na “reduzida transparência da política de preços da
empresa”. O caso do trastuzumabe ficou emblemático pelo sobrestamento da PDP no
TCU, que ainda não avaliou o mérito do processo. As notícias distorcem
estrategicamente informações de que a empresa alavanca lucros através dos
projetos de PDP.
O Sistema Único de
Saúde – SUS, é o grande comprador do produto, que é referência contra um dos tipos
mais graves de câncer de mama e distribuído sem ônus para os pacientes, desde
2013. A Roche monopolizou as vendas até junho de 2019, quando venceu a patente
do medicamento. Com a Parceria para o Desenvolvimento Produtivo - PDP da
Axis, Tecpar com a Roche, garantiu 40% do mercado público para a multinacional,
durante a transferência de tecnologia, prevista para 10 nos a partir de 2017.
A transferência de tecnologia
de detentores de patentes de produtos inovadores para laboratórios públicos e
privados brasileiros, produtores de medicamentos tem dentre outros objetivos
capacitar a indústria local, aumentar a produção nacional de remédios
tecnologicamente avançados, adensar a cadeia envolvida, reduzir o volume de
divisas gastas com a importação do produto, gerar renda, empregos e tributos no
Brasil, reduzindo os custos para o SUS.
O modelo de negócio
desenvolvido, aprovado e implementado pelas PDPs no Brasil, inclui o custo da
aquisição da tecnologia no preço historicamente pago pelo medicamento nas compras
do MS. O sobrestamento do processo pela TCU considerou o valor 37%, a mais, que
elevou o preço de R$ 939, para R$ 1.293 por ampola, sem levar em conta o marco
regulatório, o projeto executivo, a obtenção (compra) da tecnologia, a
aquisição da propriedade dos direitos sobre o medicamento, que ao final do
projeto passa a ser propriedade do governo brasileiro por conta da
portabilidade contratada.
Inicialmente os preços
absolutos são maiores, mas ao logo do processo a transferência de tecnologia
vai reduzindo o valor de venda ano a ano em 5%, igualmente reduz o impacto
financeiro sobre a balança de pagamentos, gera o desenvolvimento da cadeia
produtiva, renda, tributos e empregos, desde o primeiro ano, e, a partir do 4
para o 5 ano os preços serão menores do que o praticado hoje sem a TT.
Hipoteticamente se o Brasil
adquirisse a tecnologia, separadamente do produto, estaria pagando
aproximadamente R$ 305 Milhões (61 x 5 anos) e seria proprietário de uma planta
industrial avaliada em USD 100 Milhões, teria os direitos parciais sobre o
produto e o MS passaria a comprar o medicamento abaixo do preço de referencia
hoje, chegando ao final do contrato, 10 anos depois pagando aproximadamente 50%
dos R$ 939 pagos hoje e teria um patrimônio industrial, tecnológico e sanitário
sobre o medicamento.
A complexidade e
especificidade das aquisições de plataformas tecnológicas se indevidamente
avaliadas podem suscitar manchetes espalhafatosas que se apreciadas
cuidadosamente trarão luzes sobre a realidade de cada projeto
A mídia atribui ao TCU a
suspeita de que o Marco Legal das PDPs, não teria sido cumprido por eventual
influência política do ex-ministro, Ricardo Barros, quando publica que a
análise do projeto deveria ter sido analisado por duas comissões do ministério, o que não aconteceu,
vejamos:
A Portaria GM-MS 2531 de 12 de
novembro de 2014, marco regulatório das PDPs foi publicada com a chancela do
então Ministro da Saúde, Arthur Chioro, e redefine as diretrizes e os critérios
para a definição da lista de produtos estratégicos para o Sistema Único de
Saúde (SUS) e o estabelecimento das Parcerias para o Desenvolvimento Produtivo
(PDP) e disciplina os respectivos processos de submissão, instrução, decisão,
transferência e absorção de tecnologia, aquisição de produtos estratégicos para
o SUS no âmbito das PDP e o respectivo monitoramento e avaliação.
A portaria do Ministro Ricardo
Barros, publicada em 20 de Fevereiro de 2017 efetivou o necessário reequilíbrio
produtivo entre os laboratórios públicos vocacionados e experientes em produtos
biológicos, tomando por base a capacitação dos laboratórios Fiocruz/Biomanguinhos,
Instituto Butantan e Tecpar que já produziam e forneciam soros e vacinas ao SUS
há mais de 10 anos, muito antes de qualquer indicação do Dep. Ricardo Barros
ser indicado para Ministro.
