Destaques

segunda-feira, 30 de setembro de 2019

TUBERCULOSE - INSTRUÇÃO OPERACIONAL CONJUNTA PARA O ENFRENTAMENTO DA DOENÇA


INSTRUÇÃO OPERACIONAL CONJUNTA Nº 1, DE 26 DE SETEMBRO DE 2019
Orientações acerca da atuação do Sistema Único de Assistência Social (SUAS) em articulação com o Sistema Único de Saúde (SUS) no enfrentamento da Tuberculose (TB).
A SECRETARIA NACIONAL DE ASSISTÊNCIA SOCIAL do Ministério da Cidadania e a SECRETARIA DE VIGILÂNCIA EM SAÚDE do Ministério da Saúde, no uso de suas atribuições e visando a qualificação do cuidado integral às pessoas com tuberculose em situação de vulnerabilidade social, assinam a presente Instrução Operacional Conjunta.
Capítulo I
TUBERCULOSE
1. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), a tuberculose está na lista das 10 (dez) doenças infecciosas de agente único que mais mata, superando o HIV, constituindo um grave problema de saúde pública. Em 2017, estimou-se que no mundo 10 milhões de pessoas adoeceram de tuberculose, e 1,3 milhão de pessoas morreram em decorrência da doença[1].
2. O Brasil ocupa a 20ª posição quanto à carga da doença e a 19ª no que se refere à coinfecção TB-HIV[2]. Desde 2003, a doença é considerada de atenção prioritária na agenda política do Ministério da Saúde[3]. Embora seja uma doença com diagnóstico e tratamento realizados de forma universal, exclusivos e gratuitos pelo Sistema Único de Saúde (SUS), as pessoas ainda enfrentam inúmeras barreiras de acesso e de continuidade ao tratamento. Em 2018, foram registrados 75.717 casos novos da doença e, em 2017, 4.614 óbitos.
3. A tuberculose, uma das doenças mais antigas do mundo, é causada pela bactéria Mycobacterium tuberculosis que afeta prioritariamente os pulmões, embora possa acometer outros órgãos e sistemas. A apresentação pulmonar, além de ser mais frequente, é também a mais relevante para a saúde pública, pois é a principal responsável pela manutenção da cadeia de transmissão da doença.
4. A tuberculose é uma doença de transmissão aérea e sua proliferação ocorre a partir da inalação de aerossóis expelidos pela tosse e/ou fala de uma pessoa com tuberculose pulmonar ou laríngea. Somente pessoas com essas formas de tuberculose ativa transmitem a doença.
5. O estigma, o preconceito e a discriminação são fortes componentes que acompanham e complexificam a trajetória de cuidados das pessoas com tuberculose, já que o imaginário social voltado para o isolamento desses sujeitos como parte do tratamento, concepções que marcaram a vivência da tuberculose no passado e que até hoje impõem uma série de restrições e marginalizações as quais constituem entraves ao tratamento e ao controle da doença atualmente.
Capítulo II
DETERMINAÇÃO SOCIAL DA TUBERCULOSE
6. Um terço da população brasileira tem o bacilo da tuberculose (infecção latente), no entanto, o desenvolvimento da forma ativa da doença ocorre em pessoas com maiores vulnerabilidades, seja biológica, social ou econômica por conta de condições precárias de vida, que ecoam nos hábitos alimentares e nas condições de moradia. Ressalta-se, ainda, que, os locais com grande aglomeração de pessoas e ambientes com pouca ou nenhuma ventilação, se constituem em ambientes propícios a proliferação, como é o caso de moradias que se estruturam em condições precárias e informais, instituições de curta permanência, como unidades de acolhimento, unidades socioeducativas, entre outros.
7. Destaca-se como principais fatores de risco para o desenvolvimento e o agravamento da Tuberculose, a desnutrição; as doenças que debilitam o sistema imune, como a Aids; o uso de tabaco, álcool e outras drogas e a dificuldade de acesso aos cuidados de saúde.
8. Do total de pessoas que tiveram a tuberculose em 2018 no Brasil: 65,7% eram pessoas pardas ou pretas; 52,2% tinham até 8 anos de estudo; 41,6% tinham entre 15 e 34 anos de idade e 10,5% eram privados de liberdade.
