Da Agência Senado | 22/02/2022,
10h44
A Comissão de Assuntos
Econômicos (CAE) aprovou nesta terça-feira (22) um projeto que reconhece e
regula o mercado de criptomoedas no Brasil. O colegiado acolheu o substitutivo
do senador Irajá (PSD-TO) a três matérias apresentadas pelos senadores Flávio
Arns (Podemos-PR), Soraya Thronicke (PSL-MS) e Styvenson Valentim (Podemos-RN).
Caso não haja recurso para votação em Plenário, o texto poderá seguir
diretamente para a Câmara dos Deputados.
As moedas digitais usam
sistemas de criptografia para a realização de transações. Ao contrário do
dinheiro soberano — emitido por governos, como o real ou o dólar —, as criptomoedas
são lançadas por agentes privados e negociadas exclusivamente na internet. O
detentor de uma moeda virtual só pode resgatá-la usando um código fornecido por
quem vendeu.
Segundo Irajá, quase 3 milhões
de pessoas estão registradas em corretoras de criptomoedas. O número se
aproxima da quantidade de investidores na bolsa de valores. “As empresas
negociadoras de criptoativos não estão sujeitas nem à regulamentação, nem ao
controle do Banco Central ou da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), o que torna
mais difícil ao poder público identificar movimentações suspeitas”, alerta.
— A intenção do projeto é
coibir ou restringir práticas ilegais, como a lavagem de dinheiro, evasão de
divisa e tantos outros crimes nesse segmento. Há um mercado que é lícito, legal
que é a grande maioria desse mercado, mas há exceções — afirmou Irajá, que
destacou o papel do Banco Central de fiscalizar as empresas e garantir que o
criptoativo possa ser, de fato, uma boa opção de investimento e as
criptomoedas, uma alternativa de meio de pagamento, como hoje acontece com o
Pix.
Em 2018, foram negociados R$
6,8 bilhões em moedas virtuais no Brasil, tendo sido criadas 23 novas exchanges
(corretoras). Em 2019 já eram 35 empresas agindo livremente, sem a supervisão
ou fiscalização dos órgãos do sistema financeiro, como o Banco Central ou as
bolsas de valores.
O que diz o substitutivo
O substitutivo recomenda a
aprovação do PL 3.825/2019, do senador Flávio Arns. Irajá considera
prejudicados os PLs 4.207/2020 e 3.949/2019, sugeridos por Soraya Thronicke e Styvenson
Valentim. O substitutivo traz regras e diretrizes tanto para a prestação de
serviços relacionados a ativos virtuais quanto para o funcionamento das
corretoras.
Irajá entende que o
criptoativo não é um título mobiliário. Portanto, não fica submetido à
fiscalização da CVM, que supervisiona o mercado de ações. A exceção é para o
caso de oferta pública de criptoativos para captação de recursos no mercado
financeiro.
O relator considera como
prestadora de serviços de ativos virtuais a empresa que executa, em nome de
terceiros, pelo menos um dos serviços: resgate de criptomoedas (troca por moeda
soberana); troca entre uma ou mais criptomoedas; transferência de ativos virtuais;
custódia ou administração desses ativos ou de instrumentos de controle de
ativos virtuais; ou participação em serviços financeiros relacionados à oferta
por um emissor ou à venda de ativos virtuais.
Regulação
As propostas de Soraya
Thronicke e Flávio Arns estabeleciam a Receita Federal e o Banco Central como
reguladores do mercado de moedas virtuais. O relator atribui ao Poder Executivo
a responsabilidade de definir quais órgãos devem normatizar e fiscalizar os
negócios com criptomoedas.
O substitutivo de Irajá fixa
algumas diretrizes: a regulação do mercado de criptomoedas deve promover a
livre iniciativa e a concorrência; obrigar o controle e a separação dos
recursos dos clientes; definir boas práticas de governança e gestão de riscos;
garantir a segurança da informação e a proteção dos dados pessoais; proteger e
defender consumidores e usuários e a poupança popular; e garantir a solidez e
eficiência das operações.
De acordo com o texto, o Poder
Executivo deve criar normas alinhadas aos padrões internacionais para prevenir
a lavagem de dinheiro e a ocultação de bens, assim como combater a atuação de
organizações criminosas, o financiamento do terrorismo e da produção e comércio
de armas de destruição em massa. Pelo texto, cabe aos órgãos indicados pelo
Poder Executivo autorizar o funcionamento das corretoras e definir quais serão
os ativos regulados.
O texto admite a possibilidade
de um procedimento simplificado para obtenção da licença de funcionamento. O
órgão pode autorizar a prestação de outros serviços direta ou indiretamente
relacionados à atividade da exchange. O regulador indicado pelo Poder Executivo
pode autorizar a transferência de controle, fusão, cisão e incorporação da
corretora; estabelecer condições para o exercício de cargos de direção; e
autorizar a posse e o exercício de pessoas nesses cargos.
Segundo o PL 3.825/2019, o
órgão fica livre para decidir se as empresas terão que atuar exclusivamente no
mercado de ativos virtuais ou não. As hipóteses de inclusão das transações no
mercado de câmbio e a necessidade de submissão delas à regulamentação de
capitais brasileiros no exterior e capitais estrangeiros no país também
precisam ser definidas pelo regulador.
