(foto: Heitor Shimizu)
Especialistas apresentam experiências bem-sucedidas de cooperação entre universidades e empresas e mecanismos para ampliar as colaborações em pesquisa
Uma mesa-redonda sobre experiências, desafios e
mecanismos para estimular as cooperações entre empresas e universidades abriu o
último dia da FAPESP Week Buenos Aires,
na sexta-feira (09/04), na capital argentina.
Hugo Fragnito, professor no Instituto de Física
da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e membro da Coordenação da Área
de Física da FAPESP, falou sobre um caso de sucesso na relação
universidade-empresa no Brasil, que levou ao desenvolvimento das comunicações
ópticas no país.
“Campinas é chamada hoje de ‘Vale do Silício
brasileiro’ por ter um importante parque tecnológico que teve origem com a
fundação da Unicamp, em 1966. Seis anos depois, três pesquisadores que estavam
nos Bell Laboratories, nos Estados Unidos, chegaram à Unicamp com um plano
visionário. Eram Sérgio Porto, José Ripper Filho e Rogério Cerqueira Leite”,
contou Fragnito.
Segundo ele, o plano tomou forma no ano
seguinte, com a apresentação de uma proposta para a Telebrás – que então detinha
o monopólio das comunicações no Brasil – do Programa para o Desenvolvimento de
Comunicações Ópticas.
O plano reunia projetos para o desenvolvimento e
a fabricação de fibras ópticas, de lasers semicondutores e de dispositivos
ópticos integrados, peças necessárias para a comunicação óptica.
O programa foi aprovado em 1974 e teve início no
ano seguinte. “Foi o primeiro contrato de pesquisa e desenvolvimento entre a
indústria e a universidade no Brasil”, contou Fragnito.
Esse programa, que resultou na primeira
fabricação de fibras ópticas no hemisfério Sul, em 1983, representa, segundo
Fragnito, um exemplo notável de sucesso da relação entre empresa, centros de
pesquisas e universidades.
“O modelo que adotamos é simples e linear, mas
muito eficiente. A universidade fornece profissionais bem treinados e boas
ideias. Um centro de pesquisa próximo à universidade entra com tecnologias que
podem ser utilizadas, bem como padrões e manuais de uso. E a indústria faz o
desenvolvimento final, como a miniaturização dos componentes ou a otimização
dos processos de produção”, disse.
“O ponto principal desse modelo está na
transferência do conhecimento. E essa transferência não envolve apenas a
tecnologia, mas os próprios pesquisadores, que são contratados por quem está recebendo
o conhecimento”, disse Fragnito.
Financiamento de pesquisas
Sérgio Robles Reis de Queiroz, professor no
Departamento de Política Científica e Tecnológica do Instituto de Geociências
da Unicamp, outro participante da mesa-redonda, falou sobre desafios e
oportunidades na pesquisa colaborativa universidade-empresa.
“Temos observado, nos últimos anos, uma
intensificação das relações entre universidades e empresas. As universidades
têm, por exemplo, implantado núcleos de inovação tecnológica, as agências de
inovação voltadas para promover as atividades de cooperação”, disse
“Há 15 ou 20 anos, havia uma expectativa não
realista a respeito do que a universidade poderia oferecer para a empresa. Mas
hoje vemos um quadro de evolução contínua dessa interação. Há uma percepção
maior das diferenças do que cada um pode ou não pode oferecer”, disse
Queiroz lembrou alguns exemplos de instituições
brasileiras com boa interação com o setor produtivo em diversas áreas, como os
institutos Butantan e Oswaldo Cruz (em saúde), o IAC e a Embrapa (ciências
agrárias), a Universidade Federal de Minas Gerais (mineração e metalurgia), CTA
e ITA (engenharia aeronáutica) e Coppe-UFRJ e Unicamp (geociências, óleo e
gás).
Em seguida, ressaltou que os valores investidos
por empresas na pesquisa realizada nas três universidades públicas no Estado de
São Paulo (Unicamp, Unesp e USP) equivalem à média verificada nas universidades
dos Estados Unidos.
“Mas há muito a ser feito. Um dos desafios é
ampliar o número e a diversidade de casos bem-sucedidos de interação
universidade-indústria”, disse Queiroz, membro da Coordenação Adjunta -
Pesquisa para Inovação da FAPESP.
Em seguida, falou sobre mecanismos existentes no
Estado de São Paulo para o desenvolvimento de pesquisas colaborativas oferecidos
pela FAPESP. Destacou principalmente os programas PIPE, PITE e Centro de
Pesquisa em Engenharia.
