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segunda-feira, 20 de fevereiro de 2023

Com pelo menos 70 mil genomas do vírus SARS-CoV-2 depositados, rede de pesquisa atua no sequenciamento de outras viroses

MCTI investiu R$ 23 milhões na rede composta por 17 laboratórios responsáveis pela estruturação do sequenciamento genômico no Brasil; Organização em rede mobiliza cientistas e fomenta capacidades nacionais para atender outras demandas de saúde pública


Imagem: FreePik

Em três anos de atuação na pandemia de Covid-19, os 17 laboratórios associados da Rede Corona-ômica.BR, uma sub rede da RedeVírus MCTI, contabilizam pelo menos 70 mil genomas sequenciados no Brasil e depositados no GISAID, plataforma internacional aberta que reúne dados globais. No total, estima-se que o Brasil tenha depositado cerca de 200 mil genomas nessa plataforma. Além disso, a Rede permitiu a consolidação de infraestrutura e capacidade técnica nas universidades brasileiras para a vigilância genômica, o que pode ser utilizado para o enfrentamento de outras doenças virais.

Neste momento, a Rede está mobilizada para conseguir amostras de um surto de chikungunya que está acontecendo no Paraguai, onde mais de 8 mil casos foram reportados na região central do país e na capital. “A ideia é sequenciar o genoma do vírus para avaliar se o surto é devido a uma nova variante mais agressiva”, explica o coordenador-geral de Ciências da Saúde, Biotecnológicas e Agrárias (CGSB) do MCTI, Thiago Moraes. A CGSB exerce a secretaria-executiva da RedeVírus MCTI.

O Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação investiu R$ 23 milhões na Rede Corona-ômica.BR MCTI. Responsável pela vigilância genômica, a ação foi essencial para prever os rumos da pandemia, o aparecimento de variantes, o escape vacinal ou novas ondas de infecção. “A Rede é importante porque fornece informações valiosas sobre a disseminação da epidemia de Covid-19 e os fatores associados à severidade da doença. Esses dados permitem uma análise detalhada das variações genéticas presentes nos vírus circulantes no país, ajuda a identificar as cepas mais prevalentes, os fatores que contribuem para sua disseminação e para a severidade da doença ”, detalha Moraes sobre como os dados auxiliam a guiar as decisões de saúde pública e o desenvolvimento de estratégias eficazes para o enfrentamento da pandemia. “Hoje, o Brasil está muito mais preparado para o enfrentamento de pandemias no campo da vigilância genômica”, avalia Moraes.

A Rede oferece suporte também aos estudos de transcriptômica, um conjunto completo de RNAs utilizado para acompanhar a evolução do vírus no Brasil. A análise desses dados fornece informações sobre os mecanismos biológicos que estão por trás da severidade da doença, o que pode ser útil para o desenvolvimento de terapias mais eficazes.

Além disso, a Rede permitiu a consolidação de infraestrutura e capacidade técnica nas universidades brasileiras para a vigilância genômica, o que pode ser utilizado para o enfrentamento de outras doenças virais. “Acredito que este seja o maior legado dessa Rede. Hoje, o Brasil está muito mais preparado para o enfrentamento de pandemias no campo da vigilância genômica”, ressalta Moraes.

Segundo o coordenador da Corona-ômica e professor da Universidade Feevale, Fernando Spilki, a constituição da Rede foi uma das principais capacidades que a ciência brasileira construiu a partir do enfrentamento da pandemia. “A constituição de uma rede como a Corona-ômica, que permite não só auxiliar as autoridades sanitárias na vigilância genômica do SARS-CoV-2, mas de outros vírus emergentes, está sendo uma experiência muito interessante de formação de recursos humanos nessa área para o País, o que nos qualifica para o enfrentamento de futuras epidemias”, avalia Spilki.
Segundo ele, atualmente, cerca de cem pesquisadores participam da Rede.

Além do GISAID, os genomas brasileiros são depositados em um servidor nacional gerenciado pelo Laboratório Nacional de Computação Científica (LNCC), unidade de pesquisa vinculada ao MCTI, que, no princípio, também atuou no processamento dos resultados para efeito comparativo das sequências. Entre os 17 laboratórios associados estão unidades da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), vinculada ao Ministério da Saúde, e de universidades, como Universidade de São Paulo (USP), Universidade de Brasília (UnB) e Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), e Hospital Israelita Albert Einstein.

Além do sequenciamento – Responsável pelo primeiro sequenciamento genômico no Brasil do SARS-CoV-2, a diretora do Instituto de Medicina Tropical da Universidade de São Paulo (USP), Ester Sabino, relata como foi o início do trabalho da Corona-ômica. “Logo no começo, o MCTI chamou vários laboratórios, principalmente ligados às universidades, para que eles pudessem contribuir [no combate] à pandemia. O meu foi um deles que se uniu a essa rede para que pudesse aumentar a capacidade de sequenciamento no Brasil”, recorda Sabino.

Integrante da RedeVírus MCTI desde sua constituição, Sabino destaca que a Rede, além de cumprir com o objetivo principal de realizar o sequenciamento, também exerceu papel relevante ao tornar-se referência e, por isso, fomentar novas subredes, atrair investimentos da iniciativa privada e promover intercâmbio de grupos de pesquisa e treinar outros laboratórios pelo menos 20 estados. “A Rede deu respostas locais e nacionais, treinou muita gente, estabeleceu novos grupos, juntou os pesquisadores e trouxe a universidade para o contexto da epidemia. Para responder à epidemia precisa ter muita gente treinada e capaz de responder rapidamente. A gente não sabe onde o problema pode acontecer”, afirma Sabino.

Segundo ela, a universidade tem muito a contribuir, pode rapidamente responder, desenvolver novas tecnologias ou melhorar as existentes.

A cientista descreve que o trabalho da Rede envolve outras etapas muito importantes no processo, como o isolamento e cultivo do vírus para ser distribuído como controle positivo para os laboratórios que efetuaram as confirmações de diagnóstico positivo para covid-19, mas também para outras pesquisas que são necessárias para responder às demandas e para outras viroses.

“Quando surgiu a monkeypox [no ano passado], nós fomos o primeiro grupo a sequenciar, isolar o vírus e distribuir para que as pessoas pudessem ter controles positivos. Não é só sequenciar. É muito importante que faça todas as etapas”, explica Sabino. “Em menos de uma semana o vírus já estava na mão de muita gente,  isolado e próprio para uso que era o que faltava para o diagnóstico, os controles positivos”, complementa.

A pesquisadora indica que a organização e mobilização dos pesquisadores em torno da Rede Corona-ômica, e com aporte contínuo de recursos, serão fundamentais para sequenciar outros vírus de interesse para a saúde pública no Brasil. “Precisamos fazer um esforço para aumentar o número de sequências de doenças como dengue, chikungunya, mesmo influenza, que temos poucas sequências brasileiras”, descreve Sabino. “A gente vai passar para um novo patamar de capacidade de sequenciamento de agentes infecciosos, vírus e bactérias. Há várias que precisam ser sequenciadas, como a tuberculose, para entendermos melhor como esses agentes estão se espalhando no País”, conclui.

 


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