De acordo com o substitutivo,
o funcionamento irregular sujeita a corretora e seus donos a todas as penas
previstas na lei dos crimes de colarinho branco (Lei 7.492, de 1986). O
regulador deve definir condições e prazos para o registro das corretoras
existentes, e elas devem se adequar em até seis meses depois que a proposta
virar lei.
Lavagem de dinheiro
O órgão indicado pelo Poder
Executivo deve supervisionar as corretoras e aplicar as mesmas regras que a Lei 13.506, de 2017, estabelece para as empresas
fiscalizadas pela CVM e pelo Banco Central. Ele deve estabelecer normas para o
cancelamento da licença de funcionamento, por iniciativa própria ou a pedido,
em caso de desobediência à legislação.
O projeto também submete as
corretoras às regras da lei de lavagem de dinheiro (Lei
9.613, de 1998). Elas ficam obrigadas a registrar todas as transações que
ultrapassem os limites fixados pelo Conselho de Controle de Atividades
Financeiras (Coaf), o órgão brasileiro de combate à lavagem de dinheiro.
O texto propõe que as empresas
sejam consideradas instituições financeiras e submetidas a todas as normas da
lei de crimes financeiros (Lei
7.492, de 1986); e também ao Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078, de 1990).
Segundo o senador Flávio Arns,
o Coaf já alertou para os riscos de lavagem de dinheiro em negócios com
criptomoedas. Ele informa que, em 2017, o Ministério Público e a Polícia Civil
do Distrito Federal identificaram um grupo criminoso praticando pirâmide
financeira com uma moeda virtual fictícia (kriptacoin). Em 2019, a Polícia
Federal no Rio Grande do Sul indiciou 19 pessoas que captavam dinheiro de
prefeituras para investimento em criptomoedas, prometendo rendimentos elevados.
Arns lembra que, na União
Europeia, exchanges e carteiras digitais devem ser registradas nos órgãos
financeiros de cada país. Estados Unidos, Japão e Austrália já regulam
operações com criptomoedas e têm sistemas de licenciamento de corretoras. Além
de uma série de informações sobre o negócio e os sócios, os países exigem das
empresas a prevenção a fraudes e lavagem de dinheiro e mecanismos de compliance
e gerenciamento de riscos, além de demonstrações contábeis auditadas.
Isenções fiscais
O substitutivo prevê a redução
a zero das alíquotas de determinados tributos devidos por pessoas jurídicas. O
benefício vale até 31 de dezembro de 2029 e se aplica a empresas que comprem
máquinas (hardware) e ferramentas computacionais (software) para processamento,
mineração e preservação de ativos virtuais.
O incentivo foi sugerido por
meio de emenda do senador Luis Carlos Heinze (PP-RS) e acolhida pelo relator,
senador Irajá. Se as máquinas ou ferramentas forem adquiridas por meio de
importação, serão zeradas as alíquotas de PIS, Cofins Importação, IPI
Importação e Imposto de Importação. Se forem adquiridas no mercado nacional,
serão zeradas as alíquotas de contribuição para o PIS, Cofins e IPI.
Têm direito às alíquotas
zeradas os empreendimentos que utilizem em suas atividades 100% de fontes de
energia renováveis e neutralizem 100% das emissões de gases de efeito estufa
provenientes dessas atividades. Um ato do Poder Executivo deve definir a
competência para autorizar e fiscalizar a concessão da isenção.
Cadastro de políticos
Uma novidade no texto foi
sugerida pela senadora Soraya Thronicke e acolhida por Irajá: a criação de um
Cadastro Nacional de Pessoas Expostas Politicamente (CNPEP), a ser normatizado
por ato do Poder Executivo e publicado pelo Portal da Transparência. A mudança
deve ser feita também na lei da lavagem de dinheiro.
Os órgãos e as entidades de
quaisquer Poderes da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios
devem encaminhar ao gestor CNPEP informações atualizadas sobre seus integrantes
ou ex-integrantes classificados como pessoas expostas politicamente na
legislação e regulação vigentes. O órgão gestor do CNPEP deve indicar órgãos e
entidades que deixem de cumprir essa obrigação.
As instituições reguladas pelo
Banco Central devem consultar o CNPEP para executar políticas de prevenção à
lavagem de dinheiro e avaliar o risco de crédito, por meio de convênio com o
órgão responsável pelo cadastro definido em comum acordo. Outras instituições
podem aderir ao convênio com o CNPEP visando combater e prevenir a lavagem de
dinheiro.
Fraude
O parecer inclui na lei de
crimes financeiros (Lei
7.492, de 1986) a prestação de serviços de ativos virtuais sem prévia
autorização. A pena prevista é de reclusão de um a quatro anos e multa.
O texto também insere no
Código Penal (Decreto-Lei 2.848, de 1940) a fraude em prestação de
serviços de ativos virtuais, tipificada como “organizar, gerir, ofertar
carteiras ou intermediar operações envolvendo ativos virtuais, com o fim de
obter vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em
erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento”. A pena é
de reclusão de quatro a oito anos.
Agência Senado (Reprodução
autorizada mediante citação da Agência Senado)
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