Após vinte e seis anos de discussões e
aprendizados, finalmente o lobby no Brasil está no caminho de encontrar a
esperada regulamentação.
A proposta de um marco legal para o chamado “lobby”
pelo Poder Legislativo teve início em 1990, com um projeto de lei do então
senador Marco Maciel.
A proposta, inovadora para a época, baseava-se, com
confiança mais do que merecida, no paradigma americano. Após anos de vigência,
esse modelo de regulamentação burocratizador não deu certo naquele país – em
vez de trazer a pretendida transparência, reduziu o número de profissionais
registrados no Senado americano para um nível inferior ao de 1998. Eles, os
profissionais, passaram a trabalhar na informalidade, fora do radar, longe dos
registros legislativos e dos olhos da sociedade.
Contudo, apesar de ainda não existir no Brasil um
marco legal que institucionalize a prática do lobby, as fronteiras da atuação
estão muito bem delimitadas. Quase todas as disposições da regulamentação dos
EUA (como quarentena, banimento de oficial público, limite para presentes,
gastos com campanhas eleitorais, participação de autoridades em eventos e
sanções civis e criminais) já estão previstas de forma esparsa na legislação
brasileira.
Velhas ideias não abrem novas portas. Limites e
sanções já existem. Mecanismos de controle já são eficazes no Brasil, haja
vista os recentes acontecimentos que estão passando o país a limpo. O que ainda
falta é instituir mecanismos que promovam a ética e a transparência nas
relações entre o público e o privado.
Sob essa perspectiva moderna a redação aprovada na
Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados para a chamada “Lei
do Lobby”, PL 1202/07, em anexo, avança em aspectos bastante relevantes. A nova
redação foi dada pela relatora na Comissão, deputada Cristiane Brasil, ao
projeto de lei de autoria do deputado Carlos Zarattini.
Inicialmente o texto prevê os princípios que devem
orientar a atuação, como legalidade, ética, transparência e isonomia aos grupos
de pressão. Em seguida o projeto prevê o credenciamento dos profissionais, que
deverão registrar quem são e quem representam.
Ademais, o substitutivo aprovado na Comissão inovou
em relação à redação original ao instituir canais formais de participação
social. Na prática os profissionais, devidamente credenciados, deverão
documentar seus pleitos e sugestões legislativas, de modo que fique à luz de
toda a sociedade quem está participando das discussões e quais interesses
defendem.
E ainda aperta o cerco para o mal feito. O projeto
grava como ato de improbidade o recebimento de qualquer tipo de vantagem para
influenciar decisão política, sujeitando quem oferece e quem aceita a sanções
penais, civis e administrativas.
Outro ponto importante, o profissional que praticar
ato de corrupção, tráfico de influência, concussão, advocacia administrativa ou
improbidade administrativa terá seu registro negado, ficando impedido de atuar
na atividade. Por fim, proíbe que ex presidentes da República exerçam a
atividade por quatro anos após o mandato.
Tocqueville já defendia o funcionamento de uma
democracia, não tirânica e em contextos não eleitorais, com a participação de
formas corporativas de representação de interesse como meio para prover o bem
comum numa uma sociedade plural.
“O
lobby e
a corrupção tendem a se excluir mutuamente”. Em verdade um é o contraponto do
outro. Enquanto o primeiro representa o convencimento como exercício de
democracia, o outro é a compra de favores e que não encontra espaço em ambiente
de discussão plural, ética e isonômica.
O desafio dos novos tempos é separar o joio do
trigo – garantir e promover o exercício dos direitos constitucionais de
associação, de liberdade de expressão e de petição aos poderes públicos. E isso
só será possível se, em vez de entregar aos profissionais éticos a “conta” dos
corruptores, e se, em vez de se onerar e burocratizar a participação dos
grupos, a regulamentação possa trazer luz e sol às relações.
Como já defendia a OCDE, cada país deve construir e
adotar a sua própria regulamentação para o lobby, baseada em sua cultura e seu
amadurecimento social e político. Soluções de prateleira não são recomendáveis.
Quiçá quando se percebe que nem na origem deu certo. Atribui-se à Einstein a
frase que diz “é insanidade fazer a mesma coisa e esperar resultados
diferentes”. Portanto “importar” o modelo americano não será o caminho.
O Brasil já dá demonstrações claras de que possui o
amadurecimento e a criatividade necessários para construir a sua própria
receita para garantir que a participação social nas discussões de políticas
públicas sejam feitas dentro da ética e da transparência. Trata-se de repensar
velhas ideias, de inovar para criar uma nova cultura de relações entre governo
e setor privado, promovendo a ética e a transparência.
A democracia agradece.
Eduardo Ribeiro Galvão - Vice-presidente da
Abrig - Associação Brasileira de Relações Institucionais e Governamentais,
professor do MBA de Relações Institucionais do Ibmec
Foto: Ana Volpe/Congresso Nacional
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