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segunda-feira, 24 de julho de 2017

Doenças artríticas e câncer - Centro do Butantan , apoiado pela Fapesp e pela GSK, investigará alvos terapêuticos para doenças de base inflamatória

Em um prédio histórico do Instituto Butantan, localizado entre o Museu de Microbiologia e a Biblioteca Central, foi inaugurada nesta sexta-feira (21/07) a sede do Centro de Excelência para Descoberta de Alvos Moleculares (Centre of Excellence in New Target Discovery – CENTD).

Apoiado pela FAPESP e pela farmacêutica GlaxoSmithKline (GSK), o CENTD tem como objetivo identificar novos alvos terapêuticos para doenças de base inflamatória, como osteoartrite, artrite reumatoide, câncer e doenças neurodegenerativas.

O Centro foi concebido no modelo parceria público-privada (PPP) e aprovado no final de 2015, no âmbito do Programa FAPESP de Apoio à Pesquisa em Parceria para Inovação Tecnológica (PITE). As atividades do grupo coordenado pela pesquisadora Ana Marisa Chudzinski-Tavassi tiveram início em fevereiro de 2016.

“Como ainda não tínhamos sede própria, cada pesquisador principal estava, até este momento, conduzindo os experimentos em seu próprio laboratório no Instituto Butantan. Tudo agora será centralizado na nova facility, onde pesquisadores, pós-doutorandos, professores associados e alunos terão um ponto focal para discussões e convívio, o que certamente favorecerá o intercâmbio e as colaborações”, disse a coordenadora do CENTD.
A nova sede ocupa uma área de aproximadamente 200 metros quadrados no primeiro prédio de alvenaria construído no Instituto Butantan. Conhecido como P-55, o imóvel teve a fachada restaurada e a parte interna totalmente remodelada.

Entre os equipamentos adquiridos com apoio da FAPESP e da GSK estão citômetro de fluxo, espectrômetro de massa, microscópio confocal e um aparelho para a realização de ensaios do tipo High Content Screening (HCS) – capaz de triar moléculas com algum tipo de efeito biológico e, portanto, essencial para pesquisas voltadas ao desenvolvimento de fármacos.

“Essa parceria com a GSK e com a FAPESP é importante para estabelecer novas formas de colaboração científica, formar recursos humanos visando a inovação, ampliar a internacionalização e, sobretudo, para estabelecer formas de inovar para oferecer à sociedade melhorias”, destacou Chudzinski-Tavassi, durante a cerimônia de inauguração da sede.

Também presente no evento, o diretor científico da FAPESP, Carlos Henrique de Brito Cruz, afirmou que o projeto permite "avançar um passo” no relacionamento entre instituições de pesquisa e empresas. “Neste caso, por meio de parceria com uma empresa que atua com base na ciência e apoiando um projeto de pesquisa bastante ousado, que tem a possibilidade de durar até 10 anos”, destacou.

Isro Gloger, diretor do Programa Trust in Science da GSK, contou que há seis anos a farmacêutica decidiu explorar a ciência na América Latina e o Brasil foi considerado um parceiro prioritário pela alta quantidade e qualidade de sua produção científica.

“Tivemos a sorte de estabelecer a parceria com a FAPESP e juntos criamos uma PPP única, tendo a ciência como valor mais importante. Em 2015 tivemos a ideia de criar o centro de excelência e o Instituto Butantan apresentou uma proposta inovadora: estudar moléculas de venenos de serpente não para ver se curam, mas para entender como curam e, assim, buscar novos alvos para o desenvolvimento de fármacos”, contou.

Na avaliação do secretário de Saúde do Estado de São Paulo, David Uip, o modelo de parceria adotado evidencia o objetivo fundamental da FAPESP para o Estado de São Paulo.

“Acredito muito no modelo das PPPs. A indústria consegue fazer ciência de ótima qualidade e essa parceria no mundo moderno é absolutamente vital. Os governos não têm mais recursos para serem investidores isolados em pesquisa e ciência, a despeito de admitir que a pesquisa e a ciência são fundamentais em qualquer área de atuação. O Brasil passa por enorme crise e, neste momento, esse tipo de parceria consegue nos colocar na linha de vanguarda”, afirmou.

Também participaram da cerimônia de inauguração Dimas Tadeu Covas, diretor do Instituto Butantan, Joanna Crellin, cônsul-geral britânica de São Paulo, e Wasim Mir, embaixador-adjunto do Reino Unido no Brasil.

