Cientista foi referência
mundial em pesquisa sobre a biologia da malária e o desenvolvimento de vacinas
(foto: Eduardo Cesar / Pesquisa FAPESP)
Ruth Nussenzweig, referência mundial em pesquisa sobre a biologia da malária e
o desenvolvimento de vacinas, primeira pesquisadora brasileira eleita membro da
Academia de Ciências dos Estados Unidos, morreu em 1º de abril, aos 89 anos.
Nascida na Áustria, chegou ao
Brasil em 1938, aos 11 anos. Viveu aqui por pouco mais duas décadas, antes de
transferir-se com o marido, Victor Nussenzweig, para o Departamento de
Parasitologia da Escola de Medicina da New York University, onde trabalhou desde
então. Mas era no Brasil que ela se “sentia bem”, como disse em entrevista à
revista Pesquisa FAPESP em 2014: “Meus amigos são
daqui”.
Nascida Sonntag, Ruth era
judia, filha dos médicos Eugenia e Baruch, que chegaram ao Brasil fugidos do
nazismo. Cresceu em Guarulhos. Aos 18 anos ingressou na Faculdade de Medicina
da Universidade de São Paulo (USP), onde conheceu Victor Nussenzweig.
“Namorávamos falando de
ciência”, disse Victor na mesma entrevista à Pesquisa FAPESP. Tanto
que se casaram na Biblioteca da Faculdade de Medicina, em 1953, tendo como
testemunha o catedrático de Parasitologia Samuel Pessoa, que influenciou
fortemente a decisão de Ruth de investigar a biologia da malária. Uma foto
publicada no livro Circa 1962 – A Ciência Paulista nos Primórdios da FAPESP,
registra a cerimônia de casamento.
O casal ficou dois anos na
França, durante o doutorado, e em 1960 tentou se estabelecer no Brasil. “Mas
verificamos que não dava para fazer o que queríamos de forma rápida”, disse
Victor. Foram para Nova York. Uma nova tentativa de retorno, em abril de 1964,
abortou depois de uma conversa de Victor com um coronel instalado na Faculdade
de Medicina da USP.
Voltaram ao Brasil, entre 2012
e 2015, em várias ocasiões, para coordenar o projeto “Caracterização da proteína fosfatase UIS2 de Plasmodium como
alvo para desenvolvimento de drogas contra a malária”, na Universidade
Federal de São Paulo (Unifesp), com o apoio da FAPESP no âmbito do programa São
Paulo Excellence Chair (SPEC). O SPEC foi criado em 2012 com o objetivo de
atrair cientistas de renome para a coordenação de projetos temáticos em suas
áreas de atuação.
Nos Estados Unidos, Ruth
publicou em 1967 um artigo que marcaria sua carreira. Nele, mostrou que era
possível imunizar roedores contra a malária por meio da irradiação dos
esporozoítos, um dos estágios de vida do parasita do gênero Plasmodium.
Alguns anos depois, isolou o
antígeno CSP (circumsporozoite protein), responsável por proteger os
animais da doença e, a partir daí, começou a trabalhar em vacinas e
tratamentos.
“Seus trabalhos na área de
imunologia servem como guia para o desenvolvimento de uma nova geração de
vacinas recombinantes”, disse Maurício Martins Rodrigues (1961-2015), professor
da Unifesp, que fez o pós-doutorado na Universidade de Nova York com Ruth
Nussenzweig, na ocasião da eleição da pesquisadora para a Academia de
Ciências dos Estados Unidos, em 2013.
As investigações de Ruth foram
fundamentais para que a ciência chegasse à RTS,S/AS01, vacina contra a malária
causada pelo Plasmodium vivax – de maior prevalência nas
Américas – que já obteve 45% de eficácia em testes com camundongos.
A estratégia da nova vacina se
baseia em desenvolver versões recombinantes de proteínas encontradas no
esporozoíto. A nova vacina já passou por testes clínicos de fase 3 e recebeu
sinalização positiva da Organização Mundial de Saúde (OMS) para estudo piloto
de implementação.
O artigo que comunica os
resultados da pesquisa, publicado na revista Frontiers in Immunology, tem entre seus signatários
Ruth e Victor Nussenzweig (leia mais em http://agencia.fapesp.br/27129/).
Ruth deixa os filhos Michel,
professor da Rockefeller University e, como a mãe, membro da Academia de
Ciências dos Estados Unidos, Sonia, antropóloga da Fundação Escola de
Sociologia e Política de São Paulo, e André, que trabalha nos National
Institutes of Health (NIH).
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