TCU,
respondeu uma demanda do Ministério da Saúde, enfaticamente: determinando
a aplicação das normas especiais preconizadas pelas Leis 14.121 e 14.124, ambas de 2021” que determinam
cláusulas especiais que prevalecem, e, se sobrepõem a teoria geral dos
contratos. A dignidade humana e a intangibilidade da saúde são fundamentos de
nossa República, previstos em nossa Constituição”, disse um o Min. Bruno
Dantas.
RESUMO
- O TCU respondeu devem ser
aplicadas as normas especiais, à consulta do Ministério da
Saúde sobre a aquisição de produtos para combate à pandemia da
Covid-19 sob a égide das novas Leis que flexibilizaram as aquisições das
vacinas, produtos e saúde e insumos estratégicos.
- No entendimento do TCU prevalecem as normas
específicas das duas novas leis quando em contradição com a teoria geral
dos contratos e as regras da Aliança Gavi sobre contrato. “Estamos
vendo uma espécie de ‘deslegalização’, na qual as próprias leis em tela
determinam a prevalência das cláusulas especiais”, explicou o relator.
-
- O TCU entendeu que a situação excepcional
permite uma realocação de riscos. Desse modo, o Estado brasileiro
assumiria mais riscos que os laboratórios e fornecedores de vacinas.
Assim como, também por
explícita decisão do legislador, devem prevalecer as cláusulas especiais
estabelecidas pelo art. 12 da Lei 14.124/2021 quando houver
contradição com as demais normas legais que tratem da teoria
geral dos contratos.
Riscos
“Considerando os riscos
ainda desconhecidos e o grande desequilíbrio entre a situação de
oferta e demanda, não há óbice jurídico, a partir da ampliação da autonomia
contratual concedida pelas Leis 14.121/2021 e 14.124/2021, a que o Estado
Brasileiro aceite eventual cláusula limitadora de responsabilidade
contratual das empresas fornecedoras”, explanou o ministro Benjamin Zymler,
relator do processo no TCU.
Da mesma forma, a
limitação ou exoneração da empresa fornecedora quanto ao dever de
indenizar os cidadãos em razão de danos causados pelas vacinas, de
modo que a obrigação pelo pagamento seja assumida, total ou parcialmente,
pelo Poder Público, foi vista pelo Tribunal como permitida, frente aos
desafios excepcionais da pandemia.
Em ambos os casos, limitação
da responsabilidade contratual e exoneração do dever de indenizar, a repactuação
dos riscos deve ser suportada pelo Estado brasileiro se esta
condição estiver sendo praticada nos negócios firmados com os diversos
países e for requisito intransponível para a aquisição do
produto, ressalvados os casos de dolo ou culpa grave do fornecedor, de
terceiros e situações de ofensa à ordem pública.
Debate em plenário
Para o ministro Bruno Dantas,
“a burocracia não pode ser entrave à compra de vacinas em um País onde morrem
quase três mil pessoas por dia. A dignidade humana e a
intangibilidade da saúde são fundamentos de nossa República, previstos em nossa
Constituição”.
Já o ministro Vital do Rêgo
ponderou que “o Brasil tem sido visto como mau exemplo para o mundo na questão
da vacinação. Embora tenhamos 38 mil salas para vacinar os
cidadãos”. Por sua vez, o ministro Raimundo Carreiro asseverou a necessidade de
vacinas “que venham para salvar a nossa população. São muitas
mortes diariamente, a situação é urgente”.
Integra do Acórdão
9. Acórdão:
VISTOS, relatados e discutidos
estes autos que versam sobre consulta formulada pelo Ministro de Estado da
Saúde Eduardo Pazuello a respeito da melhor exegese dos arts. 2º da Medida
Provisória 1.003/2020 e 12 da Medida Provisória 1.026/2021, que foram,
respectivamente, convertidas nas Leis 14.121/2021 e 14.124/2021.
ACORDAM os Ministros do
Tribunal de Contas da União, reunidos em sessão do Plenário, ante as razões
expostas pelo Relator, em:
9.1. conhecer da presente
consulta, por preencher os requisitos de admissibilidade previstos no art. 1º,
XVII, da Lei 8.443/1992 c/c art. 264, VI, do Regimento, para responder ao
consulente que:
9.1.1. no caso de contradição
entre as regras da Aliança Gavi sobre contrato, internalizadas pela Lei
14.121/2021, e as demais normas legais que tratem da designada teoria geral dos
contratos, aplicam-se aquelas, por expressa opção do legislador;
9.1.2. no caso de contradição
entre as cláusulas especiais estabelecidas nos limites do art. 12 da Lei
14.124/2021 e as demais normas legais que tratem da designada teoria geral dos
contratos, aplicam-se aquelas, por expressa opção do legislador;
9.1.3. as cláusulas
contratuais estabelecidas em razão das regras da Aliança Gavi sobre contrato,
internalizadas pela Lei 14.121/2021, ou em função do permissivo do art. 12 da
Lei 14.124/2021, devem estar de acordo com a ordem pública, de modo que
eventual tratativa a respeito de sua incompatibilidade deve contar com o devido
suporte da AGU, a fim de possibilitar o escorreito tratamento à questão;
9.1.4. a autonomia contratual
conferida à União por meio dos arts. 2º da Lei 14.121/2021 e 12 da Lei
14.124/2021, em razão da situação emergencial decorrente da pandemia do novo
coronavírus, permite que o Poder Público assuma compromissos tais como a
aprovação de leis ou a expedição de atos de incumbência de outros ministérios,
desde que isso não implique violação da Constituição. Nesta hipótese, cabe à
Casa Civil da Presidência da República assumir as tratativas do acordo, com
vistas à sua escorreita operacionalização. Quanto às consequências do
descumprimento do ajuste, o tema deverá ser tratado pelas partes no contrato.
