Destaques

quarta-feira, 24 de março de 2021

BUROCRACIA NÃO PODE IMPEDIR A AQUISIÇÃO DE VACINAS- TCU DETERMINA QUE MS “cumpra as Leis 14.121 e 14.124, ambas de 2021"

TCU, respondeu uma demanda do Ministério da Saúde, enfaticamente: determinando a aplicação das normas especiais preconizadas pelaLeis 14.121 e 14.124, ambas de 2021” que determinam cláusulas especiais que prevalecem, e, se sobrepõem a teoria geral dos contratos. A dignidade humana e a intangibilidade da saúde são fundamentos de nossa República, previstos em nossa Constituição”, disse um o Min. Bruno Dantas.

RESUMO

  • O TCU respondeu devem ser aplicadas as normas especiais, à consulta do Ministério da Saúde sobre a aquisição de produtos para combate à pandemia da Covid-19 sob a égide das novas Leis que flexibilizaram as aquisições das vacinas, produtos e saúde e insumos estratégicos.  
  • No entendimento do TCU prevalecem as normas específicas das duas novas leis quando em contradição com a teoria geral dos contratos e as regras da Aliança Gavi sobre contrato.  “Estamos vendo uma espécie de ‘deslegalização’, na qual as próprias leis em tela determinam a prevalência das cláusulas especiais”, explicou o relator.
  •  
  • O TCU entendeu que a situação excepcional permite uma realocação de riscos. Desse modo, o Estado brasileiro assumiria mais riscos que os laboratórios e fornecedores de vacinas. 

Assim como, também por explícita decisão do legislador, devem prevalecer as cláusulas especiais estabelecidas pelo art. 12 da Lei 14.124/2021 quando houver contradição com as demais normas legais que tratem da teoria geral dos contratos. 

Riscos 

“Considerando os riscos ainda desconhecidos e o grande desequilíbrio entre a situação de oferta e demanda, não há óbice jurídico, a partir da ampliação da autonomia contratual concedida pelas Leis 14.121/2021 e 14.124/2021, a que o Estado Brasileiro aceite eventual cláusula limitadora de responsabilidade contratual das empresas fornecedoras”, explanou o ministro Benjamin Zymler, relator do processo no TCU. 

Da mesma forma, a limitação ou exoneração da empresa fornecedora quanto ao dever de indenizar os cidadãos em razão de danos causados pelas vacinas, de modo que a obrigação pelo pagamento seja assumida, total ou parcialmente, pelo Poder Público, foi vista pelo Tribunal como permitida, frente aos desafios excepcionais da pandemia.  

Em ambos os casos, limitação da responsabilidade contratual e exoneração do dever de indenizar, a repactuação dos riscos deve ser suportada pelo Estado brasileiro se esta condição estiver sendo praticada nos negócios firmados com os diversos países e for requisito intransponível para a aquisição do produto, ressalvados os casos de dolo ou culpa grave do fornecedor, de terceiros e situações de ofensa à ordem pública. 

Debate em plenário 

Para o ministro Bruno Dantas, “a burocracia não pode ser entrave à compra de vacinas em um País onde morrem quase três mil pessoas por dia. A dignidade humana e a intangibilidade da saúde são fundamentos de nossa República, previstos em nossa Constituição”.  

Já o ministro Vital do Rêgo ponderou que “o Brasil tem sido visto como mau exemplo para o mundo na questão da vacinação. Embora tenhamos 38 mil salas para vacinar os cidadãos”. Por sua vez, o ministro Raimundo Carreiro asseverou a necessidade de vacinas “que venham para salvar a nossa população. São muitas mortes diariamente, a situação é urgente”.  

Integra do Acórdão

9. Acórdão:

VISTOS, relatados e discutidos estes autos que versam sobre consulta formulada pelo Ministro de Estado da Saúde Eduardo Pazuello a respeito da melhor exegese dos arts. 2º da Medida Provisória 1.003/2020 e 12 da Medida Provisória 1.026/2021, que foram, respectivamente, convertidas nas Leis 14.121/2021 e 14.124/2021.

ACORDAM os Ministros do Tribunal de Contas da União, reunidos em sessão do Plenário, ante as razões expostas pelo Relator, em:

9.1. conhecer da presente consulta, por preencher os requisitos de admissibilidade previstos no art. 1º, XVII, da Lei 8.443/1992 c/c art. 264, VI, do Regimento, para responder ao consulente que:

9.1.1. no caso de contradição entre as regras da Aliança Gavi sobre contrato, internalizadas pela Lei 14.121/2021, e as demais normas legais que tratem da designada teoria geral dos contratos, aplicam-se aquelas, por expressa opção do legislador;

9.1.2. no caso de contradição entre as cláusulas especiais estabelecidas nos limites do art. 12 da Lei 14.124/2021 e as demais normas legais que tratem da designada teoria geral dos contratos, aplicam-se aquelas, por expressa opção do legislador;

9.1.3. as cláusulas contratuais estabelecidas em razão das regras da Aliança Gavi sobre contrato, internalizadas pela Lei 14.121/2021, ou em função do permissivo do art. 12 da Lei 14.124/2021, devem estar de acordo com a ordem pública, de modo que eventual tratativa a respeito de sua incompatibilidade deve contar com o devido suporte da AGU, a fim de possibilitar o escorreito tratamento à questão;

9.1.4. a autonomia contratual conferida à União por meio dos arts. 2º da Lei 14.121/2021 e 12 da Lei 14.124/2021, em razão da situação emergencial decorrente da pandemia do novo coronavírus, permite que o Poder Público assuma compromissos tais como a aprovação de leis ou a expedição de atos de incumbência de outros ministérios, desde que isso não implique violação da Constituição. Nesta hipótese, cabe à Casa Civil da Presidência da República assumir as tratativas do acordo, com vistas à sua escorreita operacionalização. Quanto às consequências do descumprimento do ajuste, o tema deverá ser tratado pelas partes no contrato.

