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quinta-feira, 7 de março de 2019

A Política Estratégica e a Segurança Sanitária nas Plataformas Tecnológicas destinadas a produção de medicamentos, em especial, de origem biológica


A política estratégica de desenvolvimento preconizado pelo Complexo Industrial e Econômico da Saúde, utilizando o poder de compras do Estado, não se limita às questões técnicas, geográficas, ambientais ou disponibilidade de recursos; necessariamente, deve passar por outras avaliações de risco, objetivando receber a tecnologia, absorvê-la e garantir a perpetuação do conhecimento recebido, para segurança e a eficácia com qualidade dos medicamentos.

Alguns itens a serem avaliados na análise de risco de um projeto de PDP:

  • Parâmetros técnicos como as bases estruturantes da planta, a sinergia e verticalização, vocação, o domínio e a capacitação de infraestruturas e recursos humanos e para absorção da plataforma tecnológica;

  • Aspectos como as infraestruturas regionais e serviços públicos, como água, energia, destinação de resíduos, adequação de meio ambiente, suporte logístico, potenciais subfornecedores, aptos a serem desenvolvidos para integrar a cadeia de produtiva;

  • A proximidade da Instituição com a Academia, especialmente, no caso dos medicamentos de origem biológica que demandam alta e altíssima tecnologia para desenvolver, produzir e controlar os anticorpos monoclonais. Os projetos, normalmente, exigem reduzida quantidade de recursos humanos, mas de elevada qualificação – mão de obra, que infelizmente o País não dispõem em quantidades suficientes para atender a demanda, precisam ser formados e qualificados.

  • Facilidades com infraestruturas de moradia e qualidade de vida nas proximidades do projeto, também, influenciam na mitigação de risco, o que facilita a retenção de talentos no projeto, plataformas tecnológicas que exigem elevada qualificação de mão de obra precisam considerar a necessidade de assegurar a manutenção de cientistas, técnicos especializados e outros recursos para garantir a absorção e a perpetuação do conhecimento.

  • Modelo de gestão, autonomia, independência financeira e governança da Instituição Pública, capacidade de realizar investimentos e de reinvestir os resultados no projeto, capacidade de receber recursos e segurança de que os investimentos alocados sejam, realmente, aplicados no projeto, a capacidade da indução do desenvolvimento de subfornecedores e prestadores de serviços, locais, são temas que não podem ser desconsiderados na avaliação do projeto;

Avaliando o risco sanitário

Em junho de 2009, a Genzyme comunicou ao governo brasileiro a suspensão temporária da produção do medicamento Imiglucerase (Cerezyme), usado no tratamento dos portadores da doença de Gauche, depois que as autoridades sanitárias do Japão identificaram uma contaminação do produto, e comunicaram a empresa e o FDA. Investigações sanitárias conjuntas na planta comprovaram a contaminação por vírus nos equipamentos utilizados na fabricação O Mundo e o Brasil ficaram desabastecidos por mais e um ano sem alternativas para o tratamento dos pacientes.

Neste momento, o Brasil atravessa uma situação análoga que, felizmente, não chega a comprometer o tratamento dos pacientes, mas onera de sobremaneira os cofres públicos com a importação de hemoderivado prontos, enquanto a planta local não está pronta para fracionar o plasma brasileiro.

A vulnerabilidade no programa que busca a capacitação e a autossuficiência para o fracionamento do plasma ficou prejudicada por dois fatores principais: subavaliação de risco do projeto estratégico, em especial, na escolha do parceiro tecnológico, na escolha do local e concepção arquitetônica sanitária do parque industrial, do lado brasileiro;  o parceiro tecnológico escolhido pela Hemobrás para o projeto - LFB da França,   teve suas plantas interditadas pela autoridade sanitária francesa, há mais de um ano, e pela ANVISA, impedindo o Brasil de importar produtos fabricados lá, enquanto perdurar a 3ª interdição.

A tecnologia embarcada no projeto conceitual remonta aos anos 70, onde os riscos eram menos conhecidos e as exigências sanitárias dos marcos regulatórios eram menos abrangentes. O parque tecnológico, foi concebido como um bloco integrado, com etapas do processo interdependentes, expondo todo processo à interdição, caso se verifique quaisquer potenciais riscos de contaminação.

A própria LFB, empresa transferidora da tecnologia para Hemobrás, está construindo um novo complexo industrial na França com modernos conceitos, diferentes do trazido para o Brasil. A planta da Hemobrás, instalada em Goiana, em Pernambuco, está paralisada há mais de 2 anos. Colocada sob judice por outras razões, acabou expondo o potencial risco sanitário e estratégico. Por maior que seja o investimento na empresa, nesta altura do projeto, sempre dependerão de um parceiro tecnológico para ter produtos, imediatamente, após a conclusão da fábrica.

