Prestes a entrar em debate na
Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), a proposta de dar aval para
o cultivo de maconha no
país deverá ter foco na pesquisa e produção de medicamentos, sem que haja
espaço para outros produtos, afirmou à Folha o diretor-presidente da agência,
William Dib.
“Precisa ficar claro o
seguinte: não estamos liberando a Cannabis, mas liberando
medicamentos à base de Cannabis“, disse. “Ah, mas cigarro [de
maconha] é bom
para cefaleia [dor de cabeça].’ Não pode. Essa forma de administração
não vai existir. Se quiser xampu à base de Cannabis, também não
terá.”
Folha de maconha em plantação
caseira na zona norte do Rio – Ricardo Borges – 18.ago.2015/Folhapress
Na próxima semana, diretores
discutirão a possibilidade de submeter à consulta pública duas propostas de
resoluções: uma que regulará o plantio de Cannabis no Brasil para pesquisa e
produção de medicamentos e outra com regras para registro e
monitoramento desses produtos.
Hoje, o plantio
de Cannabis é
vetado no Brasil. Desde 2006, no entanto, a lei 11.343 prevê a possibilidade de
que a União autorize o cultivo “para fins medicinais e científicos, em local e
prazo predeterminados, mediante fiscalização”.
O novo debate, assim,
representa o primeiro passo para a regulamentação do tema, o que poderá
aumentar o espaço para o uso
medicinal da maconha no país.
William Dib, nascido em 25 de
novembro de 1946, é médico cardiologista e especialista em administração
hospitalar. Foi secretário de Saúde, vereador e prefeito de São Bernardo do
Campo (SP) pelo PSB. Em 2010, foi eleito deputado federal. É diretor-presidente
da Anvisa desde 2018 – André Coelho/Folhapress
O objetivo, de acordo com Dib,
relator das propostas, é facilitar o acesso a pacientes que hoje buscam aval da
agência para importar medicamentos à base da planta.
“Fazendo essas duas
regulações, a população vai ter acesso a um remédio mais seguro, de melhor
qualidade e a preço menor do que hoje. Além disso, vamos abrir espaço a mais
medicamentos.”
Desde 2015, a Anvisa
autoriza pedidos
para importação de óleos e medicamentos à base principalmente de
canabidiol –substância da maconha que tem alguns efeitos terapêuticos e não é
psicoativa, ou seja, não dá “barato”.
Alguns dos produtos, porém,
podem ter também uma menor concentração de THC (tetra-hidrocanabinol), esse,
sim, que gera efeitos psicoativos e tem ganhado atenção em pesquisas de saúde.
Ao todo, 6.789 pacientes já
obtiveram o aval para importar produtos com canabidiol, condicionado a
documentos e laudos médicos. As doenças mais frequentemente tratadas são
epilepsia, autismo, dor crônica, doença de Parkinson e alguns tipos de câncer.
O problema, porém, é que os
custos são altos. Um tratamento por três meses chega a R$ 2.000, o que tem
feito crescerem as ações judiciais para que planos de saúde e no SUS forneçam
os produtos.
Daí, segundo Dib, a
necessidade de regular o tema. “É um processo que vai ser baseado na segurança
do paciente, de quem já faz uso e de quem possa vir a fazer, dependendo de
prescrição médica.”
Ainda assim, os remédios “não
serão para tudo nem para todos”, afirma. Segundo ele, a ideia é que o processo
resulte na liberação de medicamentos e extratos (como óleos) de derivados
da Cannabisapenas para doenças em que esse tipo de tratamento tiver
evidências clínicas de eficácia em determinadas concentrações.
“Até porque não acredito que
Bombril e suas mil e uma utilidades exista na medicina”, compara.
Atualmente, o Brasil tem apenas um medicamento registrado à base de Cannabis: o Mevatyl, produto composto por canabidiol e THC e indicado para tratamentos de espasmos para pacientes com quadro de esclerose múltipla. Mas, além do uso restrito, o custo também é alto: em torno de R$ 2.600 a embalagem.
