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segunda-feira, 22 de agosto de 2016

Diretor-presidente da agência, Jarbas Barbosa, diz que lobby de parlamentares gera desconfiança

Anvisa critica interferência do Congresso na regulação do setor

A experiência de um ano à frente da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) deu ao doutor em Saúde Coletiva Jarbas Barbosa a certeza de que o Legislativo é a origem das interferências mais nocivas nas políticas de regulação do setor. A lei que liberou a fosfoetanolamina no Brasil, chamada de pílula do câncer, é apenas o exemplo recente “sobre o que o Congresso não deve fazer”, define o diretor-presidente da agência.
Segundo ele, além de projetos autorizando medicamentos ou sustando proibições baixadas pela Anvisa, as tentativas de ingerência vêm também de iniciativas isoladas de parlamentares, que pedem preferência a determinadas empresas na fila de processos a serem analisados. De tão frequente, já existe uma resposta padrão para enviar a deputados e senadores.
— Tenho o maior respeito pelo Congresso, mas não é o local de fazer licenciamento de medicamentos. Na época da discussão da fosfoetanolamina, eu disse que isso é terrível para o Brasil. Porque, em qualquer país do mundo, saber que empresas de medicamentos no Brasil, além do critério da Anvisa, podem também fazer lobby e terem o produto aprovado no Congresso, gera uma desconfiança fundamentada generalizada sobre o que é produzido aqui — afirma Barbosa.
O presidente da Anvisa aponta que, por parte do Judiciário, as demandas mais frequentes vêm de empresas que pedem prioridade na fila de análise de processos. Em boa parte desses casos, segundo Barbosa, a agência tenta mostrar ao juiz que o que está em jogo é apenas o interesse comercial. Ou seja, na maioria das vezes, explica ele, não cabe a análise mais acelerada, admitida em situações excepcionais, como produtos de interesse de saúde pública, como os atuais testes para detecção de zika, que têm prioridade na agência.
Sobre o lobby exercido pelas empresas diretamente na Anvisa e em seus diretores, Barbosa enumera diferentes mecanismos de transparência, tais como a fila pública de processos, funcionários de carreira, salas para receber representantes de companhias do setor onde as reuniões são gravadas e comissão de ética em funcionamento. A maior arma, segundo ele, contra o “jeitinho” é ter 90% dos processos em meio eletrônico, com previsão de chegar à marca de 100% ainda este ano:
— A empresa pode até reclamar da fila, mas ninguém pode dizer que estava na posição 20 e agora está na 30 porque um deputado, o presidente da Anvisa ou um diretor deixou dez passarem na frente. Ninguém mexe na fila. Isso é um avanço na transparência muito grande.
LOBBY DA ‘ATENÇÃO ESPECIAL’
A fila pública não impede, porém, que os pedidos de “atenção especial” a determinados processos cheguem com frequência. As solicitações de políticos estão entre as demandas administrativas que se repetem na agência, diz Barbosa. Para agilizar o retorno aos requerimentos, os funcionários lançam mão de um documento padrão elaborado para essa finalidade, conta o presidente:
— Verificamos onde está o processo e mandamos educadamente (a resposta), avisando que a pessoa pode consultar a fila no site, numa resposta padrão.

O presidente da Anvisa não nega, porém, lentidão em alguns processos dentro da agência. Uma das filas mais demoradas, reconhece Barbosa, é a de inspeção de novos produtos de saúde, que abrangem um simples estetoscópio até uma máquina de tomografia. Com o ritmo de inovação cada vez mais acelerado, os processos acabam se acumulando, segundo ele. Para dar celeridade aos pedidos, especialmente em áreas prioritárias, a agência fechou parcerias recentes com organismos de inspeção de outros países, numa espécie de “coalizão” para identificar como pular etapas burocráticas sem abrir mão da segurança. Um dos temas prioritários para 2017 é a criação de um licenciamento provisório para novas drogas contra doenças que não têm opção de tratamento. O aval se daria na fase três dos testes, a última com humanos, que leva cerca de cinco anos.

— Se já houve a fase dois e um, sabemos que a substância é segura e que pode ser eficaz. Então, o mundo discute hoje, e nós também dentro dessa coalizão da qual participamos com vários países, uma forma de acompanhar os resultados da fase três, mas já garantindo o acesso. O sistema regulatório é importante para garantir a qualidade, a segurança e ampliar o acesso. Claro que essa medida não será aplicada a um centésimo medicamento para diabetes ou hipertensão, mas sim no caso de doenças para as quais não se tem nada, como muitas doenças raras — explica Barbosa.
IGUAL AO RESTO DO MUNDO
Quando a etapa do desenvolvimento do produto já foi vencida, Barbosa garante que o Brasil não deixa nada a desejar, no que diz respeito à agilidade e à segurança, em relação a outros países com sistemas regulatórios importantes:

— A análise de uma droga nova aqui, no Japão e nos Estados Unidos está rodando em torno de dez, 11 meses. O desafio da Anvisa é agilizar processos garantindo a qualidade da avaliação.

Com o retrato da presidente afastada Dilma Rousseff pendurado na parede da sala da presidência, Barbosa é comedido ao falar da situação política do país. Faz questão de ressaltar que segue a “regra da administração”, pois é “um servidor público”, ao tratar da manutenção ou não do quadro no gabinete. Funcionário efetivo do Senado cedido ao Ministério da Saúde, já trabalhou com dez ministros, desde o governo tucano até o petista, incluindo o atual dirigente da pasta, Ricardo Barros.

Barbosa faz questão de ressaltar que não tem filiação partidária. Entre uma passagem e outra pelo Executivo federal, foi gerente da área de Vigilância em Saúde da Organização Pan-Americana de Saúde (Opas), de 2007 a 2011, após ser aprovado em concurso público internacional. Na Anvisa, tem mandato de três anos, que se encerrará em meados de 2018
Fonte:  ABRASCO

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