Os medicamentos subordinados ao registro na ANVISA, sem uma referência tecnológica, mesmo já registrada em outros Países, são consideramos produtos inovadores, o que torna a Hemobrás dependente de uma parceria que disponha de registros sanitários de seus produtos e Certificação de Boas Práticas de Fabricação e Controle da planta na ANVISA. Parceria que precisa se dispor à absorver o que existe no canteiro de obras, projetando e executando as necessárias adequações e modernizações regulatórias para dar continuidade ao projeto, mesmo considerando a vulnerabilidade da concepção original.

Modernas plantas são concebidas em reduzidas áreas, verticalizadas e com as etapas, completamente independentes, quando o processo permite, para mitigar os eventuais riscos de biossegurança e de contaminação cruzada no processo.

Vários Fóruns internacionais discutem a questão da biossegurança e de potenciais riscos de contaminação cruzada em plantas de produção de medicamentos, com maior ênfase nos produtos de origem biológica, levando os novos projetos a envidar esforços para mitigar riscos envolvendo agentes biológicos e toxinas e biotecnologia.

Aspectos mercadológicos, compliances, propriedade intelectual, metodologias, procedimentos, critérios de controle e governança, absorção de novos conhecimentos de diferentes plataformas tecnológicas, em face do possível convívio com a dualidade de tecnologias internacionais, para produção do mesmo produto, igualmente devem ser considerados com maior atenção na alocação de projetos em cada Instituição Pública.

Se a absorção de metodologias de base biotecnológicas de um Parceiro detentor do produto, já representa um grande desafio para o a REDE Pública de Produtores de Medicamentos, absorver conhecimentos, diferentes, de mais de uma plataforma, ao mesmo tempo, expõem a Instituição a grande risco, além de implicar na duplicação de custos, em muitos casos.

Assim, os projetos estruturantes implementados pelo Complexo Industrial e Econômico da Saúde, como os anticorpos monoclonais, as insulinas e outros produtos de origem biotecnológica, precisam levar em consideração a biossegurança e a segurança sanitária, em todos aspectos que envolvam o universo da produção do medicamento, o meio ambiente, as infraestruturas e os demais requisitos destacados acima, e, priorizar escolhas conscientes, com melhorias na segurança física, para uma mitigar eventuais lacunas que possam estar havendo no sistema objetivando maior governança nas transferências de conhecimento, absorção e retenção das tecnologias.

A biossegurança compreende um conjunto de ações destinadas a prevenir, controlar, mitigar ou eliminar riscos inerentes às atividades que possam interferir ou comprometer a saúde humana, o meio ambiente e o bem-estar da pessoa. Portanto, se caracteriza como estratégia essencial para a pesquisa e o desenvolvimento sustentável da produção e controle de qualidade, com segurança e eficácia, sendo de fundamental importância avaliar e prevenir os possíveis efeitos adversos na implementação de novas tecnologias à saúde.

No âmbito do Ministério da Saúde (MS), a Biossegurança é tratada pela Comissão de Biossegurança em Saúde (CBS) que é coordenada pela Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos (SCTIE) e composta pelas Secretarias de Vigilância em Saúde (SVS) e de Atenção à Saúde (SAS), pela Assessoria de Assuntos Internacionais em Saúde (AISA), pela Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ), pela Fundação Nacional de Saúde (FUNASA) e pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA). A CBS foi instituída pela Portaria GM/MS nº 1.683, de 28 de agosto de 2003.

O planejamento estratégico do Ministério da Saúde, responsável pela implementação do Complexo Industrial e Econômico da Saúde, necessariamente, se obriga a incluir e trazer para a avaliação dos diferentes projetos que aprova a maior mitigação possível de potenciais riscos sanitários, regulatórios, mercadológicos, estratégicos, governança, segurança jurídica e política, garantindo a competividade, a eficácia e a segurança dos medicamentos e produtos estratégicos produzidos, notadamente no âmbito da REDE dos produtores públicos de medicamentos destinados ao SUS.

Dentro deste cenário e responsabilidades do Ministério da Saúde, objetivando mitigar riscos de desabastecimento e que eventualmente se formem monopólios de produção de determinados produtos de alto custo e risco, estabelece como uma das diretrizes básicas para implementação dos projetos, com maior ênfase para os de maior complexidade industrial, a distribuição da demanda do SUS em no mínimo dois produtores públicos, e, sempre que possível, que o País possa absorver mais de uma tecnologia, que permita a atualizar a evolução tecnológica do produto e a manutenção da competitividade mercadológica, minimizando os custos do SUS.

Uma importante consideração, se faz necessária, ao entendimento sobre a demanda dos produtos no Brasil, por ser o maior sistema único de saúde do mundo, se transforma no maior mercado específico, também. Tradicionalmente produtos de origem biológica já são adquiridos de diferentes fornecedores, alguns casos pela dimensão da demanda, outros por questões mercadológicas ou por cotas internacionais de determinados produtos, como a anfotericina b lipossomol, os hemoderivados e insulinas.

