Ministro Ricardo Barros
reforçou que resolução da Anvisa, ao dar exclusividade ao detentor do registro,
contraria Lei de Licitações. Liminar aponta “afronta a concorrência”
O
Ministério da Saúde busca solução para impasse jurídico na compra de
medicamentos para doenças raras. Em sua fase final, o processo para compra dos
medicamentos Soliris, Fabrazyme, Myosyme e Aldurazyme foi paralisado porque a
distribuidora vencedora teve a licença de importação negada pela Agência
Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para entregar produtos registrados
pela própria agência. Uma liminar concedida nesta semana aponta que a medida
contraria a lei de licitações. Durante audiência no Senado Federal nesta
quarta-feira (07/03), o ministro Ricardo Barros ressaltou que a definição de um
único distribuidor configura monopólio e contraria a lei.
“O
que a Anvisa está fazendo é defender um monopólio para que só um representante
possa vender determinado produto com o preço que quer e com a margem que quer.
Não podemos ficar submetidos a único fornecedor que escolhe um representante
exclusivo. Isso não corresponde a lei de licitações 8.666. Os próprios
fornecedores levaram esse debate à justiça e já temos decisão que demonstram
claramente que esse procedimento contraria a Lei”, afirmou Ricardo Barros.
Uma
resolução da diretoria da agência reguladora proíbe distribuidoras que não
tenham aval do laboratório produtor de comercializar seus medicamentos Brasil.
O laboratório, por sua vez, apenas autoriza a entrega por um único distribuidor
indicado por ela. Uma das distribuidoras que venceu um dos quatro processos de
concorrência do Ministério da Saúde, a Global Gestão em Saúde, conseguiu nesta
semana uma liminar do desembargador federal Souza Prudente, do Tribunal Federal
da Primeira Região. O texto aponta que “o condicionamento da importação em
referência à apresentação da referida declaração, que, no caso, somente poderia
ser emitida por empresa concorrente, caracteriza, num exame superficial,
afronta ao princípio de ampla concorrência de que deve ser revestir todo e
qualquer procedimento licitatório”.
O
Ministério da Saúde baseia a aquisição na lei de licitações (8.666/1993),
dentro do sistema de compras emergenciais, que obriga a fazer uma tomada de
preços e adquirir o medicamento da empresa que oferta o menor valor. Assim, a
definição de um único distribuidor configura-se monopólio, gerando a falta de
concorrência e, consequentemente, maior custo para o poder público. Ressalta-se
que a discussão é sobre os mesmos produtos, com registro na Anvisa,
comercializados por distribuidoras diferentes.
Na
semana passada, em audiência na Câmara Federal, o ministro explicou que o mesmo
laboratório pode praticar preços diferentes em diversos países. Uma
distribuidora pode adquirir o produto em locais onde os valores são menores e
oferecê-lo a um custo melhor para o Ministério da Saúde. “Este impasse
jurídico impede que o Ministério da Saúde cumpra as decisões judiciais para o
fornecimento de medicamentos para os pacientes com doenças raras. No dia 19 de
fevereiro, foi feita uma reunião na semana passada com os órgãos de controle,
magistrados e associações mostrando com clareza a questão e pedindo ajuda para
resolver. Recebemos, hoje, novamente os pacientes para buscar uma solução. O
Ministério da Saúde não consegue concluir as compras apenas com uma decisão
administrativa. A judicialização dos contratos de aquisição está atrapalhando a
judicialização da saúde”, explicou.
No
caso da aquisição dos medicamentos Fabrazyme, Myosyme, Aldurazyme a vencedora
do processo de compra, a empresa Global Gestão em Saúde, apresentou um preço
menor do que a distribuidora Sanofi Genzyme, detentora do registro do país. A
economia estimada, em um ano, chega a R$ 400 mil para atender 303 pacientes. Já
na aquisição do medicamento Soliris a empresa Tuttopharma apresentou valor
inferiores ao da Multicarro, detentora do registro no Brasil, totalizando uma
diferença de R$ 4,6 milhões para atendimento de 296 pacientes. As
distribuidoras, agora, entraram na Justiça para garantir o direito de entregar
os medicamentos ao Ministério da Saúde.
NÚCLEO
DE JUDICIALIZAÇÃO
É
importante destacar que não houve interrupção na oferta de medicamentos via
ação judicial. Em 2017, o Ministério da Saúde destinou R$ 1 bilhão para a
compra de produtos judicializados. Instituído em outubro de 2017, o Núcleo de
Judicialização do Ministério da Saúde faz a análise técnica dos processos para
garantir a efetividade do tratamento e dos medicamentos entregues aos
pacientes, bem como verificar se o pedido poderá ser suprido no SUS.
Até
o momento já foi possível identificar divergências entre o laudo médico e o
relatório médico, duplicidade do cumprimento da decisão judicial e as medidas
judiciais de prestação continuada em aproximadamente sete mil processos. Entre
as principais ações do Núcleo está o fortalecimento do atendimento às demandas
judiciais e garantir que a medicação solicitada é mesmo indicada ao paciente e
trará benefícios ao seu tratamento, com, por exemplo, a inclusão de laudo
médico.
Já
em processo de avaliação técnica e contato direto com os pacientes, o Núcleo de
Judicialização já identificou 108 desistências após solicitação de laudo
médico. Atuam no Núcleo 15 advogados, 6 farmacêuticos, 3 médicos, e 5
servidores administrativos.
FISCALIZAÇÃO
No
ano passado, o Ministério da Saúde realizou auditoria no processo de compra do
medicamento Eculizumabe (Soliris). A ação apontou que das 414 pessoas que
possuem decisões judiciais para receber o medicamento em 2017, 28 não foram
localizadas; 5 não residem no endereço informado; 6 recusaram a prestar
informações e 13 já faleceram. Deve ser observado que cerca da metade não
apresentou diagnóstico da doença para a obtenção do medicamento.
Além
disso, a pasta fechou parceria com o Conselho Nacional de Justiça, para
qualificar as decisões judiciais. O Projeto de Apoio Judiciário visa auxiliar juízes
na tomada de decisões com base em evidências científicas nas ações relacionadas
a saúde. Outra ação é a oferta a estados e municípios da plataforma web
S-Codes, sistema que vai permitir traçar o panorama real da judicialização em
todo o país.
No
passado, a União destinou R$ 1,02 bilhão para aquisição de medicamentos e
tratamentos exigidos por demandas judiciais. Nos últimos anos, o Ministério da
Saúde adquiriu aproximadamente 700 itens entre medicamentos e outros insumos
para atendimento a demandas judiciais. No total, há cerca de 11 mil demandas
judiciais em tramitação no Ministério da Saúde.
Do
total gasto, 11 medicamentos correspondem a 92% do valor (R$ 965,2 milhões).
Entre eles estão Soliris (eculizumabe), Vimizim (elosulfase), Translarna
(Atalureno) 1000mg e 250 mg, Juxtapid (lomitapida), Replagal (alfagalsidase),
Cinryze (Inibidor de C1 esterase), Myalept (Metreleptina).
Somando
estados e municípios, o valor chega a R$ 7 bi/ano. Apenas entre 2010 e 2017,
houve um aumento de 1.010% nos gastos da Pasta com este tipo de aquisição. É
importante lembrar que não há valor orçamentário destinado a este tipo de
aquisição. A cada nova demanda judicial é preciso reajustar o orçamento para o
cumprimento.
Por Alexandre Penido,
da Agência Saúde
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