Após sair parcialmente
derrotada na esfera administrativa, a Johnson & Johnson obteve uma vitória
nas vias judiciais: o Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3), em
caráter liminar, entendeu que não houve fraude ou dolo em uma operação considerada
irregular pelo Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) no
começo do ano.
A decisão da 4ª Vara Cível Federal de São Paulo,
proferida no dia 18 de junho, permite à contribuinte debater a questão sem a
exigibilidade do crédito. Na prática isso significa que a Johnson & Johnson
não pode ser impedida de receber a certidão de regularidade fiscal ou ser
inserida nos cadastros de dívida ativa enquanto o Judiciário analisa o mérito
da questão. O valor em jogo, segundo fontes ligadas ao caso durante sua
tramitação no Carf, poderia passar de R$ 800 milhões.
Na
liminar, a juíza federal substituta Tatiana Pattaro Pereira explicou que “não
houve demonstração pelo Fisco de fraude ou simulação” por parte da Johnson
& Johnson. Ao analisar os argumentos da contribuinte, que alega haver
propósito negocial na operação, a decisão da magistrada acaba chegando a
conclusões divergentes do acórdão do Carf sobre o assunto, de janeiro desse ano.
“A
legislação fiscal aplicável à época do fato gerador não vedava, sob qualquer
aspecto, o reconhecimento, registro, amortização e dedução do ágio pelo simples
fato de as operações terem sido realizadas entre partes relacionadas”
Tatiana
Pattaro Pereira, Juíza Federal Substituta da 4ª Vara Cível Federal de São Paulo
“O
Fisco não pode desconsiderar os negócios jurídicos da forma em que realizados,
pela simples suposta falta de propósito negocial. Se não houver fraude ou
simulação nas operações realizadas, estas serão válidas, ainda que tenham o
propósito único de economizar tributos”, afirmou a juíza na decisão liminar.
O
escritório que defendeu a ação no Carf também foi responsável pela apelação à
Justiça. Segundo um advogado que acompanha o caso desde a esfera
administrativa, a alegação de fraude, que motivou a multa de 150% do imposto
devido, caiu na própria esfera administrativa e não é mais controversa, com a
tese apontando para nenhum tipo de abuso por parte da Johnson. Segundo o
tributarista, o despacho não autorizaria o Fisco a falar que o ágio interno
seria artificial.
Ainda
no texto da liminar, Tatiana lembrou que a necessidade de propósito negocial
entre as partes, essencial para a amortização de valores de ágio, tem
fundamento em leis posteriores aos fatos – no caso, a Lei nº 12.973/2014.
“Importa
ressaltar que a legislação fiscal aplicável à época do fato gerador não vedava,
sob qualquer aspecto, o reconhecimento, registro, amortização e dedução do ágio
pelo simples fato de as operações terem sido realizadas entre partes
relacionadas, o que veio a ocorrer somente partir de 1º de janeiro de 2015, com
a vigência da Lei nº 12.973/2014”, salientou a juíza.
Outros
advogados que analisaram o caso entendem que a decisão abre um precedente para
casos de ágio que começam a alcançar o Judiciário.
“Embora
se trate de decisão precária, passível de revisão pelo TRF-3, apresenta-se como
importante referencial e talvez inédito sobre o tema, já que o Fisco Federal
têm, reiteradamente, desconsiderado negócios jurídicos licitamente entabulados
por contribuintes”, pontuou o sócio da Hosang Advocacia Tributária, Wernerson
Hosang. O tributarista lembrou que a liminar sinaliza “a inaplicabilidade
automática dos poderes conferidos pelo art. 116 do CTN à Autoridade Fiscal, sem que antes
haja regulamentação por lei ordinária federal e à mingua da comprovação cabal
do cometimento de fraude nas operações”.
O
sócio do FNGV Advogados, Paulo Vital Olivo, ressaltou a importância da
instância judicial na ação sobre o ágio, tema considerado sensível. “Esses
processos obrigarão o Poder Judiciário a se posicionar a respeito de um tema
fundamental em planejamentos tributários mas que por enquanto vem sendo
discutido apenas no âmbito do Carf, que é a existência de propósito negocial em
operações que geram algum benefício ou reflexo fiscal positivo para os
contribuintes”.
“A
tendência é que o Poder Judiciário passe a receber mais processos relacionados
ao tema, pois a maioria dos contribuintes têm perdido a disputa no âmbito do
Carf”, concluiu o tributarista.
Haveria,
segundo advogados ouvidos pelo JOTA, ao menos cinco casos relevantes com o mesmo tema
tramitando nos Tribunais Federais da 3ª (TRF-3) e da 4ª Região (TRF-4).
Entenda
o caso
Em
um processo bastante comentado e comemorado como uma inédita vitória dos
contribuintes à época, a turma reverteu uma multa qualificada, de 150%, sobre
ágio interno. Em sua sustentação oral, a contribuinte defendeu que o ágio,
fruto de uma reorganização interna das empresas do grupo no Brasil que durou
três anos, ocorreu com o suporte de laudos de avaliação e de forma idônea e
transparente.
Conselheiros
envolvidos no caso afirmaram que decisão é um dos raros casos de ágio julgado
favoravelmente ao contribuinte após a Operação Zelotes.
A
relatora foi a então conselheira Daniele Souto Rodrigues Amado, representantes
dos contribuintes. Danielle entendeu que os paradigmas apresentados pela PGFN
tratavam de casos que partiam da existência de simulação em operações, o que
não existia no caso da Johnson. Por seis votos a dois a cobrança principal foi
mantida, mas por cinco votos a três a qualificação da multa imposta contra a
empresa foi afastada.
Processo
citado na matéria: 16561.720172/2012-20
GUILHERME
MENDES – Repórter de Tributário do JOTA
Cédulas
de dinheiro. Crédito Marcos Santos/USP Imagens
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