Vinicius Ferreira (IOC/Fiocruz)
Pesquisadores da Fiocruz, em parceria com a Prefeitura de Niterói (RJ), permanecem acompanhando a disseminação do novo coronavírus (SARS-CoV-2) na cidade por meio de um inovador projeto de vigilância ambiental do patógeno, que consiste na coleta e análise de amostras da rede coletora de esgotos do município. As coletas foram iniciadas em 15 de abril e são realizadas semanalmente. Atualmente, a média de amostras positivas para o novo coronavírus é de 85%. Este índice se refere às 11 semanas de coletas com resultados disponíveis (entre 15 de abril e 23 de junho). A pesquisa tem duração prevista de 12 meses. Os resultados preliminares da pesquisa foram divulgados durante evento promovido pela The International Water Association e podem ser conferidos no painel de georreferenciamento desenvolvido pelo Sistema de Gestão da Geoinformação da Prefeitura de Niterói. Os resultados detalhados serão publicados em artigo científico.
As análises são realizadas pelo Laboratório de Virologia Ambiental e Comparada do IOC/Fiocruz (Foto: Josué Damacena)
“Desde
as análises da primeira rodada de coletas, ainda em abril, cujos resultados
foram positivos em 5 das 12 amostras, já podíamos imaginar que este projeto
evidenciaria a eficácia da metodologia no monitoramento da disseminação do
vírus. Ao longo dos meses foi demonstrado um aumento de detecção do genoma do
novo coronavírus, atingindo 94% de detecção nas amostras coletadas nas quatro
primeiras semanas de junho, por exemplo”, explica a pesquisadora Marize Pereira
Miagostovich, chefe do Laboratório de Virologia Comparada e Ambiental do
IOC/Fiocruz e responsável pela pesquisa.
Já
foram coletadas amostras de esgoto bruto em 29 pontos georreferenciados e
estrategicamente distribuídos pela cidade de Niterói, incluindo quatro estações
de tratamento de esgotos (ETEs), dois pontos de descarte de efluente hospitalar
e rede coletora de esgotos, nos bairros de Icaraí, Jurujuba, Itaipu, Engenhoca,
Ititioca, Barreto, Várzea das Moças e Rio do Ouro. Também foram coletadas
amostras de pontos das comunidades do Palácio, Cavalão, Preventório, Vila
Ipiranga, Caramujo, Maceió, Cascarejo, Morro do Estado e Boa Esperança.
O
secretário municipal de Meio Ambiente de Niterói, Eurico Toledo, destaca a
importância desta parceria nas ações de combate ao avanço do novo coronavírus
na cidade. “Trata-se de um projeto pioneiro onde se demonstra a imperiosa
necessidade da conexão da ciência e do poder público, tendo a ciência norteando
as ações de políticas públicas para o enfrentamento da Covid-19”, diz Eurico.
A
subsecretária de Saúde de Niterói, Camilla Franco, conta que os dados da
pesquisa são complementares para análise do quadro epidemiológico do município.
"Essa pesquisa tem possibilitado um outro olhar para análise da
transmissão e compreensão de como o vírus está circulando. Os pontos de coleta
foram eleitos também priorizando lugares de maior vulnerabilidade, como as
comunidades. Desta forma, há possibilidade de indicar se há vírus presente e o
quanto ele está presente entre uma coleta e outra. Desta forma, identificamos
regiões com casos, o que possibilita ação pontual da atenção básica no
território. Conseguimos também com a pesquisa novas variáveis de um conjunto de
indicadores de acompanhamento que já temos, para fazer o rastreamento do
território", afirma a subsecretária. “Vale destacar que a inclusão de
áreas vulneráveis no monitoramento permitiu rastrear casos precoces da doença
em determinadas comunidades e que os dados contribuíram para tomadas de
decisões da Secretaria de Saúde na região”, frisa a pesquisadora da Fiocruz.
As
análises são lideradas pelo Laboratório de Virologia Comparada e Ambiental do
Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz. O planejamento e realização das coletas é
feito pelo Departamento de Saneamento e Saúde Ambiental da Escola Nacional de
Saúde Pública Sérgio Arouca (ENSP/Fiocruz), em colaboração com a concessionária
Águas de Niterói, que opera os serviços de abastecimento de água, coleta e
tratamento de esgotos da cidade.
A
subsecretária de Projetos Especiais da Secretaria de Planejamento, Orçamento e
Modernização da Gestão de Niterói, Valéria Braga, enfatiza que este tipo de
vigilância apenas é possível nos municípios em que uma parcela significativa da
população é atendida por rede coletora de esgoto e a operadora do serviço tem
controle sobre o sistema. No caso de Niterói, a cobertura da rede de esgoto é
de 95%.
Coletas
contam com o apoio de profissionais de concessionária
"Esta
é uma importante parceria entre a ciência e as políticas públicas que vai
ajudar a salvar vidas. Estamos muito orgulhosos com essa pesquisa, pela
definição da metodologia adequada, dos resultados conseguidos e, mais
importante, dos encaminhamentos efetuados a partir desses resultados. Podemos
antecipar o reforço nas ações de controle do vírus em locais ainda silenciosos,
mas que já apresentam concentração viral no esgoto. Importante a população
estar ciente que a concentração do vírus no esgoto não significa contaminação a
partir dele, é somente uma ferramenta de monitoramento bastante eficiente que
ajuda ao poder público na tomada de decisões", destaca Valéria Braga. Como
metodologia, utiliza-se o método de ultracentrifugação, tradicionalmente
empregado para concentração de vírus em esgotos, associado à técnica de RT-PCR
em tempo real, indicada pela Organização Mundial da Saúde (OMS).
Para a engenheira sanitarista Camille Mannarino, da Escola Nacional de Saúde Pública (Ensp/Fiocruz), o projeto reforça a importância da ampliação do monitoramento da disseminação do novo coronavírus por meio da rede de esgotos, em especial, no atual momento de flexibilização do distanciamento social em diversas regiões do país. “Conforme demonstrado pela literatura científica, muitas pessoas infectadas não apresentam sintomas da Covid-19, mas excretam fragmentos virais nas fezes. Por meio do monitoramento dos esgotos, a vigilância em saúde pode mobilizar a atenção primária, em determinada localidade, no sentido de conter a transmissão”, ressalta a pesquisadora. Ela comenta, ainda, que o monitoramento dos esgotos, mesmo após a redução das notificações de casos de Covid-19, poderá servir como alerta precoce da emergência e re-emergência da doença”.
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