Mulheres
que vivem com HIV/aids na América Latina e Caribe participam, nesta semana, em
São Paulo, de um encontro que busca construir uma agenda comum de luta pelos
direitos das pessoas que vivem com HIV/aids. Há mais de 20 anos elas atuam no
acolhimento de outras mulheres soropositivas que enfrentam estigma e
discriminação dentro de suas próprias famílias, comunidades, locais de trabalho
e serviços de saúde. “A nossa luta é diária, é pelo acesso ao tratamento e
saúde integral, é contra a violência. Estamos acometidas por um caos na América
Latina. Os problemas de imigração também nos afeta.” Essas foram as palavras da
ativista colombiana Sandra Arturo, coordenadora do Movimento Latino-Americano e
do Caribe de Mulheres Positivas (MLCM+), na abertura do evento, na tarde desse
domingo (7), em São Paulo.
Emocionada,
Sandra aproveitou a cerimônia para homenagear com placas as mulheres que atuam
neste coletivo. “Este é um reconhecimento a sua liderança e entrega à luta
contra a aids”, afirmou Sandra ao presentear a ativista Nair Brito, uma
das fundadoras do Movimento Nacional das Cidadãs Posithivas.
“Que
momento especial, sou grata pelo reconhecimento. Não é possível caminhar
sozinha nesta terra. A nossa resposta é coletiva e cada um sempre tem algo a
contribuir. Eu sou produto de outras mulheres. Lutamos por equidade”, disse
Nair.
Também
receberam a placa as ativistas Jenice Pizão, Jacqueline Rocha Cortes e o
Movimento Nacional das Cidadãs Posithivas. “Há 20 anos, quando cheguei ao
grupo, estava em transição de gênero, mas já era uma mulher de alma e espirito.
Hoje, continuo aqui construindo e lutando com mulheres poderosas e guerreiras”,
disse Jacqueline. “Essa é uma homenagem a todas nós que lutamos. Nair, por
exemplo, deu a própria cara à tapa para que as pessoas vivendo com HIV/aids
tivessem acesso aos medicamentos antirretrovirais”, completou Jenice.
Sandra
também presentou todas as participantes do evento com uma certificação pelo
compromisso delas nesta causa.
Também
estiveram na aberta do evento o representante do Unfpa no Brasil, Jaime Nadal,
e do coordenador do Programa Estadual de DST/Aids de São Paulo, Artur
Kalichman. “A luta das mulheres contra a aids é fundamental e vamos seguir
apoiando essa causa. Hoje, até parece que elas saíram do cenário da epidemia,
principalmente as jovens e as com mais idade”, observou Jaime
Em
São Paulo, de acordo com Artur, os primeiros casos de aids em mulheres foram
registrados entre as usuárias de drogas injetáveis. Hoje, os novos casos estão
ligados a raça/cor e pobreza.
Dados
do Unaids (Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/Aids) mostram que
cerca de 870 mil mulheres se infectam com o HIV todo os anos ao redor do mundo
e só metade delas tem acesso ao tratamento antirretroviral. Isso coloca a aids
como a maior causa de mortes entre mulheres em idade reprodutiva (de 15 a 49
anos) em todo o planeta.
Direitos
sexuais e reprodutivos e violência
Os primeiros
debates do evento foram sobre direitos sexuais e reprodutivos, imigração,
violência e discriminação. Eliminar todas as formas de violência contra as
mulheres e meninas nas esferas públicas e privadas é uma das metas do Objetivo
de Desenvolvimento Sustentável. A tarefa não é fácil, principalmente quando
essas mulheres vivem com HIV/aids.
De
acordo com o Unaids, meninas e mulheres estão no centro da resposta à aids.
Fatores como idade, etnia, desigualdades de gênero, deficiência, orientação
sexual, profissão e posição socioeconômica são determinantes da capacidade que
meninas e mulheres têm de se proteger do HIV.
“Sabemos
que é possível controlar o HIV/aids com medicamentos, mas o remédio não
controla a violência e o machismo que vivenciamos todos os dias. Muitas sofrem
violência quando revelam o diagnóstico positivo e a consequência é depressão e
ansiedade. Por isso, trabalhamos pelo empoderamento da mulher”, explicou a
ativista boliviana Violeta Ross.
Ainda
segundo Hoss, a violência ou o medo da violência são obstáculo para o acesso de
adolescentes e mulheres ao sexo seguro, as ações de prevenção, testagem e
tratamento.
Da
Guatemala, a ativista Iris Lopes afirmou que a xenofobia também contribui para
os novos casos de HIV e que a corrupção está matando muitas pessoas. “Países
latino-americanos já avançaram na luta contra a aids, oferecem medicamentos até
para a prevenção. Mas não podemos nos esquecer que há uma fila imensa de
pessoas vivendo com HIV/aids aguardando o tratamento para sobreviver. No Panamá,
por exemplo, não tem medicamento suficiente. Na Venezuela, muitos estão
morrendo por falta de antirretrovirais. Na Argentina, as pessoas com HIV/aids
estão sendo discriminadas. Não há recursos suficientes e um discurso sem
recurso é demagogia.”
Do
Fundo de População, Caio Oliveira, explicou que as políticas de direitos
sexuais são importantes para compartilhar as experiências vividas pelas
mulheres nos países e identificar desafios.
De
São Paulo, Artur Kalichman falou sobre prevenção combinada e os desafios da
incorporação da PrEP (profilaxia pré-exposição) no SUS (Sistema Único de
Saúde). Para ele, a medicalização não é o caminho para a eliminação da epidemia
de aids. “Não podemos resolver tudo com remédios. Um bom exemplo é a
tuberculose, tem remédio, cura e ela existe até hoje. Não podemos nos esquecer
que a imigração desafia os países a lidarem com a pobreza.”
O
evento segue até a próxima quarta-feira (10) com a construção de uma agenda
comum entre os países latino-americano.
Talita
Martins (talita@agenciaaids.com.br)
0 comentários:
Postar um comentário