Redação do Site InovaçãoTecnológica
Interfaces eletroquímicas
Nas baterias,
nas células
a combustível e em inúmeros processos na indústria, você sempre
encontrará um eletrodo metálico em contato com um eletrólito, o que torna essa
uma das interfaces mais importantes da química.
Em todos esses casos, um
pedaço de metal está em contato com uma solução salina, que contém partículas
carregadas positiva e negativamente, chamadas íons - os íons de lítio das
baterias, por exemplo.
Se você ampliasse a interface
entre o eletrodo e a solução salina, perceberia todos os tipos de interações.
Por exemplo, a superfície do
eletrodo existe uma escassez ou uma abundância de elétrons. Essa carga atrai os
íons da solução salina para que eles se acumulem no líquido próximo ao
eletrodo. Essa estrutura de cargas é chamada de "dupla camada
elétrica" - se você alterar a tensão no dispositivo, a camada dupla também
será alterada.
Teoria de Gouy-Chapman
A distribuição de cargas
nessas reações eletroquímicas é explicada em detalhes pela chamada teoria de
Gouy-Chapman (Louis Georges Gouy [1854-1926] e David Leonard Chapman
[1869-1958]).
Ou, pelo menos, é assim que
todos os químicos consideravam até agora.
Kasinath Ojha e seus colegas
da Universidade Leiden, nos Países Baixos, acabam de descobrir que a descrição
oferecida pela teoria de Gouy-Chapman não bate com a realidade.
"É uma teoria clássica
com mais de cem anos, verificada nas décadas de 40 e 50 do século XX por David
Grahame com mercúrio como eletrodo, porque as medições com metais sólidos eram
mais difíceis. As pessoas assumiram que a teoria também seria aplicável a
metais sólidos, como a platina, mas acontece que este não é o caso,"
resumiu o pesquisador Marc Koper, membro da equipe.
A boa notícia é que a equipe
já deu um "upgrade" na teoria, criando uma descrição que bate com a
realidade.
Teoria versus realidade
Usando a teoria de
Gouy-Chapman descrita nos livros-texto, é possível prever em qual tensão
elétrica as interações na camada dupla desaparecerão, ou seja, quando
exatamente o eletrodo apresentará zero de carga e, como resultado, os íons na
solução salina não serão mais atraídos. Este é o chamado potencial de carga
zero.
"Quando você reduz a
concentração [na solução salina] o suficiente, pode esperar encontrar o
potencial de carga zero em algum ponto. Mas, em nossas medições com eletrodos
de platina, nunca conseguimos chegar a esse ponto," conta Ojha.
Mas Ojha não desistiu e
continuou baixando a concentração da solução salina, até reduzir os sais por um
fator de 10, quando então o potencial de carga zero apareceu.
"O fato de termos que ir
para concentrações extremamente baixas nos diz que há muito mais íons na dupla
camada do que a teoria prevê," disse Koper. "Há algo acontecendo que
causa essa quantidade de íons, mas que a teoria não leva em conta."
Upgrade da
teoria
O que está acontecendo
exatamente, os pesquisadores ainda não sabem, embora tenham algumas hipóteses:
"A natureza do íon não importa para o número de íons na camada dupla. No
entanto, a diferença de tamanho entre o íon carregado positivamente e o íon
carregado negativamente é importante. Isso ocorre porque o íon menor pode se
aproximar mais do eletrodo do que o íon maior, o que causa assimetria nas
medições," arrisca Koper.
Contudo, Ohja observou que a
interação é sensível a mudanças de temperatura. Assim, levando em consideração
os dois fatores - temperatura e dimensão - a explicação para o fenômeno pode
não ser de natureza inteiramente química.
Embora mais pesquisas sejam
necessárias para explicar completamente essa interface metal-solução salina, a
equipe já atualizou a teoria Gouy-Chapman de forma que ela descreva e preveja
os fenômenos reais de forma um pouco mais precisa.
"Esperamos que nossas
descobertas cheguem à próxima geração de livros didáticos de eletroquímica. As
pessoas fazem todos os tipos de medições eletroquímicas em metais e, com a
teoria atualizada, podem melhorar sua compreensão dos mecanismos e reações
nesses tipos de metais," disse Ojha.
Bibliografia:
Artigo: Double-layer structure of the Pt(111)-aqueous electrolyte
interface
Autores: Kasinath Ojha, Katharina Doblhoff-Dier, Marc T. M. Koper
Revista: Proceedings of the National Academy of Sciences
DOI: 10.1073/pnas.2116016119