Pesquisadores da área de
epidemiologia discutiram as diversas questões que cercam o aumento dos casos de
febre amarela no país. A vacinação consciente e a melhor organização da vigilância
em saúde foram alguns dos temas levantados pelos participantes do Centro de
Estudos Miguel Murat de Vasconcellos da Escola Nacional de Saúde Pública da
Fiocruz (Ceensp) A expansão da febre amarela Silvestre: desafios e
perspectivas. As apresentações do coordenador de Controle de Doenças da
Secretaria de Estado de São Paulo, Marcos Boulos, da pesquisadora do
Departamento de Endemias Samuel Pessoa da Ensp/Fiocruz, Andréa Sobral, do
consultor científico do Instituto de Tecnologia em Imunobiológicos (Bio-Manguinhos/Fiocruz),
Reinaldo de Menezes Martins, e da coordenadora do Programa Nacional de
Imunização (PNI/SVS/MS), Carla Domingues já estão disponíveis, na íntegra, no canalda Ensp no YouTube. O encontro foi realizado em 19 de abril, na
Ensp/Fiocruz.
O coordenador de Controle de
Doenças da Secretaria de Estado de São Paulo, Marcos Boulos, apresentou uma
linha do tempo com dados que revelam o crescimento do número de casos da febre
amarela ao longo das décadas e também falou sobre a expansão do seu aparecimento
fora de áreas antes habituais de circulação do vírus. Boulos descreveu ainda
como acontecem os alertas e como os especialistas atuam em situações de
epizootias, ou seja, a morte de uma grande quantidade de animais com a mesma
doença, neste caso, macacos com febre amarela. “Quando surgiu o primeiro macaco
morto na região de Campinas, São Paulo, tivemos que vacinar primeiro os
profissionais de saúde para depois começar a vacinar a população, pois era uma
região que nunca imaginaríamos antes que a fecbre amarela chegaria. Não era
considerada uma área de recomendação. Neste meio tempo, algumas mortes
aconteceram. Isso nos mostra que a vacina causa, de fato, um impacto muito
grande na prevenção. Tem que vacinar todo mundo. Agora não temos mais dúvidas.
Com isso, vamos, gradativamente, fazer toda a cobertura do estado de São
Paulo”, defendeu ele.
Andréa Sobral iniciou sua fala
apresentando um mapa clássico com os prováveis trajetos da rota da febre
amarela no país e avaliou as séries epidêmicas por regiões. “ Em todas as
séries históricas analisadas, a região centro-oeste é a que sempre apresentou
um maior número de casos de febre amarela”, comentou. Segundo ela, a ocorrência
de epidemias da febre amarela decorrente do ciclo silvestre não é nova e também
não está havendo nenhum retorno, pois as epizootias são características da
circulação do vírus em ambiente florestal. “Elas apresentam alta mortalidade
para os primatas não humanos atingidos e grande risco também para a população
humana que entra em contato com esses ambientes ou reside perto de área de
mata. O que é novo e muito mais preocupante para nós é o registro de epizootias
em primatas não humanos em áreas muito próxima a núcleos urbanos, pois nas
cidades o vetor Aedes aegypti transmite o vírus de pessoa a pessoa”.
A pesquisadora citou ainda o
professor e pesquisador da Ensp, Paulo Sabroza, quando, em 2009, ele apontou
que "a prevenção e a contenção desta doença exigem fundamentalmente
mudanças na organização da vigilância em saúde com ênfase na detecção e
investigação de morte de primatas não humanos, a participação de moradores e
profissionais do setor ambiental, além da agilidade e confiabilidade no
diagnóstico laboratorial. Outra questão central é a capacidade desses serviços
de vigilância em demarcar a área sujeita a circulação de vírus, seguida da
vacinação de todas as pessoas residentes".
A parte da tarde do Ceensp A
expansão da febre amarela Silvestre: desafios e perspectivas teve foco no
desenvolvimento da vacina e o programa de imunização brasileiro para esta
doença. A primeira apresentação foi feita pelo consultor científico de
Bio-Manguinhos Reinaldo de Menezes Martins. Ele comentou que a vacina da febre
amarela é de 1937, foi desenvolvida pela Fundação Rockefeller e aperfeiçoada
pela Fiocruz, com grande participação do pesquisador Henrique Azevedo Pena. De
acordo com Reinaldo, a vacina tem alto poder protetor e é altamente eficaz para
evitar casos e controlar epidemias. Além disso, em geral, somente uma dose
imuniza por toda a vida.
Uma questão trazida por ele e
que, atualmente, está em debate foi: será que uma vacina eficaz contra a dengue
poderia também proteger contra a febre amarela? Segundo Reinaldo, “esta é uma
especulação que não é impossível!”. O pesquisador comentou também que está desenvolvemos
um estudo para tentar identificar os fatores genéticos envolvidos nos eventos
adversos graves à vacina da febre amarela. “Esta pesquisa é de Biomanguinhos e
da Universidade de Rockefeller e conta com o apoio do Ministério da Saúde. O
estudo começará dentro de algumas semanas, no entanto, vale ressaltar que
levamos três anos e seis meses para ter o estudo aprovado. Nosso objetivo é
desenvolver um marcador biológico que possa identificar pessoas com risco
elevado de eventos adversos graves. Para tanto, teremos um kit de diagnóstico
que permitirá a identificação dessas pessoas, as quais terão uma
contraindicação e não deverão receber a vacina”, explicou ele. Reinaldo
completou dizendo que: “o que se pode fazer hoje é aplicar a vacina com atenção
às contraindicações, somente aplicar para quem precisa e não de maneira
indiscriminada, e também manter uma boa assistência para a doença
viscerotrópica, pois isso pode diminuir a mortalidade”.
Já a coordenadora do Programa
Nacional de Imunização (PNI/SVS/MS), Carla Domingues, encerrou o dia de
apresentações dizendo que o cenário brasileiro é de surto concentrado na região
de Minas Gerais. “Pelo que podemos analisar, não houve migração para Goiás ou o
Distrito Federal, mesmo com a proximidade da região. Em contraponto a isso,
vemos uma migração muito rápida para o Espírito Santo e Rio de Janeiro”, disse
ela. Carla detalhou que, atualmente, temos 359 município com transmissão ativa
de febre amarela, com confirmação de 623 casos, 671 casos em investigação, 1128
descartados e um total de 2400 notificados. “É bom salientar que no ano de 2016
tivemos cerca de 300 casos notificados de febre amarela. Isso mostra também que
em uma situação de surto, aumenta-se também a sensibilidade do sistema. Em
muitos casos, vemos no Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan)
fichas de identificação muito mal preenchidas e, portanto, notificações
incompletas. Com isso percebemos que não temos estrutura para lidar com o
surto. A medida em que se aumenta o número de casos, prejudica-se a
investigação detalhada de cada caso e muitos acabam notificados por vínculo
epidemiológico”, comentou.
Confira os vídeos das
apresentações no site da Ensp/Fiocruz.
Fonte: Informe Ensp
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