Grandes plantas internacionais, produtoras de medicamentos de origem biotecnológica não tem capacidade, não estão preparadas para atender, isoladamente, às demandas brasileiras, razão para que produtos registrados na ANVISA tenham origem de diferentes fábricas do mesmo fornecedor. Não é incomum encontrar o mesmo produto fabricado na Irlanda, na Ásia e na América embalado na Europa. Igualmente encontramos fabricação em Neuchatel, Suíça e embalado em Lessines, Bélgica. Fabricado em West Point, EUA e embalado em Sousas, Campinas/SP.  O que reforça a estratégia com a mitigação dos riscos.

É prática comum do mercado que as demandas de fatores de coagulação, albuminas, imunoglobulinas, vacinas sejam propostas nas concorrências com volumes menores ao solicitado no certame. Alguns desses produtos são partilhados em mais de dois fornecedores. 

A redistribuição dos projetos das PDPs, preconizadas pelas Portarias 1992 e 1993 cumpre estrategicamente os principais cuidados com a segurança, eficácia, sanitária, regulatória, mercadológica, e desenvolvimentista, assegurando ampla transparência para toda cadeia envolvida, sem danos ao erário público, sem induzindo a absorção de conhecimento a nível nacional, assentadas em plantas existentes na Bahia, Minas Gerais, Rio de Janeiro, São Paulo e Paraná, além de:
  • Assegurar que o Brasil absorva 2 e até 3 diferentes tecnológicas para produção do mesmo medicamento;
  • Distribuir regionalmente (BA, MG, RJ, SP, PR) no País a produção em diferentes laboratórios da REDE oficial de Produtores Público;
  • Distribuir regionalmente à diferentes governos e entre potenciais riscos de influências político partidárias, sobre a planta local (por exemplo o governo de Goiás lançou edital para venda de parte do IQUEGO, o Bahiafarma ficou fechado por alguns anos, a FURP fez PPP na planta de Américo Brasiliense, o Lafergs, as Universidades de Londrina e Maringá descontinuaram o laboratório, o IVB não tem planta própria);
  • Distribuir por diferentes naturezas jurídicas de cada Instituição Pública, BA, MG, SP fundações de Governo do Estado, RJ Fundação Pública Federal do MS, e Instituto Tecnológico do Governo do Paraná;
  • Distribuir os volumes de produção em plantas industriais próximas aos grandes centros de consumo dos medicamentos, verticalizando a logística;
  • Abrir ampla oportunidade para que todos os fabricantes de produtos inovadores internacionais participem dos projetos e possibilite ao País a absorção de diferentes, diferentes culturas tecnológicas e processos industriais, e, mitigam eventuais riscos como os que ocorreram na Genzyme e na LFB com grande impacto na saúde pública mundial e no Brasil;
  • Ampliar a capacitação a nível nacional para o desenvolvimento da cadeia produtiva e da formação de recursos humanos especializados;
  • Mitigar potenciais riscos de posicionamentos internacionais (Suíça, USA, Ásia, outro Países da Europa), com parceiros tecnológicos oriundos de diferentes países e culturas;
  • Estimular e retroalimentar a competitividade e a motivação para a atualização do produto e de sua metodologia de produção, com existência de mais de um parceiro tecnológico para o mesmo produto;
  • Impactar positivamente nos custos do SUS, pois no regime de aprovação das PDPs um dos requisitos é a busca pelo equilíbrio de preços entre os diversos fornecedores públicos;
  • Permitir um planejamento estratégico logístico e de desembolso do Ministério da Saúde reduzindo o impacto no fluxo de pagamentos com menor risco de desabastecimento;

As motivações acima, dentre outras, consideram que:
  1. Produtos de origem biotecnológica demandam grandes tecnologias, especificidades e plantas complexas que demandam grandes investimentos;
  2. O País tomou a decisão de consolidar conhecimentos nas plataformas biotecnológicas com prioridade estratégica;
  3. Os Governos dos Estados, principais controladores da maioria dos laboratórios da REDE de produtores oficiais perderam capacidade e interesse em investir na planta local para produzir para a união, já que os produtos são adquiridos exclusivamente pela União;
  4. A cadeia produtiva brasileira é pré-qualificada em plataformas com comprovada habilitação técnica, com grande potencial de desenvolvimento, em cada Instituição;
  5. Os laboratórios produtores, priorizados, são plantas consolidadas, tradicionais produtores de soros, vacinas, kits diagnósticos e outros produtos de origem biológica;
  6. O Brasil atrai potenciais parceiros tecnológicos pela capacidade de compra do Estado, que permite, com alguma segurança, realizar investimentos a partir das margens verticalizadas em função das grandes demandas asseguradas por algum tempo, mesmo quando o mercado fica dividido entre 2 ou 3 fabricantes.

Por toda exposição de motivos e razões técnicas que envolvem a estratégia de Governo em induzir o desenvolvimento regional do parque tecnológico da saúde, se alinha às recomendações técnicas regulatórias e sanitárias, protegendo a saúde da população brasileira, mitigando ao máximo o risco de desabastecimento, mantendo a concorrência mercadológica reduzindo o impacto de custos ao SUS




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