Na tentativa de garantir o
sinal verde do plenário, em sessão extraordinária pendente de convocação, ao
projeto de lei que estende ao núcleo da rede pública o modelo de gestão do
Hospital de Base, o governador Ibaneis Rocha (MDB) subiu o tom. O chefe do Palácio
do Buriti disse, ontem, que processará os distritais contrários à ampliação do
formato - que autoriza compras sem licitação e contratações pelo regime
celetista - a cada morte na saúde. A proposição integra um pacote emergencial
encaminhado, aos poucos, pelo governo à Câmara Legislativa (leia Propostas). Os
parlamentares reagiram à investida, a qual classificaram como
"intransigente", "desrespeitosa" e
"antidemocrática".
A declaração do governador
ocorreu após reunião com secretários e administradores regionais e mostrou-se
uma resposta ao posicionamento dos distritais que querem mais tempo para
discutir as propostas. "Em meses, várias pessoas vão morrer. Eles
(deputados) escolhem o que querem. A partir daí, eu vou entrar com uma ação
contra cada um pela morte de cada cidadão. Ou dão os instrumentos para que o
governo consiga fazer, ou vamos ter um enfrentamento grave", disparou o
emedebista.
Ibaneis desafiou os distritais
a rasgarem os planos de saúde e a usarem o serviço público da capital federal.
"Se eles tiverem coragem de fazer isso, eu topo suspender o projeto e
discutir. Eles vão ter de ficar na mesma situação da população que está
sofrendo", afirmou. O governador acrescentou que não fará nomeações até
que os projetos sejam aprovados pela Câmara Legislativa.
Sala de espera lotada no
Hospital Regional de Ceilândia: chefe do Buriti quer responsabilizar os
distritais pelas mortes na Saúde (foto: Marcelo Ferreira/CB/D.A Press - 7/8/18)
Gerência
A proposição do Executivo
local amplia o alcance do serviço social autônomo na capital, implementado na
gestão de Rodrigo Rollemberg (PSB). Àquela época, o debate sobre a proposta
durou três meses. Desde janeiro de 2018, o Instituto Hospital de Base administra
a maior unidade de saúde do Distrito Federal. Conforme o projeto, a entidade
passará a se chamar Organização Hospitalar do DF (OHDF) e, de forma gradativa,
gerenciará os hospitais regionais, as Unidades de Pronto Atendimento (UPAs),
as Unidades de Referência Distrital (URDs) e o Samu. Dessa forma,
ficará responsável pela compra de insumos, pelas contratações e pela manutenção
de materiais desses centros de saúde.
O pacote emergencial em
discussão abrange outros setores. Projetos de lei protocolados no Legislativo
local criam uma gratificação para o trabalho voluntário de servidores da
segurança e adequam o Orçamento de 2019. O governo ainda vai incorporar à lista
a proposta que cria três administrações regionais - Sol Nascente/Pôr do Sol,
Arapoanga e Arniqueiras - e a que prevê a participação popular na escolha dos
administradores. Outra proposição que deve chegar à Casa prevê a negociação de
dívidas contraídas com a Fazenda por pessoas físicas e jurídicas. A mediação
dos débitos, que chegam a R$ 32 bilhões, será realizada pelo Centro Judiciário
de Solução de Conflitos e Cidadania (Cejusc)/Fiscal.
Insatisfação
O tom do governador incomodou
não só a oposição. Para o deputado Leandro Grass (Rede), que se coloca como
independente, a fala de Ibaneis evidencia o toma lá dá cá na nova gestão.
"Na minha visão, é um recado direto para os deputados que têm cargo no
governo. Ele, agora, quer a contrapartida deles", avaliou. Júlia Lucy
(Novo) classificou como "ridícula" e "ofensiva" a declaração
do chefe do Buriti e destacou que é preciso manter a separação dos poderes.
"Ele quer resolver um problema desse tamanho em um dia? Não tem como uma
decisão sem amadurecimento e sem debate ser bem-feita", avaliou.
Integrante da Comissão de
Educação, Saúde e Educação (Cesc), Reginaldo Veras (PDT), que
votou contra a alteração no modelo de gestão do Hospital de Base em 2017,
afirmou que vê o projeto como uma possibilidade de privatização do SUS. "O
Instituto Hospital de Base tem um ano e ainda não há um relatório real e transparente
dos trabalhos. Se não há uma experiência amadurecida, como podemos autorizá-la
para toda a rede? Isso é colocar em risco quem depende do trabalho dele",
declarou o deputado, que classificou o discurso de Ibaneis como
"antidemocrático", "arbitrário" e "infantil".