9. Os povos indígenas, as pessoas privadas de liberdade, as pessoas que vivem com HIV e a população em situação de rua apresentam maior risco de adoecimento por tuberculose quando comparado a população em geral (ver quadro 1). A vulnerabilidade social, bem como as violações de direitos contribuem para o aumento do risco de adoecimento, que esses grupos populacionais enfrentam no país, incluindo as barreiras de acesso aos seus direitos e de ações de cuidado integral à saúde. Desse modo, esses grupos populacionais demandam estratégias específicas, que considerem as suas particularidades, visando o diagnóstico precoce e tratamento oportuno da doença, além de articulações intersetoriais que garantam o seu cuidado integral.
Quadro 1 - Risco de adoecimento por tuberculose nas populações vulneráveis em comparação ao risco da população geral
Populações vulneráveis
Risco de adoecimento por tuberculose
Indígenas (a)
3 vezes maior
Privados de liberdade (b)
28 vezes maior
Pessoas que vivem com o HIV (c)
25 vezes maior
Pessoas em situação de rua (d)
56 vezes maior
(a) Sinan/MS e IBGE (2013)
(b) Sinan/MS, IBGE e Infopen (2016)
(c) Sinan/MS, IBGE e DCCI (2017)
(d) Tbweb, SP, 2015 e Pessoa em Situação de Rua: Censo São Paulo, capital (2015)
Capítulo III
PLANO NACIONAL PELO FIM DA TUBERCULOSE
10. Como parte do esforço global para o enfrentamento da tuberculose e à luz do modelo proposto pela OMS, o Brasil elaborou um plano nacional visando o fim da tuberculose como problema de saúde pública. O documento traça estratégias baseadas em três pilares: 1- Prevenção e cuidado integrado centrado na pessoa; 2 - Políticas arrojadas e sistemas de apoio, e 3 - Intensificação da pesquisa e inovação.
11. Um dos principais objetivos do Pilar 2 é o fortalecimento da articulação intra e intersetorial para a garantia dos direitos humanos, da cidadania e da proteção social às pessoas com tuberculose.
12. Evidências científicas mostram a importância do enfrentamento dos determinantes sociais da doença e a oferta de proteção social à pessoa com tuberculose para melhores desfechos do tratamento:
- Pessoas com tuberculose cadastradas no Cadastro Único que recebem o Programa Bolsa Família, quando comparadas com aquelas que não recebem, apresentam maior percentual de cura e menor percentual de abandono do tratamento (Torrens, 2015).
- Municípios brasileiros com alta cobertura do Programa Bolsa Família apresentam coeficientes de incidência da tuberculose 8% menor que aqueles municípios com baixa cobertura (Nery, 2016).
- O acesso a programas de transferência de renda e à Estratégia Saúde da Família (condicionalidade da saúde) apresentam impacto positivo nos desfechos do tratamento da tuberculose na população mais pobre, indicando a necessidade de uma abordagem abrangente para além da doença (Nery, 2016).
- Durante o tratamento, pessoas que recebem cesta básica apresentam maior probabilidade de cura e menor probabilidade de abandono, quando comparadas às que não recebem (Lab -Epi UFES, 2016).
- O projeto "PACTU pela cura" desenvolveu atividades intersetoriais através da oferta de alimentação durante a realização do tratamento diretamente observado da tuberculose. Das pessoas que receberam alimentação, cerca de 90% obtiveram cura por tuberculose, 52% se inscreveram para o recebimento de benefícios sociais e 22% reestabeleceram vínculo com a família (Boletim Epidemiológico SMS/SP, 2016).
Capítulo IV
PREVENÇÃO E CUIDADO DA PESSOA COM TUBERCULOSE
13. O diagnóstico precoce, o início oportuno e a adesão ao tratamento são as estratégias apropriadas para se interromper a cadeia de transmissão da tuberculose. A realização da busca ativa de pessoas com sintomas respiratórios pelas equipes de saúde deve ser o ponto de partida para a identificação de casos suspeitos da doença. É importante saber que na população em geral, é denominado sintomático respiratório aquele indivíduo que apresenta tosse por um período de três semanas ou mais. Já no caso das populações mais vulneráveis como os povos indígenas, pessoas vivendo com o HIV, pessoas privadas de liberdade e população em situação de rua, considera-se sintomático respiratório quando há a presença de tosse, independentemente do tempo de duração.
14. Além da tosse, outros sinais e sintomas podem auxiliar na identificação de pessoas que apresentam tuberculose, como febre vespertina (em geral até 38,5° C), persistente por 15 (quinze) dias ou mais, sudorese noturna, emagrecimento e fadiga. Em crianças menores de 10 (dez) anos as manifestações clínicas podem variar.
15. A tuberculose é curável em praticamente 100% (cem por cento) dos casos, desde que sejam respeitados os princípios do tratamento, cuja a não interrupção é premissa imprescindível para cura.
