O Conselho Administrativo de
Defesa Econômica (Cade) homologou nesta quarta-feira (19/09) três Termos de
Compromisso de Cessação (TCCs) com a Cielo e seus controladores, Banco do
Brasil e Bradesco. Os acordos foram celebrados em investigação que apura supostas
práticas de discriminação e recusa de contratar, em relação à oferta de
serviços bancários e de credenciamento no mercado brasileiro.
Pelos TCCs, serão recolhidos
ao todo R$ 33,8 milhões ao Fundo de Defesa dos Direitos Difusos (FDD) a título
de contribuição pecuniária. Banco do Brasil e Bradesco pagarão,
respectivamente, R$ 1,9 milhão e R$ 2,2 milhões. A Cielo, por sua vez, terá de
arcar com R$ 29,7 milhões. Esta é a maior contribuição nominal já recolhida
pelo Cade em TCC envolvendo condutas unilaterais em sede de inquérito
administrativo.
Com a celebração do acordo, o
procedimento fica suspenso em relação às partes até que o Cade ateste o
cumprimento integral do acordo.
Agenda de recebíveis
O inquérito administrativo que
analisa os supostos ilícitos concorrenciais foi instaurado em março de 2016. De
acordo com apurações iniciais, Banco do Brasil, Bradesco e Itaú estariam
praticando discriminação e recusa de contratar na concessão de operações de
crédito, relacionadas a recebíveis de cartões, aos clientes de credenciadoras
concorrentes de suas controladas: Cielo (BB e Bradesco) e Rede (Itaú).
Desde o surgimento da
possibilidade de que estabelecimentos parcelem compras, os créditos são
recebidos periodicamente, a depender da quantidade de parcelas que foram
ofertadas ao cliente. A soma de diversas vendas realizadas na função de crédito
forma uma “previsão” de valores a serem recebidos, chamada agenda de
recebíveis. A partir desta agenda, é comum que bancos e credenciadoras ofertem
uma linha de crédito ao estabelecimento comercial, denominada antecipação de
recebíveis (pré-pagamento). Para isso, no entanto, é preciso que a instituição
financeira seja capaz de “ler” a agenda de recebíveis da credenciadora com a
qual seu cliente realiza as transações.
Segundo a
Superintendência-Geral do Cade (SG/Cade), indícios apontam que os grandes
bancos, em sua maioria controladores de alguma credenciadora, estariam se
recusando a “ler” a agenda de recebíveis de pequenas credenciadoras. A ação
impõe dificuldades para que os clientes dessas empresas antecipem recebíveis.
Por outro lado, as credenciadoras líderes, controladas por esses bancos,
estariam dificultando o acesso de suas agendas de recebíveis aos pequenos
bancos, também impedindo os clientes desses bancos de receber o pré-pagamento.
No TCC firmado com o Cade, BB
e Bradesco se comprometem a manter disponível a leitura de agendas de
recebíveis de cartões às credenciadoras participantes do Sistema de Controle de
Garantias (SCG).
Trava de domicílio bancário
Após a instauração do
inquérito, a SG/Cade teve conhecimento de outras práticas, relacionadas aos
mesmo bancos e credenciadoras, que estariam prejudicando a concorrência no
mercado de credenciamento. As condutas se referem a questões como mecanismo de
trava de domicílio bancário, práticas de retaliação e venda casada,
discriminação da cobrança de tarifas de trava bancária, e contratos de
incentivo.
A trava de domicílio bancário
é um mecanismo utilizado pelos bancos para reter os recebíveis de um
determinado cliente em sua instituição. O uso da trava é importante para que os
recebíveis oferecidos em garantia, por um determinado cliente, para a obtenção
de uma operação de crédito, sejam creditados naquela instituição financeira
enquanto perdurar a trava.
Apesar da justificativa para a
existência da trava (impedir o consumidor de migrar o fluxo de recebíveis para
outra instituição), a SG/Cade apurou que é usual no mercado a prática da “trava
de relacionamento” pelos bancos. A trava de relacionamento é utilizada para
manter o consumidor na instituição bancária, mesmo que não haja qualquer
operação de crédito ativa que justifique o seu uso. Na avaliação da SG/Cade, a
ação configura abuso sobre o livre direito de escolha do consumidor, além de
restrição à livre concorrência entre as instituições financeiras.