Opositora ao governo e
integrante da Cesc, Arlete Sampaio (PT) indicou a inviabilidade de votar
projetos polêmicos a toque de caixa. "Os deputados que se submeterem a
essa chantagem estarão rasgando a independência e a autonomia", disse
sobre o comentário do governador. Integrante da base, o deputado Reginaldo
Sardinha (Avante) destacou a necessidade de analisar as propostas com mais
tempo e cuidado. "A gente não pode pegar um resumo de trabalho feito na
transição e, em 20 dias de governo, aprovar na Câmara em uma sessão",
avaliou.
Aval
Mas Ibaneis também conta com
fiéis escudeiros dispostos a aprovar as medidas de forma emergencial. "As
pautas são importantes. Há deputados com preocupações, mas a convocação dos
agentes de segurança para a abertura das delegacias e a ampliação do Instituto
Hospital de Base são salutares para a população", acredita o deputado
Iolando (PSC).
O distrital Valdelino Barcelos
(PP) também defende a convocação extraordinária. De acordo com a assessoria de
Comunicação do parlamentar, ele "aproveitou o prazo útil para ir
pessoalmente ao Instituto Hospital de Base a fim de conhecer de perto o modelo
de gestão e conversar com pacientes e servidores".
O retorno das atividades da
Câmara Legislativa está previsto para 1º de fevereiro, e a primeira sessão,
para o dia 5. Caso a votação ocorra no recesso, as comissões permanentes
analisam as propostas em plenário e não de forma independente, como no rito
normal.
Propostas
O governador Ibaneis Rocha
(MDB) enviou, até agora, três projetos do pacote emergencial à Câmara
Legislativa:
Ampliação do modelo de gestão
do Hospital de Base
O Instituto Hospital de Base
(IHBDF) gerencia a maior unidade hospitalar da capital desde janeiro de 2018. O
projeto prevê que a entidade passe a se chamar Organização Hospitalar do DF
(OHDF) e administre também as Unidades de Pronto Atendimento (UPAs), as
Unidades de Referência Distrital (URDs), os hospitais regionais e o Samu.
Com o formato - serviço social autônomo- , a entidade fica autorizada a
realizar compras sem licitação e contratações pelo regime celetista. A mudança
deve começar pelo Hospital Regional de Santa Maria e pelas UPAs.
Gratificação por serviço
voluntário na Segurança Pública
A proposta institui o serviço
voluntário na Secretaria de Segurança Pública. A indenização será de R$ 50 por
hora, em turno ou escala de trabalho. Conforme o projeto, o quantitativo máximo
mensal de atuação dos profissionais equivale a 16 horas. Por dia, os servidores
podem trabalhar, de forma voluntária, por 8 horas.
Adequação da LOA e da LDO para
a redução de impostos
A proposição ajusta a Lei de
Diretrizes Orçamentárias (LDO) e a Lei Orçamentária Anual (LOA) para que
comportem benefícios fiscais disciplinados em legislações específicas
anteriores. Constam na lista de correções a redução de alíquota para operações
com fumo e seus derivados e isenção para operações internas e
interestaduais, especificamente para venda de maçã e pera.
O que diz a lei
A Lei Orgânica do Distrito
Federal define as regras para convocações extraordinárias da Câmara
Legislativa. O texto estabelece que os pedidos para a reunião de distritais
durante o recesso pode ser apresentado pelo presidente da Câmara, nos casos de
decretação de estado de sítio, de intervenção no Distrito Federal, quando houver
recebimento de autos de prisão de deputado ou para a posse de governador e de
vice-governador. A convocação extraordinária também pode ser feita pela Mesa
Diretora, ou a requerimento de um terço dos deputados distritais, para a
apreciação de ato do governador que importe em crime de responsabilidade. Outra
hipótese legal para a suspensão do recesso é a convocação pelo governador, pelo
presidente da Câmara ou a requerimento da maioria dos distritais, em caso de
urgência ou relevante interesse público. A Lei Orgânica determina ainda que, na
sessão legislativa extraordinária, a Câmara só poderá deliberar sobre a matéria
para a qual tenha sido convocada.
O GLOBO
0 comentários:
Postar um comentário