9.1.5. a maior autonomia
contratual, seja pela adesão às regras da Aliança Gavi, seja pela aceitação das
cláusulas impostas pelo fornecedor de vacinas como condição à conclusão do
negócio, não pode levar à estipulação de obrigações que contrariem outras
normas cogentes do nosso ordenamento jurídico que não foram afastadas pelas
leis mencionadas, a exemplo da Lei de Responsabilidade Fiscal e da Lei
4.320/1964, até porque é requisito de validade de todo negócio jurídico que seu
objeto seja lícito (art. 104, inciso II, do Código Civil);
9.1.6. não há óbice a que o
regime jurídico contratual especial, relacionado à aquisição de vacinas,
envolva as questões específicas do processo judicial passíveis de disposição
pelas partes, a exemplo dos arts. 63 (alteração da competência para
processamento em razão do valor e do território), 313, inciso III (convenção
para suspensão do processo), e 471 (seleção do perito), todos do CPC;
9.1.7. caso o acordo de
aquisição de vacinas contenha cláusula envolvendo a transação de direitos processuais,
é necessária a emissão de parecer autorizativo pela Advocacia-Geral da União,
em linha de coerência com a Lei 13.140/2015;
9.1.8. não é possível
vislumbrar, de modo antecipado, quais propósitos levariam o Poder Público e as
fornecedoras de vacinas a pactuarem o afastamento de regras processuais da Lei
9.874/1999, que possui como norte os princípios da legalidade, finalidade,
motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa,
contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência;
9.1.9. considerando os riscos
ainda desconhecidos e o grande desequilíbrio entre a situação de oferta e
demanda, não há óbice jurídico, a partir da ampliação da autonomia contratual
concedida pelas Leis 14.121/2021 e 14.124/2021, a que o Estado Brasileiro
aceite eventual cláusula limitadora de responsabilidade contratual das empresas
fornecedoras, se esta condição estiver sendo praticada nos negócios firmados
com os diversos países e for requisito intransponível para a aquisição do
produto, ressalvados os casos de dolo ou culpa grave do fornecedor e situações
de ofensa à ordem pública;
9.1.10. considerando os riscos
ainda desconhecidos e o grande desequilíbrio entre a situação de oferta e
demanda, não há óbice jurídico a que a União pactue, nos contratos firmados em
razão das Leis 14.121/2021 e 14.124/2021, a limitação ou exoneração da empresa
fornecedora quanto ao dever de indenizar os cidadãos em razão de danos causados
pelas vacinas, de modo que a obrigação pelo pagamento seja assumida, total ou
parcialmente, pelo Poder Público, ressalvados os casos de dolo ou culpa grave
do fornecedor e situações de ofensa à ordem pública. Isso será possível se a
cláusula estiver sendo adotada nos negócios firmados com os diversos países e
constituir condição indispensável para a aquisição das vacinas.
9.1.11. não é possível
vislumbrar qual razão de interesse público levaria o Poder Público e as
fornecedoras de vacinas a pactuarem o afastamento de normas de caráter
internacional, tais como as previstas na Convenção de Viena sobre Relações
Diplomáticas;
9.1.12. é perfeitamente
possível o Poder Público pactuar novas regras de distribuição de riscos, no que
se refere aos contratos para aquisição de vacinas, considerando a maior
autonomia contratual conferida pelas Leis 14.121/2021 e 14.124/2021 e a
premência na remediação da situação de emergência causada pela pandemia do novo
coronavírus;
9.1.13. essa opção deve ser
devidamente motivada, cabendo ao Estado seguir as boas práticas de governança,
gestão de riscos e controles internos, bem como as circunstâncias excepcionais
postas, a fim de avaliar se os termos propostos pelas fornecedoras constituem
cláusulas uniformes praticadas atualmente em outras contratações com outros
países e se são imprescindíveis à obtenção de vacinas;
9.1.14. como limite a essa
autonomia contratual, não é possível o Estado assumir a responsabilidade por
riscos ligados a danos decorrentes de atos praticados com dolo ou culpa grave
dos fornecedores de vacinas ou terceiros ou que se mostrem contrários à ordem
pública; e
9.1.15. pelas dificuldades
envolvidas na solução de eventual questão jurídica, seria importante que as
cláusulas de alocação dos riscos dos contratos de aquisição de vacinas, assim
como o seu inteiro teor, fossem precedidas de parecer jurídico da AGU, a fim de
possibilitar o escorreito tratamento à questão.
9.2. dar ciência da presente
deliberação aos Ministros da Saúde, da Advocacia-Geral da União e da Casa
Civil;
9.3. arquivar o presente
processo, nos termos do art. 169, inciso IV, do Regimento Interno.
10. Ata n° 8/2021 – Plenário.
11. Data da Sessão: 17/3/2021
– Telepresencial.
12. Código eletrônico para
localização na página do TCU na Internet: AC-0534-08/21-P.
Serviço
Leia a íntegra da
decisão: Acórdão 534/2021 – Plenário
Processo: TC 006.851/2021-5
Sessão: 17/03/2021
Secom – ed/pd
Com informações do TCU
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