O Senado Federal está em vias
de aprovar um projeto de lei que pode caçar avanços do Marco Legal de Ciência,
Tecnologia e Inovação (Lei nº 13.243/2016) antes mesmo de os entes do setor
utilizá-los.
Após aprovar a PEC dos Gastos
Públicos e encaminhar a aprovação do Pacote Anticorrupção modificado pelos
legisladores, o próximo ato é a aprovação do PLS 559/2013, que moderniza a Lei
de Licitações e Contratos (nº 8.666/1993).
O Projeto de Lei do Senado
(PLS) traz questões polêmicas que inviabilizam dois pontos conquistados com
muita luta pelo setor de CT&I na construção do Marco Legal: a Contratação
Integrada e Semi-Integrada (*Atualização no fim da reportagem) e a Dispensa
Parcial de Certidões. Os impactos poderão ser sentidos no desenvolvimento e competitividade
da ciência e da indústria nacional.
Se aprovado, o PLS extinguirá
um dos principais mecanismos previstos na Lei 13.243 para destravar a
contratação de projetos e obras de infraestrutura acadêmica e científica. A
Contratação Integrada será permitida apenas para obras orçadas em mais de R$ 20
milhões. Essa modalidade, que surgiu com o Regime Diferenciado de Contrações
(RDC) para a Copa do Mundo de 2014, permite uma única licitação para contratar
o desenvolvimento dos projetos básico e executivo e a execução de obras e
serviços de engenharia.
“Laboratórios são
intrinsecamente complexos de serem construídos. Pela contratação usual,
precisamos fazer uma licitação para projeto e outra para execução da obra. O
que acontece com frequência é um jogo de empurra de responsabilidades entre as
companhias vencedoras da licitação que acabam atrasando as obras”, explica o
diretor técnico do Fórum de Gestores de Inovação e Transferência de Tecnologia
(Fortec), Gesil Amarante. “A Contratação Integrada daria mais agilidade, mas
esse limite de R$ 20 milhões inviabiliza o uso do mecanismo para o setor de
CT&I. Infelizmente a maior parte dos nossos projetos não conta com
orçamento desse porte”.
O texto do PLS 559 foi
aprovado no Plenário do Senado na quinta-feira passada (8) em primeiro turno e
deve entrar na pauta para segunda apreciação ainda hoje (13). O diretor do
Fortec também afirma que a proposta inviabiliza a flexibilidade, prevista no
Marco Legal de CT&I, para apresentar certificações durante o processo de
licitação e contratações do setor, principalmente de importação de produtos e
equipamentos para pesquisa e desenvolvimento (P&D).
Na redação do PLS, a Dispensa
Parcial de Certidões será possível apenas para bens de até R$ 300 mil. Esse
mecanismo, segundo Amarante, é importante para vencer a burocracia, que exige
certidões muitas vezes “impossíveis de se conseguir e que só existem no
Brasil”. Para ele, o texto aponta um limite baixo e não atende as
especificidades de setores estratégicos.
“Comprar caneta e tijolo é
diferente de comprar supercomputadores. Precisamos ampliar os avanços
conquistados no Marco Legal de CT&I ao invés de se entregar à burocracia
mais uma vez”, lamenta o gestor. “Para comprar um microscópio de varredura, por
exemplo, é preciso procurar um fornecedor com as certidões exigidas pela
burocracia brasileira. Isso não garante os melhores produtos e os menores
preços. Ficamos nesse loop infinito e o interesse público de ver a pesquisa
acontecendo é a última preocupação.”
Durante a tramitação do PLS
559 nas comissões do Senado, a comunidade científica, por meio de
interlocutores no Congresso Nacional, se reuniu com o relator do PLS, senador
Fernando Bezerra Coelho (PSB-PE), para sugerir alterações no texto. Segundo
Gesil Amarante, algumas delas foram acatadas, no entanto, os pontos polêmicos
foram mantidos. “Chegamos a sugerir que o teto para a dispensa de certidões
fosse R$ 1,5 milhão, mas a redação não foi alterada.”
Por meio de nota, a assessoria
do senador Fernando Bezerra Coelho informou que o texto previa um parâmetro na
modalidade de Contratação Integrada no valor de R$ 100 milhões, mas que o valor
foi reduzido a partir de R$ 20 milhões após receber “contribuições de
diferentes especialistas do governo, do Tribunal de Contas da União e do setor
privado.”
Sobre o teto de R$ 300 mil
para a Dispensa Parcial das Certidões, a assessoria do relator da matéria
destaca que o valor também foi sugerido por “especialistas do setor público e
da iniciativa privada e apoiado, inclusive, pelo Ministério de Ciência e Tecnologia
[sic]”.
Pressa
O diretor do Fortec também
criticou a pressa dos senadores em aprovar a proposta. Desde que a matéria foi
designada ao relator, em fevereiro de 2016, ela ficou sem tramitar até julho,
quando foi incluída na pauta da Comissão Especial do Desenvolvimento Nacional.
Somente uma audiência pública foi realizada – em 24 de agosto de 2016 – para
debater o PLS 559, protocolado em dezembro de 2013.
“Estávamos preocupados com a
regulamentação do Marco Legal de CT&I e fomos pegos de surpresa com a
notícia do avanço dessa matéria. Essa é uma proposta que acessa todo o Estado e
os problemas que há nele não foram discutidos. Esse projeto pode trazer
benefícios, mas para a CT&I, em particular, não traz avanço. Estamos
brigando para não perder o que o Marco Legal de CT&I trouxe. Essa lei foi
construída com muito esforço durante cinco anos pela comunidade científica,
acadêmica, tecnológica e empresarial.”
A assessoria do senador afirma
ainda que houve “diversas reuniões técnicas e audiência pública para o
aprimoramento da matéria”. E ressaltou que o parlamentar manteve-se sempre
disponível para receber e acatar diferentes contribuições e emendas ao
substitutivo. Caso seja aprovado no Plenário do Senado, o texto segue para
apreciação na Câmara dos Deputados. Se for modificado pelos deputados, o PLS
retorna ao Senado para nova análise e votação.
*Após a publicação desta
reportagem, a assessoria do senador Fernando Bezerra Coelho entrou em contato
com a equipe da Agência Gestão CT&I para informar que foi acatada uma
emenda ao texto do PLS 559. De autoria do senador Lasier Martins (PDT-RS), a
emenda dá novo entendimento à Modalidade de Contratação Integrada e
Semi-Integrada, criando exceção ao piso de R$ 20 milhões para projetos de
CT&I e ensino técnico ou superior. A matéria foi aprovada em turno
suplementar às 20h10, incluindo a emenda do senador Lasier Martins.
Agência Gestão CT&I


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