O
Instituto de Tecnologia em Fármacos (Farmanguinhos/Fiocruz) tem buscado novas
soluções terapêuticas para combater antigos inimigos de saúde pública. O grupo
de Síntese de Fármacos da unidade, coordenado pela farmacêutica Núbia Boechat,
vem trabalhando no desenvolvimento de novas moléculas híbridas, isto é,
contendo mais de um princípio ativo em sua estrutura. Um dos estudos demonstrou
efeitos promissores contra a malária e, recentemente, os resultados foram
publicados na revista científica Bioorganic & Medicinal Chemistry. Devido à
sua importância, o trabalho ganhou a capa desse periódico científico.
Segundo
Núbia Boechat, a Organização Mundial da Saúde (OMS) preconiza o uso de mais de
um fármaco para tratar doenças infectocontagiosas. Porém, tal como ocorre no
tratamento de Aids, a administração de coquetéis dificulta a adesão do paciente
à terapia, já que é preciso tomar muitos comprimidos. “Por isto é que se tem
investido nas formulações denominadas de Dose Fixa Combinada (DFC). Isso
diminui a possibilidade de resistência do parasito aos componentes, uma vez que
o medicamento em DFC age em diferentes mecanismos de ação”, explica a
pesquisadora.
Apesar
de ser considerado um avanço, o desenvolvimento de medicamentos em DFC é
complexo. “É preciso usar dois fármacos numa única formulação, observando-se
sempre a interação medicamentosa, bem como a biodisponibilidade dos componentes
ao mesmo tempo. Em função disso, é também uma tecnologia farmacêutica mais
complicada”, ressalta.
Como
alternativa a essas formulações, Núbia argumenta que o desenvolvimento de
moléculas híbridas, quem vêm sendo criadas pela equipe de Síntese de Fármacos,
é uma evolução tecnológica na indústria farmacêutica. “Em vez de colocar dois
fármacos distintos em um único comprimido, as moléculas já são criadas com os dois
princípios ativos, que vão atuar em mecanismos de ação diferentes, ou seja,
atacar dois alvos dentro do organismo”, esclarece.
Uso
de estatinas
Em
outro trabalho, após uma revisão da literatura científica, o grupo constatou
que a atorvastatina, uma das mais utilizadas estatinas para controlar o
colesterol, tem também a função anti-inflamatória. A pesquisadora revela que a
atorvastatina vem sendo testada como adjuvante no tratamento da malária
cerebral, a forma mais severa da doença, associada a outros medicamentos
antimaláricos.
“A
partir dessa descoberta, criamos moléculas híbridas com atorvastatina e alguns
antimaláricos. O resultado foi fantástico. Publicamos, então, um artigo no
primeiro semestre deste ano, na versão Letters para garantirmos a descoberta.
Agora, estamos nos aprofundando nos estudos dessas moléculas para alcançarmos
mais resultados”, destaca.
Desde
2008, a área vem desenvolvendo várias moléculas híbridas especificamente para o
tratamento de malária. Atualmente, os pesquisadores da Síntese trabalham com
quatro fármacos para malária (artesunato, cloroquina, mefloquina e primaquina),
com os quais são feitas modificações em suas estruturas.
Outro
trabalho também publicado na Bioorganic é Síntese de novos derivados
quinolínicos com potencial atividade contra Plasmodium falciparum. Neste caso,
os pesquisadores de Farmanguinhos criaram moléculas híbridas com os princípios
ativos sulfadoxina e cloroquina. “Os resultados têm sido satisfatórios,
apresentando menos efeitos adversos”, ressalta Núbia Boechat, que coordena o
grupo de pesquisa. As informações foram disponibilizadas, em 2015, na Malária Nexus, que é uma
plataforma de conhecimento online, que capta e disponibiliza a especialistas
todos os melhores trabalhos sobre esta doença negligenciada no mundo.
Núbia
informa que o estudo mais avançado contra a malária é o Mefas, sigla para o sal
híbrido contendo artesunato (AS) e mefloquina (MQ). “A partir do desenvolvimento
do ASMQ (medicamento em dose fixa combinada), nós da Síntese de Fármacos
fizemos uma molécula híbrida com os dois fármacos, que nós chamamos de Mefas.
Atualmente o projeto está na fase de biodisponibilidade, na qual está sendo
avaliada sua farmacocinética. Dependendo do resultado, gostaríamos de fazer os
ensaios clínicos, eliminando as etapas anteriores, uma vez que ele é feito a
partir de duas moléculas que já têm a toxicologia conhecida”, argumenta Núbia.
Segundo ela, o sal híbrido tem produzido menos efeitos adversos do que o
medicamento em DFC.
Alexandre
Matos (Farmanguinhos/Fiocruz)
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