Para Dib, com o aval ao
cultivo, o Brasil poderá aumentar o número de remédios e, por consequência,
baixar os preços.
Para que isso ocorra, o
plantio e produção serão restritos a empresas, que devem obter um tipo de
licença especial. “Como todas que mexem com produtos de saúde, será preciso
apresentar um projeto que será aprovado antes de se instalar e abrir as
portas.”
A ideia é que haja cotas de
produção, em modelo semelhante ao praticado hoje em outros países, como o
Canadá, onde o cultivo é autorizado e monitorado pelo governo.
Ele nega que haja
possibilidade de abertura para uso recreativo e diz que a proposta vetará também
qualquer abertura para produção por pessoas físicas, ainda que haja a
justificativa de uso medicinal.
Nos últimos anos, cresceu o número de famílias com aval na Justiça para cultivo da Cannabis. Dib, porém, vê problemas nesse processo.
“Ninguém tem condição na sua
casa de dosar o que tem de canabidiol, de THC, e nem de dosar a quantidade que
seu filho pode usar. Isso não é chá de boldo, em que tomar um pouco a mais ou
um pouco a menos que não vai mudar muito. Precisa de conhecimento e dosagens
científicas.”
Objetos à venda na Ultra420,
loja criada pelo empresário Alexandre Perroud Zanone Fraissat/ Folhapress
Mas como garantir que a
produção pelas empresas não tenha desvios?
“É conta de matemática: haverá
cotas de produção e, com base nisso, eu sei que ali produzimos mil caixinhas.
Com isso, ou eu tenho mil receitas, ou tenho alguém que vai ser preso”,
responde ele, que diz que a Polícia Federal já acompanha os debates e deve
participar da fiscalização. “Não seremos irresponsáveis.”
A previsão é que os
medicamentos desenvolvidos sejam submetidos a regras específicas de análise e
aprovação para registro, aval necessário para que sejam comercializados no
país. Um dos pontos, afirma, é a possibilidade de cobrança de estudos de
monitoramento, aos quais a renovação do registro estaria condicionada.
Já nas farmácias, os remédios
devem ser produtos controlados e ter a receita médica retida.
“O controle vai coincidir com a implementação do nosso projeto de rastreabilidade [que prevê que cada caixinha tenha uma espécie de ‘RG’ monitorado da indústria ao consumidor]. Vou saber quem produziu, quem transportou e onde está a caixinha.”
Segundo ele, universidades que
desejarem fazer pesquisas com a planta também terão essa possibilidade, desde
que atendam a regras e requisitos de segurança. Apesar da maior aceitação
ao canabidiol,
não haverá restrição ao tipo de substância a ser pesquisada para produção de
remédios.
“Estamos regulando a planta.
Isso porque determinadas patologias não se dão como controladas só com o
canabidiol, e precisam de uma quantidade de THC, além de outras substâncias”,
diz.
Em 2017, o então
diretor-presidente da Anvisa, Jarbas Barbosa, chegou a declarar que a agência
pretendia apresentar uma proposta de regulamentação sobre o tema no mesmo ano,
o que não ocorreu.
Dib admite que o tabu em torno
do tema acabou atrasando o processo. Outro fator, diz, foi assegurar a
segurança e evitar que a proposta fosse desvirtuada para outros fins que não o
uso medicinal.
“O debate agora está mais
maduro. Conseguimos aprender com o Canadá, com Israel e com Portugal um modus
operandi seguro de plantio.”
A apresentação completa da
proposta está prevista para reunião na terça (11). Se aprovada, segue para
consulta pública por 90 dias. Em seguida, a agência analisará contribuições
para redação final.
Para Dib, a expectativa é que
a consulta seja aprovada por unanimidade.