16. Para o tratamento são utilizados 4 (quatro) tipos de antibióticos de ingestão diária. O tratamento é longo, no mínimo, 6 (seis) meses, de difícil acompanhamento, sobretudo para os segmentos que enfrentam barreiras de acesso aos serviços de saúde. Caso o tratamento não seja realizado da forma recomendada, a pessoa pode desenvolver o tipo resistente da doença, denominada tuberculose drogarresistente (TB-DR), que apresenta um tempo de tratamento prolongado, podendo chegar a 2 (dois) anos e com uso de um número maior de tipos de antibióticos.
17. Recomenda-se a realização de Tratamento Diretamente Observado (TDO) que constitui elemento fundamental para a adesão ao tratamento, através do estabelecimento de vínculo entre a pessoa e o serviço de saúde. Neste processo, é necessário o reconhecimento de barreiras que possam dificultar a adesão, utilizando estratégias de reabilitação, inclusão social, melhora da autoestima, qualificação profissional, entre outras necessidades.
18. No âmbito dos serviços de saúde, o acolhimento (que para a rede socioassistencial é a acolhida) e o vínculo entre a equipe de saúde, a pessoa com tuberculose e sua família ampliam a possibilidade de conclusão do tratamento da tuberculose promovendo maior adesão. É importante a corresponsabilização e o empoderamento da pessoa com tuberculose pelo seu tratamento.
19. É comum que a tuberculose promova impactos na força laboral afetando a produtividade, o que também desestabiliza a dinâmica familiar, podendo gerar muitos gastos adicionais (alimentação, transporte para as consultas, outros medicamentos, pernoite em outro município, dentre outros).
20. Levando em consideração os determinantes sociais da doença e a condição de vulnerabilidade e risco social, existe alta probabilidade da maioria das pessoas com tuberculose necessitarem acessar os serviços executados pela Política Nacional de Assistência Social. Assim, a atuação do trabalho social com famílias e pessoas em tratamento da tuberculose realizado pelos serviços socioassistenciais deve contemplar as necessidades de cuidado identificadas.
21. O trabalho social desenvolvido pelas equipes da Rede Socioassistencial deve contribuir para qualificar a trajetória de melhores desfechos de tratamento da pessoa com tuberculose devido a: (i) garantia do acesso às provisões socioassistenciais (benefícios, programas, projetos e serviços socioassistenciais) que são desenvolvidos para a prevenção e enfrentamento das situações de vulnerabilidade social, riscos, violência e demais formas de violação de direitos; (ii) capacidade e função de articulação na defesa e na promoção de direitos que envolve o atendimento integral da população, através da realização de encaminhamentos às outras políticas públicas, principalmente a Rede de Atenção à Saúde, aos órgãos do Sistema de Defesa e Garantia de Direitos, do Sistema de Justiça, às redes sociais comunitárias e de apoio; e à comunicação e defesa de direitos, (iii) a estruturação dos fundamentos dos serviços socioassistenciais pautados na perspectiva crítica acerca das condições socioeconômicas, históricas, culturais e políticas que as pessoas e suas famílias estão imbricadas, as quais não podem ser facilmente responsabilizadas por ausências provocadas pela vivência da desigualdade social.
22. Desta forma, o Sistema Único de Assistência Social (SUAS) possui importantes contribuições que podem impactar no controle da tuberculose através da adesão e garantia de conclusão do tratamento. Para tanto, o acompanhamento socioassistencial deve dispor especial atenção em relação à identificação e diminuição de possíveis barreiras existentes na completude do tratamento. Ademais, pode auxiliar na identificação de casos suspeitos da doença por meio da observação de sinais e sintomas da tuberculose.
Capítulo V
ATUAÇÃO CONJUNTA SUAS E SUS PARA O ENFRENTAMENTO DA TUBERCULOSE
Seção I
GESTÃO LOCAL E ARTICULAÇÃO
23. Atuação pautada pela integração entre a Rede Socioassistencial e a Rede de Atenção à Saúde, com amparo administrativo e político da gestão local, com a adoção de fluxos, protocolos e procedimentos de trabalho, visando a atenção integral dos (as) usuários (as), deverá garantir:
- O acesso ao Cadastro Único para programas sociais do governo federal.
- O acesso à Segurança Alimentar e Nutricional por meio do acesso à renda, aos alimentos disponíveis nas unidades socioassistenciais e à integração com o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (SISAN).
- Construção de estratégias específicas de atuação entre SUAS e SUS considerando os fatores de risco para o desenvolvimento e o agravamento da doença (desnutrição, presença de outras doenças e o uso de tabaco, álcool e outras drogas).
