Mesa-redonda
aborda enfrentamento da febre amarela
No
encontro sobre a febre amarela, realizado na Fiocruz em cooperação com a
Secretaria Estadual de Saúde do Rio de Janeiro, na última terça-feira (31/1),
uma mesa redonda abordou diversos aspectos para o enfrentamento do surto atual.
Os
cinco palestrantes aprofundaram temas importantes para auxiliar no trabalho de
pesquisadores, gestores, profissionais de saúde e outros que atuam na contenção
da doença em áreas de risco.
Mesa-redonda tratou do vírus, dos vetores,
dos macacos, da doença e da vacina (foto: Peter Ilicciev)
Vírus
e diagnóstico laboratorial
Chefe
do Laboratório de Flavivírus do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz), Ana Bispo
fez iniciou a nessa com uma abordagem histórica da doença, “a primeira a ser
descrita como transmitida por um vetor, já antes de 1648, quando foi
reconhecida clinicamente na epidemia de Yucatán, no México”. Segundo a
pesquisadora, o vírus e o vetor da febre amarela chegaram ao continente
americano através do tráfico de escravos.
Afirmando
que “o vírus é o mesmo e a doença é uma só”, Bispo explicou que a diferença
entre a febre amarela silvestre (FAS) e a urbana (FAU) “está na localização
geográfica, no tipo de hospedeiro e na espécie vetorial”. Ela reafirmou a
importância do diagnóstico laboratorial para a vigilância: “isso evita o risco
da reurbanização da doença, impede a implantação de epidemias e inclui o
diagnóstico diferencial”. De acordo com ela, este último é importante porque na
fase inicial a febre amarela é difícil de ser distinguida entre a dengue, a
malária e a hepatite. Com base nesses diagnósticos, é possível também
acompanhar a presença da doença ao longo dos meses, mostrando a comprovação de
casos positivos entre o final de 2016 e o início de 2017.
Vetores
da febre amarela
A
pesquisadora titular do Laboratório de Mosquitos Transmissores de Hematozoários
do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz), Goreti Rosa Freitas, apresentou o tema
e informou que existem cerca de 3,5 mil espécies de mosquitos descritos no
mundo, classificados em aproximadamente 50 gêneros. Estão presentes em todo
planeta, “mas preferencialmente em regiões mais quentes”, como a África e a
América Latina, segundo ela. A especialista abordou ainda a morfologia e o
ciclo de vida dos mosquitos: ovos, larva, pupa e adultos machos e fêmeas,
“sendo que só estas sugam sangue para gerar os ovos”.
Goreti
explicou que, no Brasil, a FAS tem como vetores o Haemagogus e o Sabethes e o
hospedeiro é o macaco, “sendo que o homem pode ser um hospedeiro acidental se
estiver presente naquela área”, disse. Na FAU o vetor é o Aedes Aegypti e
o hospedeiro é o homem. A pesquisadora lembrou que na década de 90 o Aedes
havia sido erradicado do Brasil, mas que o sucesso das campanhas paradoxalmente
levou a um relaxamento da vigilância e, em 2002, o mosquito voltou. Para conter
o surto atual e impedir a urbanização, ela indicou medidas de controle, como “o
uso de inseticidas e larvicidas, o uso de telas e repelentes, o controle
genético dos vetores e o controle físico dos criadouros”.
Macacos
e a transmissão da doença
Alcides
Pissinatti, pesquisador do Centro de Primatologia do Rio de Janeiro foi
responsável pela palestra sobre febre amarela em macacos, focando nos
hospedeiros da FAS. Pissinatti salientou que são conhecidas em torno de 800
espécies de primatas, perto de 170 no Brasil, “sendo que temos conhecimento
suficiente sobre o papel de duas ou três apenas na transmissão de doenças”. No
caso da FAS, o Alouatta (ou bugio, guariba) é o mais susceptível nos surtos
epizoóticos (doenças que ocorrem ao mesmo tempo em vários animais de uma mesma
área geográfica).
Pissinatti
colocou em questão se são apenas os macacos que têm um papel na transmissão da
doença, afirmando que “matar macacos não impede a circulação do vírus, pois há
outras espécies que são sub transmissoras”. O pesquisador lançou uma
provocação ao público ao dizer que seres humanos assintomáticos e infectados
com formas leves da febre amarela “são mais perigosos que os macacos”.
A
doença e a vacina
Esta
foi a abordagem da infectologista Juliana Arruda de Matos do Instituto Nacional
de Infectologia Evandro Chagas (INI/Fiocruz). Ela fez questão de frisar
inicialmente que a febre amarela “é uma arbovirose e uma zoonose, uma doença
infecciosa aguda, não contagiosa, que só é transmitida para o homem pelo
vetor”. Em relação ao espectro clínico, a febre amarela causa desde infecções
assintomáticas, até casos graves e fatais, “uma estimativa é que sejam de sete
a doze casos inaparentes para um caso sintomático, o quadro clínico é o mesmo
para a FAS e para a FAU”, afirmou. O período de incubação da doença (sem
sintomas após a picada do mosquito) é de três a seis dias, e é sintomática
entre dez e quinze dias em média. A médica esclareceu que “quem pega a febre
amarela uma vez não pega outra vez, a imunidade é permanente”.
Juliana
explicou que a febre amarela não tem tratamento específico, “assim como na
dengue não devem ser utilizados anti-inflamatórios não hormonais, por risco de
sangramento”. A vacina é composta por vírus atenuados, cultivados em embrião de
galinha, “os alérgicos à proteína da galinha, a ovo não podem utilizar a
vacina”, disse. Nas áreas de risco, ela é indicada a partir dos nove meses de
idade, com reforço aos quatro anos, nas ocasiões de surtos a recomendação é a
partir dos seis meses. Ela advertiu que são necessárias precauções para
administrar ou não a vacina, que devem ser avaliadas segundo o contexto
epidemiológico, “é o caso de portadores de doenças virais graves, gestantes,
mulheres que estão amamentando crianças com menos de seis meses, deve-se evitar
dar a primeira dose em pessoas com mais de 60 anos, além disso, pessoas que
forem vacinadas devem aguardar quatro semanas para doar sangue”.
Coleta
de primatas: manejo de risco no campo
Telma
Abdalla, médica veterinária e pesquisadora da Escola Nacional de Saúde Pública
(Ensp/Fiocruz), falou sobre biossegurança e avaliação de risco na manipulação
de carcaças ou de animais em campo. Para o manejo e descarte, segundo ela, é
preciso saber quais são as doenças que circulam naquele ambiente, quais são as
características da população local, “além disso, o profissional tem que fazer
exames médicos periódicos, manter sua cartela de vacinação em dia e saber quais
são os agentes biológicos envolvidos na atividade e tomar as medidas
profiláticas necessárias”.
A
pesquisadora chamou atenção para o fato de que, no caso do controle do surto
atual, “os macacos podem albergar uma gama enorme de patógenos, muitas vezes
estamos buscando a febre amarela e esbarramos com doenças cujos mecanismos de
transmissão são os mais diversos”. Ela insistiu na importância de se determinar
previamente o tipo de precaução e os equipamentos de proteção necessários,
apresentando ao público exemplos de vestimentas, acessórios e reservatórios
para o acondicionamento e transporte em segurança das amostras a serem
investigadas
Com
informações da AFN, Gustavo de Carvalho (Agência Fiocruz de Notícias)
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