Já está disponível nas livrarias a publicação “O PMM
e a atenção básica”. Baseado na Pesquisa Avaliativa do Programa Mais Médicos
(PMM), o livro foi concebido por pesquisadores dos Ministérios da Saúde e da
Educação, sob a coordenação da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), no qual são
avaliados aspectos relativos aos componentes constituintes do programa,
acrescidos de outros estudos realizados por especialistas neste tema, no país e
no mundo.
O PMM foi criado em 2013 com o objetivo de prover
médicos em regiões com escassez ou ausência desses profissionais, proporcionar
investimentos para construção, reforma e ampliação de Unidades Básicas de
Saúde, bem como o aumento de vagas de graduação em Medicina e na residência
médica.
Além de melhorar as condições de acesso ao cuidado
médico, o programa também reconheceu a necessidade de qualificação e educação
permanente dos profissionais, tendo como escopo o fortalecimento da Atenção
Básica.
Estiveram envolvidos na organização desta
publicação, grandes nomes como Maria Helena Machado, Joaquim José Soares
Neto, Soraya Almeida Belisário e Sábado Nicolau Girardi. O livro conta ainda
com contracapa assinada pela Presidente da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz),
Nísia Trindade Lima e belo prefácio de Francisco Campos, secretário executivo
da Universidade Aberta do SUS (UNA-SUS).
Veja abaixo o prefácio do livro na íntegra:
Francisco
Eduardo Campos
A má
distribuição dos médicos é um dos poucos consensos entre todos os que trabalham
na gestão da saúde. É o que demonstram as experiências, mesmo em países que
adotaram mecanismos não mercadológicos para o incentivo ao exercício profissional
em áreas rurais, remotas, pobres e conflagradas nas megalópoles até, no outro
extremo, que optaram diversas modalidades - task shiftings - para habilitar
outros profissionais a exercerem atividades antes prerrogativas dos médicos.
Sendo a medicina uma profissão de alto prestigio e renda na maioria das
situações, a ela ocorrem os extratos privilegiados dos vestibulandos, o que faz
girar um ciclo vicioso e autoperpetuador.
Medidas
para romper esta concentração vêm sido tomadas em muitos lugares do mundo:
planos de carreiras que obrigam ao exercício em localidades remotas antes do
acesso ao emprego nos grandes hospitais e centros urbanos; adoção de diferentes
tipos de serviço civil obrigatório (antes e depois da titulação médica);
recrutamento de estudantes entre os segmentos subservidos da população (étnica
e socialmente); empréstimos para estudantes; abertura de novas escolas em
regiões rurais; etc. Todas são alternativas que encontram uma série de
dificuldades.
Países
ricos, como os EUA e a Inglaterra, se valem - em altos percentuais - de força
de trabalho médica formada no exterior, o que priva os países mais pobres de
seus profissionais. É um mecanismo perverso de subsídio: países da África
formarem médicos que atuarão na Europa ou América do Norte. E o código de
recrutamento ético de profissionais de saúde entre países não tem forma de
coerção ou de cobrança para reposição da drenagem, servindo apenas como um
mecanismo de monitoramento.
A
preocupação com os "recursos humanos" na região das Américas remonta
ao surgimento do planejamento dos serviços de saúde, ao lado de instalações
físicas e outros recursos organizacionais. O Plano Decenal de Saúde das
Américas é o primeiro documento que aponta a necessidade de incrementar a
formação médica, chegando, na década seguinte, à metade um médico por mil
habitantes (0 que se tornou um clichê) e buscando sua melhor distribuição.
O
Brasil entra na década de 2010 com menos de 2 médicos por 10 mil habitantes,
quantidade insuficiente para um pais que declara saúde como direito universal.
Além de poucos, os médicos se concentram no Sul e Sudeste, nas cidades, nas
regiões ricas e, dentro do tecido urbano, nos bairros melhor aquinhoados.
Tentativas para corrigir esta brecha distributiva foram feitas à exaustão: projeto
de serviço civil tramitam no parlamento, propostas de alargamento do serviço
militar compulsório abertura de novas escolas médicas. É claro que num país com
a Lei de Responsabilidade Fiscal e com um processo de municipalização anárquico
não será possível recrutar, ordenadamente, médicos para os locais mais
desprotegidos, apenas propondo melhores salários e mesmo melhores condições de
exercício profissional. Um quinto dos municípios brasileiros não consegue
fornecer aos seus habitantes serviços médicos regulares, além de quase todos os
outros benefícios sociais a cargo do poder público ou regulados pelo mesmo.
Nesse
contexto, é bem-vinda a corajosa iniciativa do governo federal de propor e
executar, em 2013, 0 Programa Mais Médicos, contemplando três componentes:
aumento qualificado da formação profissional, melhoria da estrutura da atenção
básica e provisão emergencial de profissionais. Nesse último ponto, recrutando,
num primeiro momento, os médicos brasileiros e incentivando-os mediante
pontuação adicional nos exames de residência médica (componente do PROVAB,
precedente do Mais Médicos). Pois, é sabido que somente depois de esgotada a
adesão de profissionais nacionais, deu-se início ao recrutamento de médicos de
outros países, inclusive o acordo institucional com Cuba para o fornecimento
desses serviços por meio de médicos cooperados.
O
ditame constitucional de saúde acessível a todos com qualidade falou mais alto
que as estridentes vozes da corporação. De uma reação inicial marcada, de um
lado, pelas boas vindas de população antes sem acesso a qualquer serviço
médico, mas por outro lado por reações xenofóbicas e até mesmo racistas por
parte da corporação.
O
fato é que milhares de cidades, regiões e unidades antes desprovidas de
serviços foram atendidas. O Programa foi absorvido melhor a cada edição, a
ponto de que a última de suas chamadas tenha sido coberta por candidatos
nacionais.
O
Mais Médicos marcará um momento em que o SUS foi além das manifestações
retóricas de que saúde é um direito de todos, ainda que para sua consecução se
tenham enfrentadas, além de muitas reações adversas, outras tantas
dificuldades.
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