- Estabelecimento de mecanismos de referência e de contrarreferência entre os serviços socioassistenciais de Proteção Social Básica e de Proteção Social Especial de média e de alta complexidade com os serviços da rede de atenção à saúde, visando a identificação de barreiras ao tratamento e a defesa e promoção de direitos das pessoas com tuberculose.
- Promover ações conjuntas dentro das unidades socioassistenciais e espaços comunitários com vistas a realização de palestras e campanhas para incentivar e fortalecer a permanência das pessoas com tuberculose em tratamento, para a disseminação de informações e normativas sobre o tema, para a construção de estratégias de prevenção da doença, dentre outras atividades que visam a ampliação e o acesso dos direitos.
- Desenvolvimento de estratégias particularizadas, coletivas e comunitárias para o enfrentamento dos fatores de risco que propiciam o desenvolvimento e o agravamento da doença (população em situação de rua, desnutrição, moradias precárias, uso de tabaco, álcool e outras drogas), realizando reuniões de estudo de caso conjuntos entre equipes do SUAS e SUS.
- A utilização do Centros de Referência, como: Centro de Referência da Assistência Social (CRAS), Centro de Referência Especializado da Assistência Social (CREAS), Centro de Referência Especializado para População em Situação de Rua (Centro Pop), Unidades de Acolhimento, entre outros, como espaços para o desenvolvimento de atividades entre SUAS e SUS visando o empoderamento e a proteção social da pessoa com tuberculose.
Seção II
ORIENTAÇÕES PARA ATUAÇÃO DOS PROFISSIONAIS DA REDE SOCIASSISTENCIAL JUNTO AOS INDIVÍDUOS COM SUSPEITA OU CONFIRMAÇÃO DE TUBERCULOSE
24. Orientar e acompanhar os (as) usuários (as), para que procurem a Rede de Atenção à Saúde para a realização dos exames de diagnóstico da tuberculose, assim como obtenção dos resultados e início do tratamento em tempo oportuno.
25. Considerar o diagnóstico da tuberculose na elaboração do estudo social, registrando quando o/a usuário/a foi encaminhado pela Rede de Atenção à Saúde por esse motivo.
26. Considerar o diagnóstico da tuberculose na elaboração na construção do Plano Individual de Atendimento, garantindo e promovendo direitos das pessoas com tuberculose para a adesão ao tratamento e o cumprimento dos seus princípios pelo tempo exigido.
27. Articular entre equipes SUAS e SUS, quando couber, o Plano Individual de Atendimento e o Projeto Terapêutico Singular, na perspectiva de um atendimento integral da pessoa com tuberculose e sua família.
28. Garantir acesso aos serviços de acolhimento aos usuários com diagnóstico de tuberculose que não tenham moradia, avaliando a possibilidade de permanência por pelo menos 6 (seis) meses de tratamento.
29. Desenvolver estratégias de atendimento e acompanhamento diferenciados para a pessoa com tuberculose com foco no cumprimento do tratamento e com especial atenção aos grupos populacionais mais vulneráveis.
30. Promover o acesso da pessoa em tratamento de tuberculose e sua família aos benefícios, programas, projetos e serviços socioassistenciais disponíveis nos municípios, Distrito Federal e estados, bem como o acesso à documentação civil, ao Cadastro Único, às demais políticas públicas, aos órgãos do Sistema de Garantia e Defesa de Direitos e do Sistema de Justiça, e às redes locais e comunitárias.
31. Promover ações conjuntas dentro das unidades socioassistenciais, no território e nos espaços comunitários de enfrentamento ao preconceito e estigma em relação à tuberculose.
32. Estabelecer especial atenção as possíveis barreiras que dificultem a adesão ao tratamento e que devem ser tratadas no âmbito do trabalho socioassistencial como o estigma e preconceito de familiares e da comunidade, necessidades decorrentes do uso de álcool ou outras drogas, vulnerabilidade de renda, dependência de cuidados, entre outros.
33. Promover a disseminação desta Instrução Operacional para todos os técnicos (as) que atuam nos serviços da Rede Socioassistencial e da Rede de Atenção à Saúde.
MARIANA DE SOUSA MACHADO NERIS
Secretária Nacional de Assistência Social do Ministério da Cidadania
WELINGTON COIMBRA
Secretário Especial do Desenvolvimento Social do Ministério da Cidadania
WANDERSON KLEBER DE OLIVEIRA
Secretário de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde


0 comentários:

Postar um comentário

Calendário Agenda