A análise do conjunto de
proteínas existente no plasma sanguíneo pode revelar diversos processos
ocorridos no organismo e até mesmo ajudar a diagnosticar algumas doenças.
Esse tipo de estudo é feito
com uma pequena parte do plasma. Isso porque 90% da massa proteica do fluido
corresponde a apenas 14 moléculas. Os 10% restantes são compostos por
milhares de proteínas diferentes, entre elas algumas usadas como marcadores de
processos biológicos.
Antes de realizar uma análise
proteômica, portanto, pesquisadores costumam separar quimicamente as proteínas
mais e menos abundantes do plasma. O processo é conhecido como depleção.
No entanto, pesquisadores da
Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) mostraram que essa separação não é
tão precisa quanto se imaginava e pode deixar proteínas importantes de fora das
análises.
Ao estudar as moléculas mais
abundantes no fluido, normalmente descartadas, os cientistas notaram que
estavam ligadas a outras menos abundantes, que supostamente estariam na parte
do plasma usada nas análises. A pesquisa, https://bv.fapesp.br/pt/auxilios/102687 apoiada
pela FAPESP, mostrou que algumas dessas proteínas normalmente desprezadas
regulam processos biológicos importantes e poderiam servir como marcadores de
doenças.
Os resultados do estudo
foram https://onlinelibrary.wiley.com/doi/full/10.1002/sscp.201900057 publicados
na revista Separation Science Plus
“O primeiro objetivo do
trabalho foi alertar a comunidade científica sobre essa questão. Os
pesquisadores podem estar, literalmente, descartando eventuais biomarcadores, o
que pode ter influenciado os dados obtidos em estudos anteriores. Comprovamos
que algumas das proteínas excluídas das análises até hoje são potenciais
biomarcadores para diversas condições”, disse https://bv.fapesp.br/pt/pesquisador/56072 "
Daniel Martins-de-Souza, professor do Instituto de Biologia (IB) da Unicamp e
coordenador do estudo, à Agência FAPESP.
A investigação foi conduzida
durante o https://bv.fapesp.br/pt/bolsas/180430/ mestrado
de https://bv.fapesp.br/pt/pesquisador/699791 Licia
Carla da Silva Costa, primeira autora do artigo, no âmbito de um projeto
dedicado à busca de biomarcadores para a esquizofrenia por meio de análises
proteômicas (análise do conjunto de proteínas de amostras biológicas).
“Investigar biomarcadores de
doenças mentais é o foco de nosso laboratório. Mas o principal achado deste
estudo é que essa fração de proteínas abundantes não deve ser descartada nesse
tipo de análise”, disse Costa.
De Cambridge a Campinas
O método criado pelos
pesquisadores da Unicamp em parceria com o pesquisador alemão Johann Steiner,
da Universidade de Magdeburg, foi denominado “depletoma”. O nome faz referência
à análise proteômica do material que, até então, era descartado depois da
depleção.
A ideia surgiu durante um
estágio de pós-doutorado realizado por Martins-de-Souza na Universidade de
Cambridge, no Reino Unido, entre os anos de 2010 e 2012.
Análises feitas com as
técnicas disponíveis na época mostraram que havia algumas proteínas menos
abundantes sendo descartadas. O estudo, porém, só foi retomado em 2016, durante
a iniciação científica de Costa.
Nas novas análises, foi
empregada uma técnica de espectrometria de massa de alta definição conhecida
como shotgun proteomics, na qual as proteínas são digeridas em partes menores,
os peptídeos. A partir da identificação dos peptídeos, chega-se às proteínas
das quais eles fazem parte.
Os pesquisadores usaram
amostras de plasma de 20 indivíduos saudáveis. Foram identificados 12.714
peptídeos, correspondentes a 281 proteínas. Em seguida, foram agrupadas
proteínas da mesma família e excluídas as que tinham poucos peptídeos
correspondentes no fluido, restando ao final 198 moléculas.
Ao analisar bancos de dados de
funções proteicas, os pesquisadores encontraram 35 processos biológicos
relacionados às 198 moléculas identificadas. Um dos processos, chamado
endocitose mediada pelo receptor, foi o que teve maior ocorrência, sendo
associado a 19 proteínas.
“É um processo no qual a
célula capta o que está no meio”, explicou Martins-de-Souza. Alterações nessa
via, acrescentou, estão relacionadas ao surgimento de desordens psiquiátricas,
do sistema imune e de alguns tipos de câncer. Os mecanismos da endocitose podem
ainda ser explorados para a entrega personalizada de medicamentos no organismo.
O fato de o depletoma abranger
cerca de 20 proteínas relacionadas a processos imunes pode trazer novos
caminhos de investigação também para doenças metabólicas, neurodegenerativas e
psiquiátricas.
Foram encontrados ainda
marcadores de processos biológicos importantes, como transporte de oxigênio
para as células, vasodilatação e coagulação sanguínea, entre outros.
Os pesquisadores acreditam ser
possível encontrar outras proteínas relevantes além das 198 descritas no
artigo. “O próximo passo da pesquisa é aprimorar o método para obter novos
potenciais biomarcadores”, contou Martins-de-Souza.
O artigo Blood plasma high
abundant protein depletion unintentionally carries over 100 proteins (doi:
10.1002/sscp.201900057), de pode ser lido em: https://onlinelibrary.wiley.com/doi/full/10.1002/sscp.201900057
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