Foi como um episódio da série
"House", em que um médico americano se depara com as doenças mais
improváveis, comentam três doutores no corredor do Hospital do Coração
paulistano.
O paciente chegou pelo
pronto-socorro duas semanas atrás com dores abdominais e falta de ar, e fez
alguns exames. Começaram os testes e as hipóteses de diagnóstico: apendicite,
obstrução intestinal, insuficiência cardíaca.
Até que um exame de imagem
explicitou uma mancha translúcida dentro do coração. Bingo. Era um mixoma,
tumor benigno que nasce em uma das câmaras cardíacas superiores.
"Eu fiquei até depois do
meu horário de plantão para acompanhar a visita", diz um residente do HCor
que pede para não ser identificado, porque o hospital não comenta casos
específicos. "Nunca tinha visto essa doença fora dos livros da faculdade,
e ela estava ali, na minha frente."
Esse tumor de coração é raro.
"Nem passa pela cabeça da gente que um problema cardíaco seja um tumor.
Não é o primeiro diagnóstico", diz o cirurgião cardíaco Enio Buffolo, do
HCor, que em cinco décadas de clínica se deparou com dezenas de casos da
doença, que geralmente é tratada com uma operação.
"Uma das primeiras
cirurgias de coração que fiz foi em 1969, quando retirei o mixoma do coração de
uma vizinha. Ela ainda está viva."
O mixoma corresponde a 80% das
células anormais que aparecem no coração, que por sua vez são 0,04% das neoplasias
,aponta um estudo da Faculdade de Medicina da USP. Pesquisas não apontam
fatores de risco (entre os mais comuns estão o fumo e alimentação
incorreta) para a doença, que é considerada de fundo genético.
"É difícil arregimentar
um grupo grande o suficiente para pesquisar se há um fator em comum entre
eles", diz Jefferson Luiz Gross, diretor de Pulmão e Tórax do hospital
A.C. Camargo, que teve contato com um ou dois casos nos últimos 20 anos de
clínica.
Segundo especialistas, 80%
desses tumores que nascem no coração são benignos.
"Esses tumores são raros,
e a maioria deles é assintomática. Às vezes você descobre por acaso, em um
exame", diz Roberto Kalil, presidente do Incor (Instituto do Coração do
Hospital das Clínicas da USP).
Em um estudo conduzido com as
bases de dados da Unifesp, de 42 mil doentes do coração, foram encontrados
tumores dentro dos órgãos de 136 pessoas.
Mais raros ainda são tumores
malignos, como fibromas e rabdomiomas. "Na minha vida eu devo ter visto
oito, dez casos, com o prognóstico muito ruim", diz o cardiologista
Buffolo.
Outra possibilidade é que o
câncer tenha nascido em outro órgão, como mama ou pulmão, e se disseminado para
o coração.
As metástases que chegam ao
órgão acontecem até 30 vezes mais do que os tumores primários, que nascem no
coração, e exigem um tratamento mais complexo.
Não foi o que aconteceu no
HCor. O caso que causou comoção no hospital este mês se resolveu com uma
operação.
Folha
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