A partir de 1º de janeiro, o Sistema Único de Saúde
(SUS) estará sob nova direção, com a posse do presidente eleito Jair Bolsonaro.
A pergunta que profissionais e usuários se fazem é: em qual direção irá o SUS?
“Depois de uma campanha em que a saúde não foi discutida com prioridade pelos
candidatos, tendo se resumido a promessas vagas de expansão sem fontes de
financiamento apontadas, o primeiro desafio é retomar o tema como nuclear do
próximo governo”, avalia à Radis o professor do Departamento de Medicina
Preventiva da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) Mário
Scheffer, um dos autores do estudo “A saúde nos programas dos candidatos à
Presidência em 2018”.
No texto, escrito com a professora do Instituto de
Estudos em Saúde Coletiva da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Iesc/UFRJ)
Ligia Bahia e a professora da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio
(EPSJV/Fiocruz) Ialê Falleiros Braga, um alerta baseado em experiências
passadas já chamava a atenção: “Parte das proposições dos programas eleitorais
consiste na mera reapresentação de intenções não efetivadas. Possivelmente, a
concordância, no processo eleitoral, relativamente fácil de obter, em torno da
expansão do SUS, tem sido submetida posteriormente a escrutínios de agentes
políticos movidos por interesses que terminam por restringir as políticas
universais”.
Financiamento
congelado
O plano de governo de Bolsonaro protocolado no
Tribunal Superior Eleitoral (TSE), no que trata da saúde, parte do diagnóstico
de que o financiamento do setor é adequado mas há problemas de gestão:
“Abandonando qualquer questão ideológica, chega-se facilmente à conclusão que a
população brasileira deveria ter um atendimento melhor, tendo em vista o
montante de recursos destinados à Saúde. Quando analisamos os números em termos
relativos, o Brasil apresenta gastos compatíveis com a média da Organização
para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), grupo composto pelos países
mais desenvolvidos. Mesmo quando observamos apenas os gastos do setor público,
os números ainda seriam compatíveis com um nível de bem-estar muito superior ao
que vemos na rede pública. É possível fazer muito mais com os atuais recursos!
Esse é o nosso compromisso”.
O dado divulgado de que o Brasil dedicou 9,5% do
PIB à saúde, mais que o Reino Unido (9,1%), é real mas omite que a maior parte
desses recursos (57%) são privados — gasto das famílias com planos e
medicamentos. Comparado aos outros países com sistemas universais, o Brasil
aparece com a menor participação do Estado nas contas: 42,8% do total. Somando
União, estados e municípios, o investimento na área é de US$ 334 por habitante
por ano, dez vezes menos do aplicado pelo Reino Unido (US$ 3.500 por
habitante/ano), segundo o relatório de Estatísticas Sanitárias 2018 da
Organização Mundial da Saúde (OMS), com informações de 2015.
“O financiamento atual é insuficiente para dar sustentabilidade
ao SUS como está organizado e mais ainda para implementar as demais propostas
de Bolsonaro para a área, que demandam grande aporte”, avalia Scheffer. A
prometida criação de um prontuário eletrônico nacional, para compartilhar
informações do paciente e impedir tratamentos desnecessários, custaria entre R$
10 bilhões e R$ 17 bilhões, segundo levantamento do jornal Folha de S.Paulo a
partir de um projeto do Ministério da Saúde barrado em agosto pelo Tribunal de
Contas da União.
O professor também observa que não há, até agora,
apontamentos de como o presidente eleito conseguiria melhorar a gestão dos
recursos disponíveis — onde estão as falhas e em que seria aplicado o dinheiro
economizado. Scheffer, no entanto, tem uma proposta: deslocar verbas do setor
privado que não atende o SUS para o setor público. “Em um cenário de escassez,
uma revisão a ser feita é nas desonerações de diversas ordens — isenções
fiscais e tributárias, crédito — que beneficiam os planos de saúde”.
O indicado por Bolsonaro para assumir o Ministério
da Saúde, o deputado federal e ex-secretário de Saúde de Campo Grande Luiz
Henrique Mandetta (DEM-MS), parece discordar da avaliação de suficiência do
orçamento da pasta. O médico foi apoiador do movimento Saúde+10, que em 2014
defendia a destinação de 10% da Receita Corrente Bruta (RCB) da União para o
setor — o percentual aumentaria gradualmente. Também foi contrário à entrada do
capital estrangeiro na assistência.
Mandetta é autor do Projeto de Decreto Legislativo
(PDC) 786/17, que busca sustar a portaria que alterou a Política Nacional de
Atenção Básica (Pnab), se colocando contra a retirada da obrigatoriedade da
presença dos agentes comunitários de saúde nas equipes de atenção básica, por
exemplo. Por outro lado, foi conselheiro fiscal (em 1998), presidente do
conselho fiscal (1999-2001) e presidente da Unimed Campo Grande (2001-2004) e
recebeu contribuição de campanha da Amil na última eleição em que concorreu.
Ainda votou pela aprovação da Emenda Constitucional 95, que impõe limite ao
gasto público.
Continue a leitura no site da Radis.
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