O ministro da Saúde, Ricardo
Barros, disse que a presidente do hospital Boldrini, Silvia Brandalise, tem
"algum interesse" na compra do medicamento Aginasa, usado no
tratamento de leucemia linfoide aguda, tipo de câncer mais comum em crianças e
adolescentes.
Brandalise foi uma das
principais vozes a protestar quando o governo federal substituiu o Aginasa,
fabricado no Japão em parceria com a Alemanha, pelo LeugiNase, medicamento
chinês que custa menos de ¼ do preço do antecessor, é desconhecido da classe
médica e foi vetado pela Justiça em setembro, mas ainda é distribuído pela
rede, como revelou a Folha de S.Paulo na quarta-feira (3).
A declaração de Barros foi
feita à rádio "CBN" na quinta-feira (4). "Algum interesse ela
[Brandalise] tem em que o produto que ela defende seja comprado pelo
ministério. É isso que me parece, porque todo medicamento que aparece ela
critica", afirmou Barros.
Em 24 de setembro, o juiz
federal Rolando Valcir Spanholo, do DF , proibiu o governo federal de continuar
a comprar e distribuir LeugiNase, sob justificativa de que não havia provas de
que o remédio funciona em humanos.
O Boldrini, hospital
referência no tratamento de câncer infantil sediado em Campinas, recebeu três
remessas do remédio após a proibição, a última justamente no dia em que a
reportagem foi publicada. Recusou todas.
O governo informou que
recomendou que hospitais e Estados não interrompessem o tratamento com
L-asparaginase porque a sentença, diz o órgão, é de "cunho gerencial"
e foi cumprida.
A decisão proíbe a União de
comprar e distribuir o remédio, o que o Ministério da Saúde diz não ter feito
mais. O texto do juiz não faz referências a entregas feitas pelos Estados, que
recebem a droga do Ministério da Saúde e abastecem os hospitais.
Barros não fez qualquer
menção, na entrevista à "CBN", ao fato de ter permitido a
continuidade do tratamento com uma droga que a Justiça entendeu que não tinha
eficácia comprovada. Segundo ele, o LeugiNase "atestadamente é bom".
O ministro afirmou que a
presidente do Boldrini deve "cuidar bem dos seus clientes" e parar de
"perturbar o sono de mães" de crianças com câncer. "Já faz um
ano isso [que o LeugiNase é distribuído], não houve nenhum efeito adverso, não
aconteceu nada de errado com a aplicação do medicamento, e ela insiste. Então
fica para mim a impressão de que ela não tem nada contra o medicamento chinês,
que ela tem a favor do que ela defende", afirmou Barros.
Quando perguntado se após a
suspensão do LeugiNase pela Justiça, não foi questionada a certificação do
produto, Barros respondeu: "Sim, mas o produto que ela compra também não
tem a certificação que ela exige do outro..não há estudo clínico do produto que
ela defende."
Em entrevista anterior à Folha
de S.Paulo, Brandalise disse que o Aginasa é amplamente conhecido da classe
médica e tem segurança e eficácia comprovadas.
A DROGA
O Aginasa e o LeugiNase são
drogas compostas pelo princípio ativo L-asparaginase. O fármaco faz parte dos
remédios usados na poliquimioterapia. É considerado fundamental para elevar as
chances de cura dos pacientes. A aplicação adequada gera remissão em 98% dos
casos.
Após a suspensão judicial, o
Ministério da Saúde abriu pregão para compra de L-asparaginase. O preço mais
baixo é de outro medicamento chinês (Leucospar), oferecido pelo laboratório
Xetley, mesmo distribuidor do LeugiNase. O ministro disse que nesta segunda (8)
haverá reunião do ministério com entidades médicas para verificar se o
medicamento tem condições de ser adquirido.
Barros afirmou que descontará
o valor do remédio da verba repassada aos hospitais oncológicos. Segundo o
governo, a verba repassada pelo SUS já contempla custos de aquisição de
medicamentos.
Brandalise está em viagem aos
EUA, com o celular desligado, segundo a assessoria do hospital. A advogada do
Boldrini, Carina Moisés Mendonça, disse ser uma insinuação leviana do ministro.
"Não há nenhum outro interesse da Dra. Silvia ou do Boldrini com relação a
Aginasa (L-Asparaginase alemã) a não ser, unicamente, fornecer aos doentes um
medicamento com eficácia e segurança comprovados".
O Boldrini obteve uma liminar
que obriga o Ministério da Saúde a fornecer Aginasa ao hospital, mas não tem
recebido o medicamento -o órgão diz que recorre decorre da decisão.
"Diferentemente do que o
Ministro alega, há diversos estudos científicos, publicados em literatura
técnico-científica, que atestam a eficácia e segurança da Aginasa, todos
juntados na ação judicial movida pelo Boldrini contra a União, o que inexiste
com relação ao Leuginase", afirmou a advogada.
GEORGE ARAVANIS, AMERICANA,
SP (FOLHAPRESS) -
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