“O PIPE apoia pesquisas em pequenas empresas,
com até 250 funcionários. O PITE é voltado exatamente para promover a pesquisa
colaborativa entre instituições do Estado de São Paulo e empresas. As empresas
podem ser de qualquer lugar, desde que a pesquisa seja feita em São Paulo”,
disse.
“Em 2006, foi implementada uma nova modalidade
de PITE, em que a FAPESP e a empresa parceira estabelecem um acordo de cooperação
para lançar chamadas conjuntas e financiar projetos de pesquisa. Isso já foi
feito com companhias como Embraer, Natura, Oxiteno, Microsoft Research, PadTec,
Braskem, Sabesp, Vale, ETH, Agilent, Biolab e GSK”, disse.
“Os Centros de Pesquisa em Engenharia têm um
formato semelhante, mas são voltados para desafios maiores que envolvem
pesquisas de longo prazo, com até 10 anos de duração. A ideia é criar centros
de excelência em áreas de interesse das empresas parceiras”, disse Queiroz.
“Os primeiros Centros de Pesquisa em Engenharia
estão sendo estabelecidos com as empresas Peugeot-Citroën, Natura, BG e dois
centros com a GSK”, disse.
“Esses mecanismos de apoio oferecidos pela
FAPESP são fundamentais para o desenvolvimento do Estado de São Paulo e do
Brasil, mas não são suficientes. O grande desafio para incrementar a relação
universidade-empresa está associado ao baixo nível de investimento em pesquisa
e desenvolvimento das empresas no Brasil”, disse.
“Este é um gargalo fundamental, pois, à medida
que as empresas se engajam mais em atividades de pesquisa internas, elas também
se engajam mais em atividades de pesquisa externas, colaborativas, com
universidades e outros parceiros”, disse.
Exemplos argentinos
Jose Alberto Bandoni, professor do Departamento
de Engenharia Química da Universidad Nacional del Sur (UNS), falou sobre a
Planta Piloto de Ingeniería Química (Plapiqui), do qual é membro do Conselho
Diretor.
Com sede na cidade argentina de Bahía Blanca, o
Plapiqui é um instituto de pesquisa, educação e desenvolvimento de tecnologia,
ligado à UNS e ao Consejo Nacional de Investigaciones Científicas y Técnicas
(Conicet).
“Plapiqui é um centro consolidado de geração de
conhecimento, de transferência de tecnologia e de formação de recursos humanos.
Conta com cerca de 180 integrantes, entre pesquisadores, professores,
bolsistas, técnicos e pessoal administrativo”, disse Bandoni.
“Desde a sua fundação, em 1963, o instituto
produziu mais de 1,2 mil trabalhos científicos e realizou mais de 500 projetos
de desenvolvimento para empresas argentinas e de outros países”, disse.
Segundo Bandoni, o Plapiqui se especializou em
resolver projetos não convencionais, que envolvem a geração e o desenvolvimento
de conhecimentos e tecnologias, especialmente para as indústrias química,
petroquímica, agrícola, alimentar e farmacêutica.
Outro participante da mesa-redonda na FAPESP
Week, Carlos Ruiz, falou sobre a Soteica Visual Mesa, do qual é diretor. “A
empresa foi fundada em 1984 em Buenos Aires para fornecer soluções em processos
em engenharia para a indústria”, disse.
A empresa tem sede nos Estados Unidos e
escritórios em Houston, Barcelona, Cidade do México, Buenos Aires, Santa Fé,
Rosário e São Paulo.
O forte da Soteica está na produção de softwares
para uso industrial. O quadro de desenvolvimento da empresa é composto
principalmente por engenheiros, dos quais 44% têm doutorado ou mestrado.
“Esse material humano é todo formado em
universidades, principalmente em instituições com as quais mantemos excelentes
relações”, disse. As universidades que mais contribuem com engenheiros para a
Soteica são a Universidad Nacional del Litoral e a Universidad Tecnológica
Nacional, da Argentina.
A mesa-redonda foi coordenada por Aldo
Vecchietti, professor da Universidad Tecnológica Nacional da Argentina.
Apresentações feitas na FAPESP Week Buenos Aires
e mais informações sobre o simpósio estão em:www.fapesp.br/week2015/buenosaires.
Heitor Shimizu, de Buenos Aires | Agência FAPESP
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