O jurista Dalmo Dallari defendeu,
nesta quinta-feira (2), na Câmara dos Deputados, a judicialização da saúde no
Brasil — ou seja, a determinação, pela Justiça, de o Executivo arcar com
tratamentos ou com a compra de produtos específicos para determinado paciente.
Na argumentação de Dallari, a
Constituição de 1988 diz expressamente que os cuidados de saúde são de
relevância pública, cabendo ao Ministério Público zelar pelos direitos
assegurados. “O único serviço que a Constituição trata como de relevância
pública é a saúde. Quando há busca da proteção do Judiciário para efetivação do
direito à saúde é porque já há uma tentativa de garantir direitos que não se
obtêm”, disse o jurista.
O assunto foi um dos principais
pontos debatidos em audiência pública na Comissão de Seguridade Social e
Família, sobre o direito à saúde e o papel do Estado.
Críticas
Há duas semanas, na Câmara, o
ministro da Saúde, Arthur Chioro, havia criticado os processos judiciais. Na
ocasião, o ministro condenou especificamente o fato de o governo ser obrigado a
arcar com medicamentos em fase de teste ou produtos de alto custo, quando há
semelhantes oferecidos pelo Sistema Único de Saúde (SUS).
Na visão de Chioro, a judicialização
serve de plataforma para o lançamento de medicamentos e o dinheiro gasto faz
falta para o restante dos brasileiros que dependem dos recursos.
Também para a especialista em direito
sanitário Lenir Santos, que participou da audiência desta quinta-feira, a
judicialização ganhou proporções desmedidas. A prática, segundo ela, prejudica
o sistema de saúde, por trazer gastos excessivos ao sistema de saúde e por se
tratar de uma proteção individual, e não coletiva.
“Temos uma série de oportunismos
grudando na judicialização. São a indústria farmacêutica, a indústria de
equipamentos, os médicos”, listou a especialista.
Municípios
A deputada Leandre (PV-PR) manifestou
preocupação com o orçamento dos municípios que são obrigados, por ações
judiciais, a realizar um tratamento. “Muito do orçamento público da saúde está
sendo comprometido com a judicialização.”
Dalmo Dallari explicou que, nesses
casos, o juiz deve avaliar a possibilidade de um município cumprir ou não uma
determinação judicial, uma vez que há prefeituras que não se sustentam. “Mas
também não vamos aceitar o impossível só porque o administrador diz que é
impossível, porque muitas vezes ele usa o dinheiro para outras finalidades”,
disse o jurista.
Para ele, mesmo os medicamentos em
fase de teste são passíveis de judicialização. “Supõe-se que o médico tenha
conhecimento. O medicamento pode estar em fase de teste, mas pode estar
comprovada a sua eficácia. Não posso partir do pressuposto da leviandade do
médico. Cabe sim ação judicial e o Ministério Público tem autoridade para
isso”, defendeu Dallari.
Pouca clareza
O deputado Odorico Monteiro (PT-CE),
que solicitou o debate, acredita que as ações judiciais na saúde decorrem da
falta de clareza sobre os serviços a que cada brasileiro tem acesso. “O sistema
universal diz que todos têm acesso. Mas a quê todos têm acesso? Por ser o SUS
uma política de relevância pública, nós temos que definir a quê todos têm
acesso e quando todos têm acesso.”
Para a deputada Carmen Zanotto
(PPS-SC), a judicialização ocorre porque o Estado não garante a saúde a todos
os brasileiros. “A ação judicial é um direito do usuário e ela não se refere
apenas a tratamentos de alto custo, mas às vezes a uma ressonância magnética.
Mas, no fim, quem tem ação judicial acaba furando a fila”, observou.
A parlamentar acredita que o número
de ações judiciais cairá quando o Estado conseguir reduzir o tempo de espera de
um paciente por tratamento.
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