Ciência de vanguarda
De acordo com a coordenadora do CENTD, além de organizar a construção da nova sede e a importação dos equipamentos, a equipe do Centro se dedicou ao longo dos últimos meses a criar um repositório de moléculas naturais a serem testadas no âmbito do projeto – isoladas principalmente de venenos, toxinas e outras secreções animais.

“Esse tipo de molécula extraída de secreções animais adquiriu, ao longo da evolução, grande seletividade e especificidade para interagir com células humanas e isso nos permite uma abordagem mais direcionada. Em nosso instituto, a gama de toxinas que atua em processos imunoinflamatórios é vasta, assim como o conhecimento sobre os mecanismos de ação e a química dessas proteínas de veneno”, contou Chudzinski-Tavassi.

Segundo a pesquisadora, todos os compostos incluídos no biorrepositório passaram por rígido controle de qualidade e tiveram suas características bioquímicas e funcionais bem estudadas.

“Precisamos ter tudo padronizado e a certeza de que cada uma dessas moléculas vai sempre se comportar da mesma maneira nos diferentes ensaios. Isso é essencial para garantir a reprodutibilidade dos achados. Também era preciso garantir quantidade suficiente dos compostos para testá-los nos diversos modelos de estudo em desenvolvimento”, explicou Chudzinski-Tavassi.

Como o foco inicial do CENTD está em doenças artríticas e câncer, disse, foram desenvolvidos ao longo do primeiro ano de funcionamento do Centro modelos celulares que possibilitam testar o efeito das moléculas selecionadas nesse tipo de patologia.

“A proposta é usar os compostos naturais como ferramentas para descobrir alvos moleculares drugable, ou seja, que podem ser modulados farmacologicamente em uma condição patológica. A partir dessas descobertas a GSK poderá fazer novas pesquisa para o desenvolvimento de fármacos”, disse Chudzinski-Tavassi.

Com o equipamento de HCS, contou a pesquisadora, é possível analisar por meio de imagens diversos aspectos celulares e observar de que modo o fenótipo se modifica quando as culturas são tratadas com um determinado composto.

“Podemos, por exemplo, mimetizar uma condição de osteoartrose usando uma cultura de condrócitos [células extraídas da cartilagem], tratar esse modelo com uma determinada proteína e, depois, avaliar os marcadores de inflamação, a estrutura celular e uma série de outros parâmetros. Em seguida, para entender como o efeito observado ocorreu, investigamos as vias de sinalização envolvidas. Até, finalmente, chegarmos ao alvo que a proteína está atingindo”, disse.

Uma das metodologias essenciais para esse tipo de investigação é a transcriptômica, contou a pesquisadora. “Após tratar as células com o composto em estudo, extraímos o RNA e, por sequenciamento, identificamos os genes que estão sendo alterados. Ao comparar com uma cultura não tratada é possível mapear genes e vias que estão sendo modulados pelo tratamento. Tudo com auxílio de ferramentas de bioinformática”, explicou.

A nova sede vai reunir, além de todos os equipamentos necessários para os ensaios, também uma sala dedicada à cultura de células. “Nesse laboratório, todos os pesquisadores poderão trabalhar tanto no tratamento das células como na análise dos resultados. A bioinformática também é essencial nestas análises. Com tudo concentrado em uma facility, esperamos aumentar muito a interação entre os pesquisadores e estudantes”, disse Chudzinski-Tavassi.

A equipe do CENTD conta, até o momento, com cerca de 80 pessoas entre pós-doutorandos, pesquisadores principais, pesquisadores associados e funcionários. A meta é identificar pelo menos um novo alvo terapêutico a cada dois anos.

O projeto tem aporte financeiro de R$ 24 milhões: a FAPESP investe R$ 12,7 milhões e a GSK R$ 11,3 milhões para a compra de equipamentos, reagentes e contratação de pós-doutorandos. Em contrapartida, o Instituto Butantan fornecerá, ao longo dos cinco anos, toda a infraestrutura e os recursos humanos para a efetivação da pesquisa, o que equivale a aproximadamente mais R$ 33 milhões.

“Esperamos produzir ciência de qualidade e de alto impacto e, com os resultados gerados, contribuir para o entendimento de fenômenos ainda não desvendados em certas patologias de cunho inflamatório. Conhecimento este que permitirá à GSK desenvolver novas e eficientes drogas para ajudar a sociedade”, disse Chudzinski-Tavassi.

A pesquisadora ressaltou ainda que a infraestrutura desenvolvida para os estudos do CENTD poderá suportar inúmeros outros projetos de pesquisa no futuro.

Karina Toledo  |  Agência FAPESP


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