Carlos Gadelha, José Gomes Temporão, Gastão Wagner de Sousa Campos, Francisco Funcia e Rosana Onocko-Campos*
Volta e meia, ideólogos do
neoliberalismo requentam a vilanização do gasto público em saúde. Entre
argumentos que vão de uma mítica e inata eficiência empresarial a cenários de
um crescimento exponencial dos gastos e que não questionam as causas das mudanças
do perfil sócio-epidemiológico do Brasil, o objetivo é sempre o mesmo: repetir
que o SUS, nosso Sistema Único de Saúde, é ineficiente e que o gasto público
tem de ser domado e drenado pelo setor privado.
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Num ano crucial para o país,
nossa preocupação precisa ser o futuro do acesso do povo brasileiro à saúde.
Fruto de um trabalho de articulação entre entidades, movimentos sociais e
lideranças, trazemos ao debate diretrizes e propostas em que o investimento
público é tomado como centro do desenvolvimento e da geração de riqueza, o que
exige um SUS forte e eficiente.
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A Associação Brasileira de
Saúde Coletiva (Abrasco) e a Associação Brasileira de Economia da Saúde (Abres)
criaram um grupo de trabalho para propor uma nova política de financiamento do
SUS. Trata-se de uma iniciativa elaborada no contexto do processo de
desfinanciamento federal em curso desde a vigência da Emenda Constitucional
(EC) 95. Ao impor um teto de gastos e congelar o piso federal do SUS nos
valores de 2017 por 20 anos, a EC não apenas retirou recursos, mas sabotou o
setor no seu potencial gerador de emprego e renda e de alavanca do crescimento
e desenvolvimento econômico.
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Propomos que 60% do gasto
total em saúde no Brasil seja realizado pelo setor público, como na maioria dos
países desenvolvidos, bem como que se aumente a proporção do gasto público
federal, revertendo a redução de 60% para um pouco mais de 40% no intervalo de
20 anos. Para isso, são necessárias uma nova regra de cálculo do piso federal
do SUS e diretrizes para estabelecer novas fontes de financiamento da
Seguridade Social. Não ofereceremos saúde digna à população sem romper com a EC
95 e, consequentemente, com toda uma política econômica baseada na austeridade
fiscal.
A saúde deve estar no centro
da política de desenvolvimento, elevando o investimento público nos próximos
dez anos para assegurar o acesso universal, a equidade e a integralidade,
gerando emprego e renda, tornando o SUS sustentável e soberano. O bem-estar
social e a garantia do direito à saúde não apenas “cabem” no Orçamento, como
aumentam o Produto Interno Bruto e a arrecadação, contribuindo para o
financiamento das políticas públicas em geral.
Nessa perspectiva, pretendemos
complementar o debate sobre a ampliação do financiamento federal do SUS
apresentando algumas diretrizes para a destinação desses recursos:
— universalizar a atenção
primária à saúde;
— assegurar o cuidado integral
e reformular o funcionamento em rede, delegando poder às Regiões de Saúde;
— integrar os sistemas de
regulação de acesso à média e à alta complexidade ao grupo gestor da Região de
Saúde;
— estabelecer uma política e
gestão nacional e integrada do pessoal de saúde;
— reduzir o clientelismo, a
fragmentação e os compadrios;
— investir em ciência e
tecnologia e melhorar os sistemas de vigilância e de informação em saúde
pública;
— Priorizar e ampliar os
investimentos na base produtiva e tecnológica da saúde e reduzir a
vulnerabilidade externa do SUS como uma das formas de fortalecer a soberania
nacional.
*Carlos Gadelha é coordenador do Centro de Estudos Estratégicos da Fiocruz, José Gomes Temporão, médico, foi ministro da Saúde, Gastão Wagner de Sousa Campos, professor da Unicamp, foi presidente da Abrasco, Francisco Funcia é vice-presidente da Abres, Rosana Onocko-Campos é presidente da Abrasco.
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