Uma pesquisa em andamento na Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP) pretende avaliar a viabilidade de implantar um programa para rastreamento do câncer colorretal (no intestino grosso) no Sistema Único de Saúde (SUS).
A iniciativa é coordenada pelo professor José Eluf Neto e conta com apoio da FAPESP por meio do programa Políticas Públicas para o SUS (PPSUS).
“Cerca de 600 indivíduos já foram incluídos e nosso objetivo é chegar a 16 mil nos próximos seis meses. Trata-se do maior estudo sobre o tema já feito no Brasil”, disse Eluf Neto em entrevista à Agência FAPESP.
Cada participante recebe um kit para colher uma amostra de fezes, que é submetida a um exame imunoquímico para detectar a presença de sangue oculto. Caso o resultado seja positivo, a pessoa é encaminhada ao Hospital das Clínicas da FMUSP para fazer uma colonoscopia – exame de imagem capaz de detectar a presença de lesões malignas (tumores) e benignas (pólipos) no intestino.
“Caso seja identificada uma lesão, será feita biópsia. No caso de o diagnóstico de câncer se confirmar, o paciente será encaminhado para o Instituto do Câncer do Estado de São Paulo (Icesp) para tratamento”, contou Eluf Neto.
O estudo está sendo realizado na Zona Leste da capital paulista – em bairros como Cidade Tiradentes, Ermelino Matarazzo, Guaianases, Itaim Paulista, Itaquera, São Mateus e São Miguel –, graças a uma colaboração com a equipe da Atenção Primária à Saúde (APS) Santa Marcelina, parceira da Secretaria Municipal de Saúde na gestão de Unidades Básicas de Saúde (UBS).
Moradores cadastrados nas UBS dessas regiões, com idade entre 50 e 75 anos, de ambos os sexos, são convidados a participar pelos agentes do Programa Saúde da Família (PSF), que, durante visita em domicílio, entregam o kit para a coleta das fezes e aplicam um questionário.
“Um dos desafios desse tipo de pesquisa é a necessidade de incluir um número muito grande de participantes. Como estamos analisando uma população sem sintomas, o exame de sangue oculto nas fezes dá negativo na maioria dos casos. Nesses primeiros 600 indivíduos avaliados, o índice de positivo foi de 7%. Estimamos que o número final será entre 5% e 10%. E uma pequena parcela dos participantes com resultado positivo no exame de fezes efetivamente terá câncer”, explicou Eluf Neto.
Uma das metas do grupo da FMUSP é medir a aderência da população à iniciativa – tanto no primeiro momento, quando é feita a coleta da amostra de fezes, quanto em uma segunda etapa, nos casos positivos, em que é preciso fazer a colonoscopia.
De acordo com o pesquisador, é necessária uma cobertura de pelo menos 60% da população-alvo para que esse tipo de medida seja efetiva. “E esperamos que pelo menos 70% das pessoas que receberem um resultado positivo compareçam à colonoscopia”, disse o pesquisador.
Ao conhecer a proporção de casos positivos na população estudada, também será possível dimensionar a estrutura secundária e a rede de serviços necessária para garantir a continuidade do tratamento dos pacientes diagnosticados com câncer colorretal.
“Nosso objetivo, portanto, não é mostrar a eficácia do rastreamento, pois quanto a isso não restam dúvidas. Dados da literatura comprovam que esse tipo de medida reduz tanto a incidência como a mortalidade por esse tumor. O que estamos avaliando é a viabilidade de implantar a prática com as condições disponíveis no SUS”, explicou Eluf Neto.
Um dos desafios a serem vencidos, segundo o pesquisador, é a carência de colonoscopistas na rede pública. “Hoje não haveria condições de implantar um programa de rastreamento para todo o município de São Paulo, pois a espera para marcar o exame chega a oito meses. Um dos efeitos colaterais de medidas como essas, que não podemos esquecer, é a ansiedade gerada. Muitas pessoas vão ter um resultado falso-positivo no exame de fezes e vão ficar preocupadas. É preciso ter a colonoscopia disponível”, disse.
Eluf Neto avalia que o tema precisa ser visto como prioridade pelos gestores da rede pública e acredita que os resultados do estudo podem contribuir para o trabalho de sensibilização.
Problema comum
No Brasil, cerca de 18 mil pessoas morrem anualmente vítimas do câncer colorretal e são estimados cerca de 34,2 mil novos casos em 2016. No estado de São Paulo, é o segundo tumor mais incidente em ambos os sexos, excetuando os casos de câncer de pele não melanoma.
Mais comum após os 50 anos, esse tipo de câncer atinge a parte final do tubo digestivo, entre o intestino delgado e o ânus. O intestino grosso é dividido em cólon e reto. A maioria dos tumores se origina a partir de pequenas lesões chamadas pólipos adenomatosos. Apesar de benignos, são considerados precursores dos carcinomas colorretais. Portanto, uma das maneiras mais eficazes de evitar o aparecimento de câncer é a remoção dos pólipos por meio de colonoscopia. Boa parte dos casos apresenta bom prognóstico se a lesão for detectada e tratada precocemente.
O processo que leva à formação de um carcinoma colorretal demora vários anos e, durante grande parte dessa evolução, pode ser assintomático. Somente quando o tumor progride é que os sintomas tornam-se frequentes, podendo incluir alteração do ritmo intestinal, dores abdominais, presença de sangue (visível) nas fezes e dor ao evacuar.
Alguns fatores de risco conhecidos são: alta ingestão de carnes processadas e embutidos, consumo excessivo de álcool, tabagismo, histórico familiar (casos em parentes de 1º grau), sedentarismo e dieta pobre em fibras.
Mais informações sobre a pesquisa podem ser obtidas pelos telefones (11) 3797-1802/ 1801 ou pelo e-mail jelufnet@usp.br.
Karina Toledo | Agência FAPESP –
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