Se a ocorrência do câncer de
próstata tem como principais fatores de risco a idade avançada e questões
genéticas e hereditárias, as formas mais avançadas da doença podem estar
associadas também a outras condições, parte delas relacionadas ao estilo de
vida, ou seja, evitáveis. Esse foi o alerta feito pela epidemiologista
americana Lorelei Mucci no IX Congresso Internacional de Uro-oncologia,
realizado em São Paulo entre quinta-feira e sábado da última semana.
Professora da Escola de Saúde
Pública da Universidade Harvard, ela destacou que cigarro e obesidade estão
entre esses principais fatores. Os programas de rastreamento precoce do câncer
de próstata, diz Lorelei, deveriam ser personalizados segundo o perfil e o
risco de cada paciente em desenvolver formas mais graves da doença. Leia abaixo
os principais trechos da entrevista da cientista ao Estado.
Quais são os principais
fatores de risco para o desenvolvimento do câncer de próstata?
Há consenso de que os homens
mais velhos, os afrodescendentes e os que já tiveram um irmão ou pai com a
doença têm maiores riscos de ter câncer de próstata. Há ainda vários estudos
que mostram que há alguns genes herdados associados à doença. Por fim, homens
mais altos também podem ter maior risco porque, quando garotos crescem, durante
a puberdade, é exatamente quando a próstata está crescendo mais rápido. Há,
portanto, alguns pensamentos de que os hormônios relacionados com uma altura
mais alta podem também ter influência na ocorrência da doença. Esses são os
cinco fatores de risco para o câncer de próstata e, obviamente, nenhum deles
você pode modificar. No entanto, os fatores de risco que parecem estar
associados aos casos avançados de câncer de próstata podem ser modificáveis.
Porque estariam mais ligados
ao estilo de vida?
Sim. Quanto ao tabagismo, por
exemplo, homens fumantes têm duas vezes mais chance de morrer de câncer de
próstata do que homens que nunca fumaram. Quanto à obesidade, se você olhar o
índice de massa corporal (IMC), um homem com sobrepeso tem 30% mais de chance
de morrer da doença. Já os que são muito obesos têm cerca de 60% a 70% mais
chance se comparados com os homens que têm um peso mais saudável.
E quanto aos demais fatores de
risco que estão sendo estudados, como o consumo de alguns alimentos?
Já temos muitos estudos sobre
tabagismo e obesidade. Mas estamos começando a olhar agora para fatores como o
consumo de café e outras questões ligadas à dieta. As evidências são
sugestivas, mas não fortes o suficiente para dizermos que é um fator de risco
provável.
Você apresentou dados que
mostram que a mortalidade por câncer de próstata está caindo em alguns países
da América Latina e aumentando no Brasil? Qual é a sua avaliação?
Uma das razões para isso pode
ser a melhoria dos sistemas de registro e notificação. Outra possibilidade é
verificar se a obesidade está aumentando mais no Brasil e se há bons programas
de rastreamento para diagnóstico precoce.
E qual é a situação dos EUA
comparada à do Brasil?
A incidência nos Estados
Unidos é maior do que a do Brasil, mas as taxas de mortalidade são maiores aqui
do que lá provavelmente porque fazemos mais rastreamento. Mas temos de lembrar
que um dos fatores de risco é a afrodescendência, e há uma taxa maior de
afrodescendentes no Brasil.
O diagnóstico precoce ainda é
afetado pelo preconceito que alguns homens têm em passar pelo exame?
Sim, e nos Estados Unidos isso
também é um desafio. Mesmo com o fato de terem risco maior para a doença,
muitos homens negros ainda são muito relutantes em passar pelos exames de
rastreamento porque o acham muito invasivo.
O que deveria ser alterado no
enfrentamento da doença?
Uma coisa é mudar nossa
abordagem de rastreamento dos homens porque hoje muitos são diagnosticados com
um câncer de próstata que não evoluirá para algo mais grave. Eles, então, fazem
o tratamento e acabam tendo efeitos colaterais na qualidade de vida. Precisamos
aprimorar isso de forma a manter os benefícios de diagnosticar cedo os casos,
mas focando nos homens que realmente têm maior risco de morrer da doença.
Qual seria, então, a melhor
abordagem de rastreamento?
Poderíamos rastrear os homens
mais cedo, por volta dos 40 anos, e considerar o nível de PSA (Antígeno
Prostático Específico, usado para diagnosticar o câncer de próstata) detectado
para guiar as diretrizes futuras de rastreamento para aquele homem, o que
poderia significar repetir os exames todo ano ou em dez anos, por exemplo. Eu
acredito que o rastreamento, de fato, reduz mortalidade mas acho que as
recomendações devem priorizar os homens com maior risco.
Fonte: Estadão
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