A reorganização das
plataformas tecnológicas equacionaram o processo de fabricação agrupando
produtos análogos na mesma planta, proporcionando economias potenciais
superiores a 2,1 bilhões de Reais. No projeto inicial o Brasil pretendia
construir mais de 12 complexos industriais, pelo menos 7 plantas nos laboratórios
oficiais, e outras tantas espelhadas nos parceiros locais, sendo cada uma
avaliada em mais 300 Milhões de Reais.
Sob a ótica operacional e da
regulação de risco sanitário a redistribuição das PDPs dos biológicos respeita
recomendações estratégicas internacionais de avaliação e gerenciamento de
riscos relacionados a toda cadeia produtiva que pode refletir no plano de
soberania e autossuficiência de produção local, inviabilizando a fabricação de
produtos de origem biológica com segurança e mitigação de potenciais riscos
contaminação cruzada. Motivações que contribuíram para que o MS, sempre que
possível lance mão de projetos de medicamentos análogos em diferentes complexos
industriais, como também busca produtos, que possam ser desenvolvidos em diferentes
plataformas tecnológicas, como historicamente aconteceu com praticamente todos
medicamentos para as DST-AIDS, soros, vacinas e agora com ao anticorpos
monoclonais.
Após a reorganização das PDPs,
três laboratórios oficias, Fiocruz-Biomanguinhos, Butantan e Tecpar estão se
estruturando para edificar os complexos industriais para fabricação de
anticorpos monoclonais onde são previstas 6 ou 7 plantas
As duas estâncias denominadas
como comissões na reportagem, são ultrapassadas, em função de:
- As PDPs redistribuídas foram avaliadas na
aprovação inicial como preconizado pelo fluxograma de processo do marco
regulatório, não foi acrescentado ou retirado qualquer produto,
modificados quaisquer quantitativos ou preços. A troca entre os parceiros
já aprovados, ofereceu isonomia de oportunidade para todos e não
comprometeu os cofres públicos.
- Todos os atores envolvidos; laboratórios
públicos, privados, detentores de tecnologia e parceiros locais,
trabalharam exaustivamente na racionalização das sinergias envolvidas na
cadeia que, induziram a reorganização pactuada e validada em diferentes
esferas, inclusive no GECIS
- Todos os atores concordaram com a
repactuação, sem qualquer questionamento ou judicialização
- Os processos foram apresentados e
validados em diferentes esferas. Culminando com a assinatura do Termo de
Compromisso – TC no GECIS - estância maior, acima dos chamados conselhos
- A redistribuição dos Produtos das PDPs de
biológicos, originalmente recomendada pela aprovação na Comissão Técnica
de Avaliação – CTA e aprovadas no Comitê Deliberativo - CD, com Termos de
Compromissos assinados no GECIS, foi realizada entre os Laboratórios
Oficiais que já detinham PDPs, aprovadas para produtos análogos, sem
comprometer ou causar danos ao erário
- A Comissão Técnica de Avaliação - CTA
instituída por força do marco regulatório, firmado pela autoridade máxima
do Ministério da Saúde, mesmo que através da SCTIE, cumpre papel
consultivo, avaliando os pareceres emitidos, inicialmente, pela Equipe
técnica da extinta CGBQB - DECIIS no âmbito da SCTIE do MS na fase de
submissão dos projetos.
- O Comitê Deliberativo – CD, igualmente,
instituído por força do marco regulatório, com a participação de membros
indicados pelas autoridades máximas de outros ministérios, publicado pelo
Ministério da Saúde, executa a segunda e decisiva fase do processo a nível
do Complexo Industrial, ratificado e validado cada processo encaminhado
pelo CTA, antes da submissão final ao GECIS, onde são assinados os Temos de
Compromisso - TC
- Todos e quaisquer processos tramitados no
CTA e no DC são submetidos, ratificados e validados no Grupo Executivo do
Complexo Industrial da Saúde – GECIS, que reúne o Fórum interministerial e
social – estância máxima, constituída por Lei, onde são apresentados,
ratificados e aprovados os projetos
- Estranho seria que projetos apresentados e
validados no GECIS - estância interministerial constituída em conjunto com
os representantes da sociedade civil -, tenha que ser novamente submetidos
a uma etapa infra ministerial da Saúde, comissão não deliberativa com
poderes e responsabilidades instituídas pela mesma autoridade máxima, o
Ministro da Saúde, que firmou a Portaria 2531 – marco regulatório das
PDPs. O então Ministro Ricardo Barros – autoridade máxima da pasta da
Saúde foi o signatário da Portaria da redistribuição pactuada, sem danos
ao erário.