Com a homologação do TCC, BB e
Bradesco se obrigam a formalizar a contratação da trava apenas em operações de
crédito cujos recebíveis de cartões tenham sido dados em garantia (no caso do
BB, presencialmente ou via canais de autoatendimento disponibilizados pelo
banco; no caso do Bradesco, em documento escrito com disposições específicas).
Os bancos se comprometem, ainda, a não manter a trava de estabelecimentos
comerciais que não possuam operação de crédito ativa.
Retaliação e venda casada
A SG/Cade também apurou que
estaria havendo retaliação a clientes que tentassem migrar o domicílio bancário
para outro banco, ou para outras credenciadoras. Haveria, ainda, o
condicionamento, para o credenciamento de bandeiras exclusivas, à abertura de
contas nos bancos controladores dessas bandeiras/credenciadoras.
Para isso, as empresas se
utilizavam de suas posições dominantes para dificultar a migração dos
consumidores para concorrentes pela elevação das taxas de desconto das
bandeiras exclusivas; ou pela elevação das taxas, tarifas e cortes de linhas de
crédito no banco domicílio, de maneira a evitar a migração do estabelecimento
comercial.
A partir do TCC, os
signatários se comprometem a não adotar medidas que impliquem na retaliação ao estabelecimento
cliente que deixar de contratar os serviços bancários prestados pelo banco, ou
os serviços de adquirência prestados por instituições de pagamento nas quais o
banco seja controlador ou detenha o controle compartilhado.
Os bancos ainda ficam obrigados
a não condicionar a aquisição de um de seus produtos ou serviços à aquisição de
um produto ou serviço da Cielo, além de não praticar qualquer retaliação ao
estabelecimento comercial que destravar, cancelar ou alterar o seu domicílio
bancário.
Discriminação da cobrança de
tarifa
Outra prática denunciada ao
Cade foi a cobrança de tarifas discriminatórias para concorrentes – bancos e
credenciadoras – de pequeno e médio porte. As reclamações dizem respeito à
tarifa de trava, cobrada pelas credenciadoras dos bancos pelo serviço de trava
de domicílio bancário: a tarifa é cobrada em termos percentuais sobre o valor
recebido pelo banco domicílio do cliente.
Conforme a denúncia, Cielo e
Rede estariam cobrando dos bancos sócios um percentual inferior àquele cobrado
dos demais bancos de pequeno porte. A cobrança acaba por causar um aumento das
taxas de crédito ofertadas pelos bancos de menor porte, dificultando a
capacidade dessas instituições de competir com os bancos maiores.
Contratos de incentivo
Os contratos de incentivo são
instrumentos por meio dos quais a credenciadora estabelece um compromisso com
seu cliente, ofertando uma redução na taxa de desconto praticada (taxa
incentivada) com a contrapartida para o estabelecimento comercial de capturar
um determinado volume mensal de vendas.
Segundo relatos de outras
credenciadoras, os contratos de incentivo estariam sendo utilizados por Cielo e
Rede com o objetivo de fidelizar estabelecimentos com cláusulas que impunham
custos de saída/rescisão elevados, motivo pelo qual tais contratos poderiam
perpetuar a relação entre os estabelecimentos e as credenciadoras, dificultando
a competição imposta pelas entrantes.
Por meio do TCC, a Cielo se
compromete a adotar prazo de até 24 meses, sem renovação automática, salvo no
caso de o estabelecimento comercial optar pela renovação automática e/ou por
prazo superior, entre outros pontos.
Itaú e Rede
Em julho deste ano, o Tribunal
do Cade também homologou TCC com o Itaú Unibanco e sua controlada Redecard no
mesmo inquérito administrativo. À época, ambas se comprometeram a recolher R$
21 milhões ao FDD.
Acesso o Inquérito
Administrativo nº 08700.001860/2016-51.
Ascom - CADE
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