No
Rio de Janeiro, onde desde 2015 foram registrados mais de mil casos de bebês
com microcefalia, deputados estaduais, familiares, especialistas e
representantes de órgãos públicos criaram um grupo de trabalho para formular
uma lei que possa garantir o tratamento e o apoio às crianças com a doença. As
famílias relatam que, em algumas cidades, encontram dificuldade no acesso ao
tratamento.
A
criação do grupo foi anunciado hoje (10) durante audiência pública para
discutir o tema na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj). A primeira
reunião será amanhã (11), no Instituto Fernandes Figueira (IFF), vinculado
à Fundação Oswaldo Cruz. De acordo com o presidente da Comissão da Pessoa
com Deficiência, Márcio Pacheco (PSC), o principal objetivo será fundamentar,
do ponto de vista científico e metodológico, um projeto de lei que possa apoiar
famílias e crianças.
A microcefalia é
uma condição que acarreta em uma série de problemas neurológicos e sua
principal característica é o tamanho menos da cabeça dos bebês. Os números de
casos no país tiveram um aumento significativo desde 2015, quando houve uma
epidemia do vírus Zika, causador da doença em bebês nos casos em que a mãe
é infectada ainda durante a gravidez.
Mãe
de Miguel Ângelo, hoje com 1 ano, Thamires Silva precisou abandonar a faculdade
de enfermagem depois que o filho foi diagnosticado. Ela relata que não consegue
continuar o tratamento em postos de saúde e clínicas da família perto de sua
casa, em Belford Roxo, na Baixada Fluminense. A solução tem sido de deslocar
frequentemente à capital. "A microcefaliade Miguel foi diagnosticada
no nascimento. Não tive atendimento, não tive acompanhamento nenhum, nem
encaminhamento para hospitais de referência [à época do parto]", conta.
Além
da dificuldade de locomoção para a cidade do Rio, ela reclama que as unidades
básicas alegam não saber lidar com crianças que nasceram com essa
condição."Não é só uma cabeça pequena, é uma violação de direitos diária
nas áreas de saúde e educação", completa.
Moradora
da Taquara, bairro da zona oeste da capital, Vivan Barros tem um filho de 1 ano
com a doença. Ela gasta três horas para ir e vir do IFF, na zona sul. A unidade
é a única de referência em todo o estado. "Eu estive na UPA [Unidade
de Pronto Atendimento] e a médica disse que não tinha condições de atender meu
filho, com gastroenterite, naquele lugar em razão da microcefalia]",
conta. Ela também diz que não encontrou ainda um posto perto de casa, com
pediatra, para aplicar vacinas obrigatórias no menino.
Prevenção
e tratamento
Na
avaliação dos especialistas, os governos priorizaram o investimento no combate
ao mosquito transmissor do vírus Zika, aquisisção de testes e
desenvolvimento de vacinas para evitar a infecção. No entanto, o atendimento às
crianças foi relegado.
"A
epidemia acabou, mas essas crianças ainda estão aqui", criticou a médica e
pesquisadora do IFF, Maria Elisabeth Moreira. Ela defende que seja feito agora
o investimento no desenvolvimento das crianças. "Principalmente, na
questão da estimulação", disse. Para a médica, o projeto de lei em
discussão na Alerj precisa pensar os centros de referência e as unidades
básicas de saúde trabalhando juntas.
A
coordenadora da pediatria do Instituto do Cérebro, da rede estadual, Fernanda
Fialho, reconheceu que há problemas de atendimento e explicou a falta de alguns
tipos de remédios. Medicamentos anticonvulsivos deveriam ser oferecidos
pela Secretaria Estadual de Saúde, que não consegue comprá-los em razão da
grave crise econômico que o Rio de Janeiro.
"A
secretaria está na luta, tem aberto processo de licitação, mas as empresas não
se candidatam com medo de o estado não pagar a dívida, dar o calote".
Segundo
o deputado Márcio Pacheco, o grupo de trabalho criado hoje poderá elaborar uma
política pública completa. "Estabelecerá uma política voltada para o
diagnóstico, tratamento e acompanhamento. Além de medidas na educação",
disse.
Uma
das medidas que deve ser incluída no projeto de lei é a obrigatoriedade de cada
um dos 92 municípios fluminenses terem representantes para monitorar e
acompanhar o tratamento das crianças, os chamados "pontos focais".
Apenas 60 municípios contam com essas equipes.
*Colaborou
Joana Moscatelli, do Radiojornalismo
Edição:
Amanda Cieglinski
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