Ministro da Saúde propõe
consórcio para construção; MP junto ao TCU questiona
O Ministério Público junto ao
Tribunal de Contas da União (TCU) vai avaliar uma negociação em curso no
governo que prevê a construção de uma fábrica de hemoderivados em Maringá (PR),
reduto eleitoral do ministro da Saúde, Ricardo Barros. Pela proposta, um
consórcio seria formado entre os laboratórios públicos estaduais Butantã (SP),
Tecpar (PR), a estatal do sangue Empresa Brasileira de Hemoderivados e
Biotecnologia (Hemobrás) e a empresa suíça Octapharma.
Unidas, as fábricas
abasteceriam o mercado de produtos derivados de sangue do País. Numa segunda
etapa, forneceriam para a América Latina. Barros negocia pessoalmente o acordo
que, assegura, “resolveria o problema do sangue no Brasil”.
A proposta, no entanto,
preocupa o Ministério Público e o TCU. Um pedido formal de esclarecimentos foi
encaminhado. “É preciso que ele apresente as justificativas legais, técnicas e
sobretudo, quais as vantagens econômicas de um acordo como esse”, disse o
procurador junto ao TCU, Marinus Marsico.
Uma das principais questões é
a inclusão da Octapharma. Citada na Operação Máfia dos Vampiros – desencadeada
em 2014 para investigar um grupo de laboratórios que combinavam tarifas para
fraudar licitações de derivados de sangue –, a empresa suíça foi condenada no
ano passado pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) por
formação de cartel. A companhia também está envolvida em acusações de corrupção
em Portugal, igualmente envolvendo o mercado de hemoderivados.
Para Barros, as acusações não
vêm ao caso: “O governo brasileiro também tem. A Hemobrás também tem. Todos têm
problema no currículo e nem por isso a gente vai deixar de resolver o problema
do sangue no Brasil”.
Pela proposta, a Octapharma
faria um investimento de US$ 500 milhões para produção de hemoderivados no
País. Os recursos seriam suficientes para adaptar e finalizar as obras no
Instituto Butantã e na Hemobrás na área de sangue, além de construir uma
fábrica na Tecpar. Hoje, o instituto do Paraná não apresenta atividades ou
estruturas na área de sangue.
Em troca, o laboratório suíço
– e o consórcio – teria o monopólio do comércio de hemoderivados até a
transferência da tecnologia. A empresa fala num empreendimento de 25 anos. O
Brasil não entraria com recursos.
Obstáculo. O maior
empecilho gira em torno da divisão de papéis no consórcio. Estão em jogo a
produção de hemoderivados com o fracionamento do plasma e hemoderivados
sintéticos, feitos a partir de tecnologia recombinante. No grupo dos
plasmáticos estão a albumina, a imunoglobulina, os fatores VIII e IX. A
biotecnologia é usada para preparar o fator VIII – mais moderno e 11 vezes mais
caro do que o seu “parente” plasmático.
Pela proposta de Barros, a
Tecpar produziria o fator VIII recombinante; Butantã e Hemobrás, os demais
produtos. O laboratório paulista e a empresa pública, porém, já deixaram claro
que não querem ficar fora do mercado de recombinante, mais moderno e mais
rentável.
O consórcio foi proposto pela
Tecpar, que tentou por duas vezes entrar na área, sem sucesso. A fábrica seria
construída do chão, e o terreno, em Maringá – terra do ministro da Saúde – foi
doado pela prefeitura. Questionado sobre eventuais privilégios à Tecpar, Barros
mostrou-se irritado: “Desenvolvi a ideia baseada numa proposta que a Tecpar
transmitiu. Todos serão sócios. É tudo o mesmo dono”.
Lígia Formenti / BRASÍLIA,
Foto: Alexandre Gondim|JC Imagem O Estado de S. Paulo
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