Para Margarete Brito, que usa
óleo de Cannabis para diminuir convulsões da filha e é
coordenadora da Apepi (Associação de Apoio a Pesquisa e a Pacientes
de Cannabis Medicinal), a proposta é bem-vinda.
“Hoje, muitos médicos têm medo de prescrever e o paciente não conseguir
acesso ao remédio, tanto pela burocracia quanto pelo custo”, diz ela,
que planeja pedir que associações de pacientes também ganhem aval ao
cultivo, proposta até agora excluída por técnicos da agência.
REGULAÇÃO DE CANNABIS DEVE
GERAR DE ATRITO COM O GOVERNO
O tema deve gerar atrito com o
governo, que tem adotado postura mais rígida em relação às drogas.
Nesta quinta (6), o presidente Jair Bolsonaro sancionou lei que altera a atual política de drogas. Entre as medidas, o texto dificulta a alta de pacientes submetidos à internação involuntária. Também reforça modelos baseados em abstinência e a postura de repressão ao tráfico –Bolsonaro vetou trecho que previa penas menores a depender do volume apreendido e circunstâncias do caso.
“Mas os assuntos não são
correlatos”, afirma o diretor-presidente da Anvisa, William Dib. “O que a
Anvisa está propondo não tem nada a ver com isso. Ela não trata do que é
consumido ilegalmente. Tanto é que nossa conversa é com o Ministério da Saúde,
porque quem paga hoje boa parte dessa conta maluca [de fornecer medicamentos à
base de Cannabis por ação judicial] é o SUS. E paga duas
vezes: paga mal, o produto é ruim, o acesso é ruim”, diz.
No último mês, o ministro da
Cidadania, Osmar Terra, disse em rede social que a Anvisa era “irresponsável”
por querer liberar o plantio de Cannabis no Brasil: “Contra a
lei, contra as evidências científicas e contra o Congresso e o Governo
brasileiro!”.
A posição foi defendida pelo
Conselho Federal de Medicina, para quem ainda não há evidências consistentes de
eficácia e segurança do uso de alguns canabinoides –desde 2014, o conselho,
porém, autoriza que médicos prescrevam o canabidiol para crianças e
adolescentes com epilepsia.
Em resposta, Dib diz que o
receio é por achar que o acesso para uso medicinal seria à planta, o que é
vetado na proposta. “A hora que entenderem o projeto, o número de pessoas que
serão contrárias vai ser bastante reduzido. Ele trata única e especificamente
de medicamentos”, diz. “Se o governo um dia quiser liberar
a Cannabis, o ópio, a coca, isso é problema de governo,
não é problema da Anvisa. Não vamos nos intrometer nisso.”
E se o governo tentar barrar?
“Eu insisto que o processo é responsabilidade da Anvisa”, diz. “É a Anvisa que
tem que aguentar 9.000 pedidos de Cannabis medicinal e
que vê pai chorar porque dizem que demoramos 40 dias para liberar a
[autorização para importar].”
Além da saúde, diz, ele diz
ver na medida potencial de geração de empregos. “Mas o que importa para
nós é o doente e o acesso ao medicamento. Não é justo a população e classe
médica acreditarem que há remédios a base de Cannabisque podem ser
utilizados e a Anvisa criar dificuldade de acesso.”
MARCO ANTONIO BARBEITO DOS
SANTOS
Agora
Uma pergunta me intriga desde
sempre : Por que será que nenhuma dessas pessoas interessadas, pega numa enxada
e vai cultivar uma plantação de batatas ? E mesmo porque, agora com o Cocô
Medicinal, comprovadamente, todas estas doenças citadas estão com os dias
contados. O Cocô Medicinal é artesanal, caseiro, produção modesta porém
sincera, e faz com que todos sorriam felizes antes, durante e depois do uso. É
a oitava maravilha moderna e ao mesmo tempo tradicionalíssima. Gregos e
Troianos sorrindo.
Fonte: Folha
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