Um
estudo publicado na revista científica Memórias do Instituto Oswaldo Cruz mapeia o potencial
de disseminação global do vírus zika e aponta os fatores que mais impactam no
risco de transmissão com precisão para áreas de 25 km². O trabalho mostra que
diversos países reúnem as principais condições para propagação da doença. Na Ásia,
além de Cingapura, onde um surto de zika já alcança cerca de 400 casos,
territórios com grande população, como Tailândia, o sul da China, Índia e
Bangladesh, estão em risco. O mapa não apenas aponta o potencial para a
propagação do zika nessas áreas, mas também identifica os principais motores da
transmissão em todo o mundo.
‘Mapping
the global geographic potential of Zika virus spread’ (Arte: Jefferson
Mendes)
“Uma
vez que o vírus se estabeleceu em Cingapura e todos os elementos que favorecem
a transmissão estão lá, podemos esperar que a doença se espalhe muito
rapidamente para vários países vizinhos, a menos que as autoridades de saúde
locais e internacionais apliquem programas de controle efetivos”, afirma o
líder da pesquisa, Abdallah Samy, pesquisador da Faculdade de Ciências da
Universidade Ain Shams, no Egito, e doutor pelo Instituto de Biodiversidade da
Universidade do Kansas, nos Estados Unidos.
O
mapa levou em conta os principais fatores capazes de afetar a transmissão da
doença, incluindo não apenas a presença de vetores, clima e características
ambientais, mas também aspectos socioeconômicos e de mobilidade. Observando as
regiões onde o vírus se espalhou inicialmente nas Américas e dados como
densidade populacional, temperatura diurna e noturna, cobertura do terreno e
acessibilidade por meios de transporte, os pesquisadores construíram um modelo
matemático que permite prever as áreas com maior risco de transmissão e os
fatores responsáveis por isso. O trabalho contou com colaboração de
pesquisadores das Universidades de Bayreuth e de Georg-August, na Alemanha, e da
Clínica Mayo, nos Estados Unidos.
Considerando
as regiões onde a doença ainda não se espalhou, a pesquisa destaca que partes
da Austrália, Melanésia e Nova Zelândia reúnem todos os principais fatores para
disseminação do agravo. Já nos Estados Unidos, três regiões concentram as
características necessárias para a transmissão sustentada: além da Flórida,
onde casos locais são registrados desde o final de julho, os pesquisadores
apontam que Texas e Louisiana estão em risco. Além disso, em outros estados, pequenas
áreas apresentam risco, principalmente por causa das condições socioeconômicas
e pelo trânsito de viajantes. “Os surtos de zika tendem a ser menos explosivos
nos Estados Unidos do que em outras regiões das Américas. Há melhores programas
de controle de mosquitos no país e muitas casas nas áreas de maior risco
possuem janelas com tela e ar-condicionado”, avalia o pesquisador Townsend
Peterson, do Instituto de Biodiversidade da Universidade do Kansas, nos Estados
Unidos, também autor do trabalho. Ele enfatiza que ações educativas e de
controle do vetor, assim como o monitoramento dos casos importados, são
fundamentais para reduzir o risco nas áreas mais vulneráveis.
O
mapa aponta ainda uma ampla região com alto potencial de propagação da doença
na África subsaariana. No entanto, os pesquisadores destacam que o continente
africano representa um cenário diferenciado no contexto global, tornando as
previsões mais difíceis. Descoberto na floresta de Zika, em Uganda, em 1947, o
vírus zika possui duas linhagens: uma chamada de africana, que circula no
continente desde então, e outra conhecida como asiática, que está por trás dos
atuais surtos nas Américas e na Ásia. “A África tem uma história prévia de
exposição ao zika, e a imunidade da população pode ser um componente importante
para determinar até que ponto o vírus pode se espalhar pelo continente. Essas
questões devem ser integradas no futuro em modelos de previsão ainda mais
complexos para uma melhor compreensão sobre o comportamento do surto nessa
região”, explica Samy.
A
pesquisa mostra também que, na Europa, apesar da alta conectividade com regiões
com transmissão de zika, o que facilita a chegada de viajantes infectados, há
poucos locais com condições ambientais favoráveis para a disseminação da doença
considerando a presença de insetos vetores e aspectos climáticos. Os autores do
trabalho ressaltam que os dados podem ajudar as autoridades a enfrentar o
vírus. “Os resultados permitem identificar as áreas prioritárias para a
vigilância dos vetores e do vírus e os locais onde o risco pode estar
relacionado a outros fatores, especialmente considerando que o zika pode ser
transmitido por outras vias, como a sexual”, afirma Samy.
Maíra
Menezes (IOC/Fiocruz)


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