Uma análise dos pesquisadores do Instituto de Comunicação e Informação em Saúde da Fundação Oswaldo Cruz (Icict/Fiocruz) aponta para o risco de se adotar políticas de flexibilização do isolamento social nas grandes metrópoles, enquanto aumenta a interiorização da epidemia de Sars-CoV-2, o vírus causador da doença Covid-19. Tomando o caso do estado de Pernambuco como exemplo, a análise mostra que a epidemia está crescendo nos municípios que são mais dependentes do sistema de saúde dos grandes centros urbanos, que correm o risco de logo ficarem novamente saturados por pacientes das cidades menores, e mais uma vez perto de seu limite de atendimento.
A Nota Técnica do sistema MonitoraCovid-19 — A epidemia e
os tempos epidêmicos é apoiada em uma nova metodologia de
monitoramento da epidemia, que mostra a semana de maior concentração de casos
(“pico”), o que permite identificar e comparar tendências entre estados e
municípios. Nenhum estado apresenta até o momento sinais de redução da
transmissão de Covid-19, permanecendo com um alto número de casos e óbitos,
mesmo depois de passada a semana de máximo número de casos. Essa tendência pode
configurar um patamar alto de transmissão (“platô”), que pode se prolongar
indefinidamente.
No estado de Pernambuco, a
Região Metropolitana de Recife (Abreu e Lima, Camaragibe, Cabo de São
Agostinho, Jaboatão de Guararapes, Olinda, Paulista, São Lourenço da Mata,
Moreno), além de cidades populosas do interior, como Garanhuns e Vitória do
Santo Antão (ambas com mais de 130 mil habitantes), atingiram seu pico de casos
de infecção na semana epidemiológica 21, que vai de 17 a 23 de maio. Em
consequência, logo em seguida as medidas de isolamento social começaram a ser
reduzidas na Região Metropolitana de Recife. Porém, nas três semanas seguintes
as cidades do interior continuaram a ter crescimento de casos, notadamente
Caruaru e Petrolina, respectivamente quarta e quinta cidades mais populosas de
Pernambuco, com cerca de 350 mil habitantes cada, que só atingiram seu pico 21
dias depois da Grande Recife, na semana epidemiológica 24 (de 7 a 13 de junho).
Além disso, grande número de cidades menores só alcançou o pico de casos nas
semanas epidemiológicas 22 (24 a 30/5), 23 (31/5 a 6/6) e 24. “O que acontece
na região metropolitana se repete no interior com duas ou três semanas de
atraso. Por isso é importante manter as medidas de isolamento, mesmo depois de
passado o “pico” nas capitais”, afirma o epidemiologista Diego Xavier, do
Icict/Fiocruz.
“As medidas de relaxamento do
isolamento social nas cidades maiores e nas capitais, sobretudo quando essas
cidades apresentam comportamento ascendente das curvas de óbitos, representam
um risco para o agravamento do impacto da epidemia, tanto devido ao aumento da
possibilidade de difusão de casos para cidades do interior, quanto pela sobrecarga
dos serviços de saúde que isso pode provocar nas capitais e cidades de maior
porte. Um aumento mesmo que pequeno dos casos graves nas grandes cidades e nas
capitais, somado ao aumento da demanda dos municípios do interior, configura um
cenário delicado e que pode, em última análise, ocasionar o colapso no
atendimento de saúde”, destaca a cartógrafa Mônica Magalhães, também
participante do projeto.
Outro ponto importante
ressaltado pelo estudo pode ter facilitado a chegada rápida da epidemia no interior:
“Pernambuco estabeleceu, no início da epidemia, medidas de restrição de tráfego
na Região Metropolitana de Recife. No entanto, foram descartados bloqueios nas
estradas para o interior, o que pode ter contribuído para a aceleração da
interiorização da epidemia do estado”.
A Nota Técnica do MonitoraCovid-19 faz ainda um alerta: “A diminuição dos atendimentos de casos graves e, consequentemente, o aumento da disponibilidade de leitos de UTI é um dos critérios que devem ser considerados para se adotar medidas de relaxamento, mas não o único. O comportamento das curvas de casos e óbitos, o ritmo e a tendência do contágio, além de expansão da capacidade de testagem para identificar casos e isolar e rastrear os contatos devem ser considerados como alicerces para a retomada das atividades econômicas”.
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