Destaques

sexta-feira, 27 de julho de 2018

Aids 2018: Ativistas brasileiros protestam e dizem que a sustentabilidade da política de aids está sob ameaça. Governo responde que é parceiro da sociedade civil


Aos gritos de “vergonha” e usando nariz de palhaço, ativistas brasileiros chamaram a atenção para a situação da aids no Brasil. O protesto aconteceu na manhã desta quarta-feira (25), na 22ª Conferência Internacional de Aids, em Amsterdã. Segundo os militantes, a sustentabilidade da política brasileira de aids está sob ameaça frequente.

Carregando cartazes e faixas, o grupo caminhou pelo salão dos expositores em direção ao espaço onde a delegação do Ministério da Saúde se instalou.  As faixas diziam: “30% das pessoas trans do Brasil vivem com HIV/aids. Precisamos de uma melhor política de saúde”; “Nos últimos dois anos muitos medicamentos ficaram fora de estoque”; “O Sistema de Saúde Brasileiro está sendo desmontado”; “A sociedade civil precisa de suporte. São 15 mil mortes ao ano em decorrência da aids. Vocês estão ok com isso?”.

Em pé, em frente ao estande brasileiro, dra. Adele Benzaken, diretora do Departamento de IST, Aids e Hepatites Virais, do Ministério da Saúde, recebeu os manifestantes e ouviu atentamente suas reinvindicações.

Representando o movimento de aids brasileiro, o professor Jorge Beloqui, do GIV (Grupo de Incentivo à Vida), cobrou mais empenho do governo nesta luta. Ele pediu a garantia do acesso universal aos medicamentos de cura das hepatites virais.

“Estamos aqui para protestar principalmente contra a falta de estoques de antirretrovirais no Brasil. Esse assunto tem sido uma preocupação em diferentes estados do país. O governo precisa comprar remédios, inclusive os de cura para hepatite C. Com a chegada do genérico sofosbuvir esperamos que mais pessoas tenham acesso ao tratamento por um preço menor”, disse Beloqui.

Os manifestantes distribuíram ao longo da passeata uma declaração pública da Anaids (Articulação Nacional de Aids) apontando falhas na atual conjuntura da política de saúde do Brasil. “A situação é emblemática. Estamos enfrentando grande desinteresse, desinvestimento e desmantelamento do SUS, e, de fato, o processo é reforçado pela atual lei aprovada pelo Congresso Nacional (Emenda Constitucional 95), que congela fundos para saúde e educação nos próximos 20 anos. Os fatos revelam quão grave é a crise na resposta brasileira, antes considerada um exemplo da luta contra o HIV para o mundo”, diz o documento.

“Ao mesmo tempo, em muitos países, inclusive no Brasil, observa-se a intensificação da epidemia, agravada pelo avanço das agendas conservadoras e fundamentalistas, que aprofundam a vulnerabilidade e os estigmas sociais. Consequentemente, a população historicamente marginalizada (LGBTI, mulheres, jovens, comunidades indígenas, migrantes, usuários de drogas, profissionais do sexo, moradores de rua, população carcerária, entre outros) tem seu direito infringido e são vítimas de violação diária”, destaca outro trecho do documento.

Em resposta às reivindicações, dra. Adele explicou que o governo é parceiro da sociedade civil. “Nós esperamos que a sociedade civil possa nos ajudar a lutar para ter produtos genéricos mais baratos e que nos deem sustentabilidade ao Plano de Eliminação da Hepatite C. Como vocês sabem o apoio da sociedade civil é determinante para conseguirmos que o Sofosbovir genérico, para tratamento da hepatite c, se torne uma realidade e esteja disponível para todos.

Recentemente avançamos nas negociações com a indústria farmacêutica e conseguimos economizar 1 bilhão de reais para compra de 50 mil tratamentos. Gostaria apenas de pontuar que nunca houve falta de medicamentos, o que houve foram alguns problemas no processo de importação e produção de alguns medicamentos que acarretaram atrasos na entrega ao Ministério da Saúde, mas que já foram contornados”, disse a gestora, colocando a mão no ombro do ativista Jorge Beloqui, em sinal de apreço e respeito.

Dra. Adele estava acompanhada pelo diretor-adjunto do Departamento, Renato Girade, e por Gil Casimiro, responsável pela articulação com a sociedade civil.

