Complicações em adultos
Pesquisadores da Universidade
Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) constataram que o vírus zika, além de se
replicar no cérebro de pessoas adultas, também causa prejuízos de memória e
problemas motores.
O vírus zika ataca também os
neurônios maduros de adultos, o que exigirá reavaliação dos pacientes anos
depois da infecção.
O estudo foi iniciado na época
do surto de zika no país, nos anos de 2015 e 2016. "[Na época] aumentou o
número de casos e, junto com a microcefalia, que foi o que chamou mais a
atenção, começaram a aparecer complicações em pacientes adultos," relembra
uma das coordenadoras da pesquisa, a neurocientista Cláudia Figueiredo.
Apesar de a doença ser
majoritariamente autolimitada, com sintomas leves, muitos pacientes
apresentavam quadro mais grave: alguns entravam em coma ou tinham internações
por períodos mais longos.
"Então, surgiu a nossa
pergunta: os pesquisadores têm mostrado que o vírus se replica em células
progenitoras, que são aquelas do feto, do nervo central. Será que esse vírus
não infecta também o neurônio maduro? Foi aí que começou a nossa abordagem",
contou Cláudia.
Zika em neurônios adultos
Os pesquisadores da UFRJ
usaram tecidos de acesso, ou seja, tecidos sem doença, de pacientes adultos que
haviam se submetido a cirurgias do cérebro, mas não tinham zika. Eles fizeram
cultura em laboratório e colocaram o vírus zika nesse tecido, que possui
neurônios maduros. Observaram então que o vírus infectava aquelas células,
principalmente os neurônios desse tecido, e se replicava nesse tecido. Ou seja,
produzia novas partículas virais.
Nesse meio tempo, surgiram
dados clínicos de que, em alguns pacientes, se detectava o vírus no sistema
nervoso central, no líquor, que é o líquido que envolve o cérebro. Os
pesquisadores da UFRJ decidiram então ver que tipo de efeito aconteceria se
infectassem o cérebro de um animal adulto com esse vírus. "A gente fez a
administração do vírus dentro do cérebro do camundongo adulto e observou várias
coisas", disse Cláudia.
Constatou-se então que o vírus
se replicava no cérebro do animal adulto e tinha preferência por áreas relacionadas
com a memória e o controle motor.
"E era justamente isso
que estava alterado nos pacientes quando eles tinham o vírus em quadros mais
complicados. Não só o vírus se replicou, mas ele [camundongo] ficou com
prejuízo de memória e prejuízo motor. Quando o vírus infecta, em algumas
pessoas, não se sabe por quê, o vírus chega ao sistema nervoso central, em
outras não, depende de vários fatores, e pode causar esse tipo de dano,"
disse Cláudia.
Reavaliar os pacientes
Nos animais de laboratório, o
prejuízo de memória foi além da fase da infecção, permanecendo mesmo após a
infecção ter sido controlada. O vírus se replicou, com um pico de replicação de
vários dias. "Só que, até 30 dias depois que o vírus já está com
quantidade baixa no cérebro, o animal ainda continua com prejuízo de memória. O
prejuízo de memória persiste," disse Cláudia, lembrando que 30 dias na
vida de um camundongo equivalem de dois a quatro anos na vida de um ser humano:
"É muito tempo".
O estudo também concluiu que o
vírus induz uma informação importante no cérebro: que esses períodos de memória
estão associados a quadros inflamatórios muito intensos. Os pesquisadores
usaram um anti-inflamatório e viram que esse tratamento melhora o prejuízo de
memória, levando o paciente a recuperar a função prejudicada.
Os cientistas acreditam que a
descoberta pode contribuir para a elaboração de políticas públicas para
tratamento de complicações neurológicas por zika em pacientes adultos. Eles
alertam, por exemplo, que pode ser necessário avaliar a memória dos pacientes
infectados após alguns anos.
Com informações da Agência
Brasil, [Imagem: Figueiredo et al. - 10.1038/s41467-019-11866-7]
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