- A ressubmissão questionada seria uma
novação, introduzindo novo rito não previsto no marco regulatório,
subordinaria o GECIS, colegiado interministerial formado, também, por
representantes da sociedade civil a uma comissão não deliberativa
.
Observadas as regras preconizadas
pelo marco regulatório, sem novações, evidencia que o grande privilegiado com a
redistribuição pactuada das PDPs de biológicos, aprovadas no GECIS será o País,
que recebe tecnologias de fronteira do conhecimento, verticaliza o parque
tecnológico da saúde, proporciona absorção de plataformas biofarmacêuticas
sinérgicas às suas competências, consolida metodologias utilizadas nos soros e
vacinas que já são produzidos pelas Instituições, desenvolve medicamentos
patenteados localmente, encurtando e ampliando a velocidade de acesso à
população, reduz a demanda de elevados investimentos em plantas industriais que
ficariam ociosas, dentre outras tantas mais valias proporcionadas pelas PDPs.
Os laboratórios oficiais
produtores públicos de medicamentos de origem biológica, exceto a Fiocruz,
pertencem aos Estados; Butantan a SP, Tecpar ao Paraná, considerando que os
produtos objeto das PDPs são adquiridos pela União e redistribuídos aos Estados
e Municípios no âmbito da pactuação da tripartite.
Esperar que Estados como São
Paulo e o Paraná realizem investimentos para que seu laboratório oficial
adquira tecnologias, se capacite e, se qualifique para fabricar medicamentos
para o único comprador que é o Ministério da Saúde é praticamente uma utopia,
nenhum gestor estadual considera direcionar elevadíssimos recursos de seu
orçamento, deixando de investir em saúde, segurança, educação e outras
prioridades do Estado para cumprir exigências regulatórias e sanitárias para
produzir para a União.
Pensando nisso o próprio
governo federal criou o PROCIS, publicado pelo Ministro Alexandre Padilha, na
Portaria Nº 506, de 21 de março de 2012 que Instituiu o Programa para o
Desenvolvimento do Complexo Industrial da Saúde (PROCIS) e seu Comitê Gestor no
MS, que avalia projetos exequíveis e disponibiliza recursos que contribuem para
sua implementação. 53 Instituições foram beneficiadas com os recursos do
Programa, R$ 651,9 milhões foram disponibilizados para melhorar
infraestrutura, gestão e qualificação de instituições públicas, não
apenas os R$ 82 milhões direcionados ao Tecpar.
O Tecpar alega que cobrou mais
caro do Ministério da Saúde para investir o ganho extra (R$ 61 milhões) nas
três empresas parceiras e nas atividades de “transferência de tecnologia
Para garantir o abastecimento
até janeiro de 2020 o MS realizou uma compra emergencial no fim de 2018, e
abriu licitação para comprar 435 mil ampolas, o pregão foi concluído com
um valor mais barato pela ampola, R$ 894 (queda de 4,7% sobre R$ 939), contrato
de quase R$ 400 milhões.
A PDP entre o Tecpar e a Roche
depende do julgamento do mérito do processo pelo TCU. Mais de 9 mil brasileiras
fazem uso do trastuzumabe no SUS, segundo o Ministério da Saúde. A pasta
informou que “possui outras fontes de aquisições de produtos além daquelas
realizadas no âmbito das PDP vigentes e em fase de fornecimento”. Roche e
Tecpar não comentaram o desabastecimento, que atualmente está normalizado.
(Leia na íntegra os posicionamentos do Ministério da Saúde e do Tecpar).
Enquanto o MS, aguarda o
julgamento do mérito do processo pelo TCU fica impedido de retomar o rito da
PDP e com isso refém da exclusividade do fabricante do medicamento inovador, já
que a outra potencial parceria entre o Butantan e a Libbs aparentemente não
está pronta para atender às demandas do SUS.