Decisões judiciais que obrigam o
poder público a fornecer medicamentos e tratamentos não disponíveis na rede
pública de saúde interferem na administração do órgão público, violam a
isonomia entre os pacientes e prejudicam o atendimento coletivo de toda a
população ao privilegiarem casos individuais. Essa é a tese defendida pela
Advocacia-Geral da União em julgamento do Supremo Tribunal Federal que tem
repercussão geral.
Sob relatoria do ministro Marco
Aurélio, a ação envolve recurso do estado do Rio Grande do Norte contra
sentença que o obrigou a fornecer citrato de sildenafila, normalmente utilizado
no tratamento de disfunção erétil, a uma paciente que sofre de miocardiopatia
isquêmica e hipertensão arterial pulmonar.
Na ação movida, a União é parte
interessada (amicus curiae) e, representada pela AGU, argumenta que decisões
como a recorrida acabam criando duas classes de usuários do Sistema Único de
Saúde: os que obtiveram liminar para obter tratamento diferenciado e os que não
obtiveram.
Também alega que tais sentenças
forçam o SUS a realocar recursos financeiros planejados para atender da melhor
forma possível toda a população a fim de privilegiar casos individuais. Segundo
o Ministério da Saúde, desde 2010, houve um aumento de 500% nos gastos com
ações judiciais para aquisição de medicamentos, equipamentos, insumos,
realização de cirurgias e depósitos judiciais.
O valor saltou de R$ 139,6 milhões
naquele ano para R$ 838,4 milhões em 2014. Quantia suficiente para adquirir
mais de 5,8 mil ambulâncias, construir 327 Unidades de Pronto-Atendimento
(UPAs) ou 12 hospitais. Em todo o período, a soma ultrapassa R$ 2,1 bilhões.
O número de ações para obrigar o SUS
a fornecer medicamentos mais que dobrou entre 2010 e 2014, crescendo de 5.967
para 12.932. No total, foram 46,5 mil processos no período. E isso apesar da
lista de medicamentos oferecidos normalmente pelo SUS ter sido ampliada de 550
itens, em 2010, para os atuais 844.
Além disso, segundo a AGU, as
decisões aumentam as chances de o poder público ser obrigado a fornecer
remédios e tratamentos que não têm eficácia comprovada, o que pode representar
desperdício de verba pública e até mesmo colocar em risco a saúde dos
pacientes.
A AGU afirma que esse é justamente o
caso da moradora do Rio Grande do Norte, já que o Ministério da Saúde informou
que nenhum dos estudos realizados pelo órgão comprovou de maneira satisfatória
a eficácia do uso de sildenafila no tratamento das doenças da beneficiada pela
decisão judicial.
Os advogados públicos também alertam
que as decisões podem obrigar o SUS a fornecer remédios mais caros do que
produtos de eficácia igual ou superior, já colocados à disposição dos pacientes
da rede pública após criteriosa análise técnica. De acordo com a AGU, esse
também é o caso da ação que será julgada pelo STF, já que o SUS conta com
diversos medicamentos recomendados para o tratamento das doenças da paciente.
A Advocacia-Geral ressalta, ainda,
que não se trata de questionar o direito à saúde dos pacientes. Segundo a AGU,
as decisões judiciais representam uma ingerência indevida do Poder Judiciário
no Executivo, o que afronta o princípio da separação dos poderes.
Outros dois recursos extraordinários
e uma proposta de súmula vinculante sobre o mesmo tema também estão pautados
para julgamento do tema. Em um deles, um paciente contesta sentença que
entendeu não ser cabível exigir do estado o fornecimento de medicamento sem
registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária.
Em outro, a AGU apresenta embargos
contra decisão que reconheceu ser possível incluir todos os entes federativos
no polo passivo de qualquer ação que solicite remédios ou tratamentos, já que o
poder público federal, estadual e municipal responderiam em conjunto pela rede
de atendimento.Com informações da Assessoria de Imprensa da AGU.
Proposta de Súmula Vinculante 4
Recursos Extraordinários 566.471,
657.718 e 855.178
Revista Consultor Jurídico,
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