Na sequência, a ativista Alessandra Nilo, da Gestos de Pernambuco, aproximou-se e fez questão de ressaltar que “nos últimos anos nós vimos a cooperação internacional sair do Brasil. Seria importante eles voltarem com apoio porque as ONG precisam ser fortes o suficiente para seguir dando suporte e fazendo o trabalho de advocacy. É uma oportunidade de mostrarmos a nossa preocupação com a saída da cooperação internacional. É importante que o governo brasileiro também considere a volta do apoio para que possamos avançar com a agendas pela igualdade de gênero e direitos humanos. O poder público vem tomando decisões erradas em relação as essas agendas.”

A gestora reiterou: “O Ministério da Saúde tem sido apoiador da sociedade civil, financiamos projetos e também algumas pesquisas pertinentes à sociedade civil. Este chamado continua ativo, com diversos editais de financiamento. Para termos uma sociedade civil ainda mais forte. Então, obrigada a todos, vocês  são bem-vindos. Eu espero continuar trabalhando junto.”

Depois de ouvi-los, a médica se retirou e o grupo seguiu com a manifestação deitando no chão, em frente ao estande brasileiro, e segurando os cartazes para serem lidos.
Durante o protesto, o governo exibiu no estande oficial mensagens informando que “A História do SUS foi, é e será feita pelo diálogo” e “O Ministério da Saúde apoia toda forma de protesto”.

A manifestação durou cerca de 30 minutos e delegações de diferentes partes do mundo pararam para observar a insatisfação dos brasileiros. Por fim, os eles caminharam até o Global Village onde encerraram o protesto.

Aids 2018: Ativistas ocupam estandes de farmacêuticas em protesto contra patentes e preços abusivos
   
Com um megafone em mãos, a ativista sul africana, Nomatter Ndebele, liderou o cortejo pelos estandes das indústrias farmacêuticas expostos na 22ª Conferência Internacional de Aids. A ação aconteceu na tarde dessa quarta-feira (25).

Durante a passeata pela conferência, os manifestantes de diferentes idades e países exclamaram o coro “shame!” (“vergonha”, em inglês), além de canções como a de Michael Jackson que diz “eles não dão a mínima para nós”, chamando a atenção do público e expositores presentes.

O primeiro estande a receber a intervenção foi o da farmacêutica Roche. Sob gritos de “Roche fica rica. Pacientes ficam doentes”, Nomatter e seus companheiros expuseram o salário anual do CEO da companhia: 12 milhões de dólares ao ano. Além disso, apenas no ano passado, a farmacêutica faturou 53,7 bilhões de dólares.

Houve também, um minuto de silêncio para relembrar a luta da ativista Tobeka Daki, que liderou os protestos na última conferência em Durban e, pouco tempo depois, morreu esperando acesso a trastuzumab, medicamento para câncer vendido pela Roche.

A caminhada continuou pelos estandes de outras farmacêuticas. Passaram pela GSK, cuja CEO recebe anualmente 6.8 milhões de dólares, e pela Abbott onde o CEO recebe, também anualmente, um valor de 10 milhões de dólares.

O momento de maior concentração de ativistas foi no estande da Gilead, cujo faturamento do ano de 2015 foi de 16 bilhões de dólares. Seu CEO recebe 15.4 milhões de dólares anuais.

Lá, os manifestantes lançaram confetes e disseram que os medicamentos da produzidos pela empresa “são apenas para gays ricos. Além disso, a PrEP é uma forma de salvar vidas, mas, para a Gilead, é mais uma oportunidade de explorar nossa comunidade.”
 Participação brasileira 

Felipe Fonseca do Grupo de Trabalho e Propriedade Intelectual (GTPI), coordenado pela Abia (Observatório Nacional de Políticas de Aids) interveio durante a fala em frente ao estande da Gilead para alertar sobre a “tentativa de bloqueio do genérico do sofosbovir no Brasil”.

“A farmacêutica está usando seu lobby para bloquear o acesso ao tratamento. Agora, estamos próximos de introduzir o remédio no país e salvar bilhões do orçamento do sistema público de saúde. No entanto, a Gilead continua utilizando diferentes estratégias para destruir tudo isso. Eles estão com medo porque sabem que, há alguns anos, vencemos a favor do tenofovir. Não vamos parar enquanto todas as pessoas tiverem acesso ao tratamento.”

Jéssica Paula (jessica@agenciaaids.com.br)


0 comentários:

Postar um comentário

Calendário Agenda