André Julião | Agência FAPESP– Um medicamento usado no tratamento da hipertensão pulmonar reduziu
significativamente a capacidade de células tumorais migrarem e invadirem outros
tecidos em testes feitos com linhagens de tumores de pâncreas, ovário, mama e
leucemia. Além disso, em camundongos com uma forma agressiva de câncer de mama,
o fármaco diminuiu em 47% a incidência de metástase no fígado e nos pulmões,
bem como aumentou a sobrevida em relação aos animais não tratados.
O estudo foi publicado na revista
Scientific Reports.
“O medicamento ambrisentan é
um inibidor do receptor da endotelina A, que tem um papel na constrição dos
vasos sanguíneos. Por isso, é usado para tratar a hipertensão pulmonar
[normalmente causada por doenças autoimunes como lúpus e esclerose sistêmica].
No laboratório, vimos que o fármaco tem efeito em células de tumores, evitando
a migração dessas células para outros tecidos, além de outros efeitos que ainda
estamos investigando”, explica Otávio Cabral Marques, pesquisador do Instituto
de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo (ICB-USP) e coordenador do
estudo, financiado pela FAPESP.
Marques conduziu o trabalho
durante o seu pós-doutorado na Universidade de Freiburg, na Alemanha, em
colaboração com pesquisadores daquele país e dos Emirados Árabes Unidos.
Atualmente, coordena um projeto apoiado pela FAPESP na modalidade Jovem
Pesquisador.
O receptor de endotelina tipo
A é conhecido por ser expresso no endotélio, a camada que reveste a parede
interna dos vasos sanguíneos, e em células do sistema imune. Outros estudos já
mostraram também que ele está envolvido no crescimento e na metástase de vários
tumores.
“Parece que o efeito da droga
não é apenas na migração das células tumorais, mas também na neoangiogênese, ou
seja, na formação de novos vasos sanguíneos necessários para alimentar o tumor.
Estamos realizando experimentos para comprovar isso. Se for confirmado, a droga
teria um efeito sistêmico, não apenas inibindo a migração do tumor para outros
tecidos, como também bloqueando a geração de novos vasos que o fazem crescer”,
conta o pesquisador.
O benefício do medicamento
para o tratamento do câncer ainda não foi comprovado. O uso sem orientação
médica pode trazer risco à saúde, especialmente para gestantes.
Experimentos
Usando uma técnica para medir
a migração celular, os pesquisadores observaram que o medicamento reduziu
significativamente esse fenômeno tanto nas células tumorais que receberam um
estímulo como na migração espontânea. Foram testadas linhagens de tumor de
ovário, leucemia, pâncreas e mama.
Em seguida, camundongos no
estágio inicial de uma linhagem agressiva de câncer de mama (4T1) foram
tratados por duas semanas antes de terem o tumor implantado e duas semanas
depois. Nesse experimento, a redução da metástase foi de 43%, aumentando a
sobrevida dos animais.
“Como a metástase das células
4T1 ocorre muito rapidamente nos camundongos, iniciamos o tratamento antes,
para podermos nos aproximar mais do que aconteceria com humanos”, explica.
Agora, com outros
pesquisadores do ICB-USP, Marques se prepara para a realização de testes
clínicos. A ideia é testar o medicamento em um grupo de pacientes que já
realiza quimioterapia e observar se eles se recuperam melhor do que um outro
grupo (controle) que passa apenas pelo tratamento padrão.
Embora o fármaco tenha a
vantagem de poder ser administrado por via oral, o pesquisador acredita na
possibilidade de fazer uma aplicação direta no tumor, de forma a aumentar seu
efeito. Ainda não foi definido em que tipo de câncer serão feitos os testes
clínicos.
O artigo Ambrisentan, an endothelin receptor type A-selective antagonist, inhibits cancer cell migration, invasion, and metastasis pode ser lido em: www.nature.com/articles/s41598-020-72960-1
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