9.1.5. a maior autonomia contratual, seja pela adesão às regras da Aliança Gavi, seja pela aceitação das cláusulas impostas pelo fornecedor de vacinas como condição à conclusão do negócio, não pode levar à estipulação de obrigações que contrariem outras normas cogentes do nosso ordenamento jurídico que não foram afastadas pelas leis mencionadas, a exemplo da Lei de Responsabilidade Fiscal e da Lei 4.320/1964, até porque é requisito de validade de todo negócio jurídico que seu objeto seja lícito (art. 104, inciso II, do Código Civil);

9.1.6. não há óbice a que o regime jurídico contratual especial, relacionado à aquisição de vacinas, envolva as questões específicas do processo judicial passíveis de disposição pelas partes, a exemplo dos arts. 63 (alteração da competência para processamento em razão do valor e do território), 313, inciso III (convenção para suspensão do processo), e 471 (seleção do perito), todos do CPC;

9.1.7. caso o acordo de aquisição de vacinas contenha cláusula envolvendo a transação de direitos processuais, é necessária a emissão de parecer autorizativo pela Advocacia-Geral da União, em linha de coerência com a Lei 13.140/2015;

9.1.8. não é possível vislumbrar, de modo antecipado, quais propósitos levariam o Poder Público e as fornecedoras de vacinas a pactuarem o afastamento de regras processuais da Lei 9.874/1999, que possui como norte os princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência;

9.1.9. considerando os riscos ainda desconhecidos e o grande desequilíbrio entre a situação de oferta e demanda, não há óbice jurídico, a partir da ampliação da autonomia contratual concedida pelas Leis 14.121/2021 e 14.124/2021, a que o Estado Brasileiro aceite eventual cláusula limitadora de responsabilidade contratual das empresas fornecedoras, se esta condição estiver sendo praticada nos negócios firmados com os diversos países e for requisito intransponível para a aquisição do produto, ressalvados os casos de dolo ou culpa grave do fornecedor e situações de ofensa à ordem pública;

9.1.10. considerando os riscos ainda desconhecidos e o grande desequilíbrio entre a situação de oferta e demanda, não há óbice jurídico a que a União pactue, nos contratos firmados em razão das Leis 14.121/2021 e 14.124/2021, a limitação ou exoneração da empresa fornecedora quanto ao dever de indenizar os cidadãos em razão de danos causados pelas vacinas, de modo que a obrigação pelo pagamento seja assumida, total ou parcialmente, pelo Poder Público, ressalvados os casos de dolo ou culpa grave do fornecedor e situações de ofensa à ordem pública. Isso será possível se a cláusula estiver sendo adotada nos negócios firmados com os diversos países e constituir condição indispensável para a aquisição das vacinas.

9.1.11. não é possível vislumbrar qual razão de interesse público levaria o Poder Público e as fornecedoras de vacinas a pactuarem o afastamento de normas de caráter internacional, tais como as previstas na Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas;

9.1.12. é perfeitamente possível o Poder Público pactuar novas regras de distribuição de riscos, no que se refere aos contratos para aquisição de vacinas, considerando a maior autonomia contratual conferida pelas Leis 14.121/2021 e 14.124/2021 e a premência na remediação da situação de emergência causada pela pandemia do novo coronavírus;

9.1.13. essa opção deve ser devidamente motivada, cabendo ao Estado seguir as boas práticas de governança, gestão de riscos e controles internos, bem como as circunstâncias excepcionais postas, a fim de avaliar se os termos propostos pelas fornecedoras constituem cláusulas uniformes praticadas atualmente em outras contratações com outros países e se são imprescindíveis à obtenção de vacinas;

9.1.14. como limite a essa autonomia contratual, não é possível o Estado assumir a responsabilidade por riscos ligados a danos decorrentes de atos praticados com dolo ou culpa grave dos fornecedores de vacinas ou terceiros ou que se mostrem contrários à ordem pública; e

9.1.15. pelas dificuldades envolvidas na solução de eventual questão jurídica, seria importante que as cláusulas de alocação dos riscos dos contratos de aquisição de vacinas, assim como o seu inteiro teor, fossem precedidas de parecer jurídico da AGU, a fim de possibilitar o escorreito tratamento à questão.

9.2. dar ciência da presente deliberação aos Ministros da Saúde, da Advocacia-Geral da União e da Casa Civil;

9.3. arquivar o presente processo, nos termos do art. 169, inciso IV, do Regimento Interno.

10. Ata n° 8/2021 – Plenário.

11. Data da Sessão: 17/3/2021 – Telepresencial.

12. Código eletrônico para localização na página do TCU na Internet: AC-0534-08/21-P.

Acórdão 534/2021 

Serviço

Leia a íntegra da decisão: Acórdão 534/2021 – Plenário 

Processo: TC 006.851/2021-5 

Sessão: 17/03/2021 

Secom – ed/pd 

Com informações do TCU

0 comentários:

Postar um comentário

Calendário Agenda