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segunda-feira, 26 de janeiro de 2015

Descoberta proteína no café com efeito similar ao da morfina - Tese de doutorado

A Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) Recursos Genéticos e Biotecnologia e a Universidade de Brasília (UnB), identificaram fragmentos de proteína (peptídeos) inéditos no café com efeito similar ao da morfina, ou seja, apresentam atividade analgésica e ansiolítica, com um diferencial positivo: maior tempo de duração desses efeitos em experimentos com camundongos.
O pedido de patente de sete peptídeos identificados neste estudo foi encaminhado ao Instituto Nacional de Propriedade Intelectual (INPI ) no dia 18 de agosto de 2014, sob o título de "Peptídeos opióides" (PI20140203524-BR).

A caracterização dessas moléculas faz parte da tese de doutorado do estudante Felipe Vinecky, desenvolvida no Departamento de Biologia Molecular da UnB e na Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia, sob a coordenação do pesquisador Carlos Bloch Júnior.

A identificação dos peptídeos se deu quando Felipe estava em busca de genes de café associados à melhoria da qualidade do produto, como parte de um projeto desenvolvido em parceria entre a Embrapa e o Centro de Cooperação Internacional em Pesquisa Agronômica para o Desenvolvimento (CIRAD, sigla em francês).

Ao analisar as sequências gênicas e correspondentes traduzidos proteicos, Felipe e Carlos Bloch observaram que algumas delas continham fragmentos internos (encriptados) com estruturas semelhantes a de alguns opioides endógenos de humanos, como por exemplo, a encefalina
.
Decidiram, então, sintetizar análogos estruturais para avaliar experimentalmente suas funções biológicas e efeitos fisiológicos em mamíferos.

Da mesma forma, um concentrado proteico presente no endosperma (maior parte da semente) do café foi submetido à digestão enzimática in vitro para simular o processo digestivo em humanos e, assim, deduzir como poderia ser o processo real de bio-disponibilização e atividade final dessas moléculas dentro do organismo.

A partir dos análogos sintéticos, foram realizados testes com camundongos na Universidade de Brasília, que comprovaram ser o efeito similar ao da morfina.

Foi demonstrado, porém, que o tempo de duração do efeito analgésico é significativamente superior, cerca de quatro horas.

Além disso, nas condições experimentais avaliadas, não foram observados efeitos colaterais que merecessem registro. Outros experimentos mais direcionados a esse tipo de questão terão que ser executados para avaliar esse aspecto com o devido rigor cientifico.

Novo conceito em desenvolvimento: proteínas-mãe e peptídeos encriptados
O estudo de proteínas nas quais são identificados fragmentos internos funcionais (peptídeos encriptados) é parte de um novo conceito em desenvolvimento na área de biomoléculas que foi iniciado há mais de uma década pela equipe do Laboratório de Espectrometria de Massa da Unidade (LEM), patenteado em 2006 e publicado em 2012 (confira no link.)

"Mal comparando, seria como uma Matrioshka (boneca russa) molecular. Dentro da molécula maior existem outras menores, porém com formas e atividades diferentes da maior de todas ou da maior imediatamente anterior", explica Carlos Bloch.

Tal metodologia foi desenvolvida na Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia a partir do conhecimento das vias bioquímicas de processamento, reparo e degradação de ácidos nucleicos e proteínas associado às técnicas de bioquímica analítica dominadas pela equipe do Laboratório.

Mais um resultado do genoma do café
É importante ressaltar que nada disso teria sido possível sem o sequenciamento do genoma funcional do café, em 2004, capitaneado pelo pesquisador da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia, Alan Andrade, que resultou num banco de dados com mais de 200 mil sequências gênicas, das quais cerca de 30 mil já estão identificadas.

O genoma do café foi uma iniciativa do Consórcio Brasileiro de Pesquisa e Desenvolvimento do Café, com o apoio da FAPESP (Fundação de Apoio à Pesquisa do Estado de São Paulo), FINEP (Financiadora de Estudos e Projetos), INCT Café (Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia do Café) e Instituto UNIEMP (Fórum permanente das relações Universidade-Empresa).

Esse banco fica à disposição das instituições de pesquisa e não é a primeira vez em que é utilizado com sucesso em prol de descobertas científicas importantes e pedidos de patente.
Em 2010, o pesquisador da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia, Eduardo Romano, em parceria com a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) identificou genes de tolerância à seca, que podem ser transferidas a outras culturas, como cana, soja etc.

Em 2013 e 2014, dois pedidos de patentes de autoria de outra pesquisadora da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia, Juliana Dantas, também foram encaminhados ao INPI.

Neste caso, tratam-se de genes promotores capazes de otimizar o desenvolvimento de organismos geneticamente modificados, fazendo com que o gene inserido se expresse apenas em partes específicas das plantas, como flores, frutos etc, e não na planta inteira.

Enfim, o sequenciamento do genoma funcional do café abriu portas para inúmeros resultados científicos em prol da agropecuária e outros setores da economia, pois disponibilizou para a ciência um manancial rico e bem organizado de genes.

"Essa biblioteca genética tem sido de extrema importância para as nossas pesquisas e já estamos em busca de outros resultados com diferentes parceiros públicos e privados", informa Bloch. 

Descoberta com potenciais para aplicações biotecnológicas
Os peptídeos apresentam potencial biotecnológico para aplicação nas indústrias alimentícia e de nutracêuticos. As características funcionais similares a atividades ansiolíticas e de aumento da saciedade podem ser de interesse nutricional e animal, contribuindo para o manejo animal humanitário aplicável à pecuária de corte, especialmente para atenuar o estresse prévio ao abate.

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